O Brasil tem muitas histórias que ainda não foram contadas para o Brasil. Seja na literatura, no cinema ou mesmo no ensino da História, há muitos capítulos de nossa trajetória enquanto país que ainda não ganharam a devida atenção dos produtores artísticos. Por exemplo, há, até hoje, uma estrada que liga as Minas Gerais até a costa brasileira, na cidade de Paraty, que também passava por partes de São Paulo e do Rio de Janeiro para escoamento de café, ouro, metais e, também, de cana de açúcar e cachaça. Esse trajeto foi nomeado como Estrada Real e decretado patrimônio histórico e cultural do país – e agora é também o mote para o filme ‘Saideira’, que chega essa semana aos cinemas brasileiros.
Penélope (Luciana Paes, de ‘Eleita’) volta à sua casa, em Paraty, determinada a encontrar a ‘Saideira’, uma lendária garrafa de cachaça que, dizem, é a melhor do mundo. Mas, ao chegar, descobre que seu avô, Honório (Tonico Pereira, de ‘Nas Ondas da Fé’), acaba de falecer, e, com ele, morre junto a receita e a localização da ‘Saideira’. Inconformada, Penélope mal dá atenção para sua irmã mais nova, Joana (Thati Lopes, da série ‘Nada Suspeitos’), a quem não via há dez anos. Porém, quando um advogado chega com o testamento do avô – que, na verdade, é uma charada com uma caça ao tesouro –, Penélope vê nesse desafio a oportunidade de finalmente encontrar sua ‘Saideira’ e, com isso, se tornar a maior cachaçóloga do mundo.
Escrito a oito mãos por Arthur Warren, Júlio Taubkin, Marina Morais e Pedro Arantes, o roteiro deixa bem evidente que o cerne de seu enredo é a Estrada Real, e toda a ficção fora construída ao redor dessa estrada para evidenciá-la. Para tal, personagens, elementos e situações foram criadas para passarem ao longo dos 1.630 quilômetros de extensão e, acima de tudo, valorizar o caminho, parando para mostrar a paisagem e as características locais – como, por exemplo, quando as irmãs chegam a Itabira, cidade de Drummond, e mencionam suas poesias.
Se por um lado é muito legal ver esse patrimônio ganhar um filme em toda a sua extensão – com direito a minuciosa explicação das diferenças entre os tipos de cachaças, para espectadores de qualquer país entender –, por outro as motivações das personagens ficam soltas no enredo, o que acaba realçando ainda mais o abismo que há entre as irmãs – uma descolada, inocente e juvenil, a outra, adulta, séria demais, beirando a amargura –, descompassadas com a paisagem.
Tal qual ‘Minha Irmã e Eu’, em ‘Saideira’ temos duas irmãs pegando a estrada para desbravar o país a partir de um assunto familiar pessoal delas. No caminho, muitos desafios e ensinamentos farão com que as duas repensem seus estilos de vida e as escolhas que fizeram. Independente da motivação, é legal ver essas histórias com protagonistas mulheres, mostrando que tá tudo bem viajar sozinha; com sorte, filmes como este ‘Saideira’ podem encorajar outras mulheres a também se motivarem a conhecer o país, mesmo que sozinhas.
‘Saideira’ desbrava um Brasil esquecido nos recantos dos livros didáticos e apresenta a cachaça tipo exportação. Sob a roupagem da ficção, o filme de Pedro Arantes e Júlio Taubkin traz um Brasil histórico-cultural para todo mundo conhecer.