quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica | Sandra Bullock atinge a perfeição na overdose dramática de ‘Imperdoável’, novo filme da Netflix

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“Uma vez criminosa, sempre criminosa”.

É essa máxima obliterante que guia a estrutura de ‘Imperdoável’, novo drama da Netflix. O promissor longa-metragem, estrelado pela vencedora do Oscar Sandra Bullock, gira em torno de Ruth Slater, uma mulher que foi condenada a vinte anos de prisão por ter assassinado o xerife da pequena cidade onde morava. Após cumprir sua pena, ela recomeça sua vida enfrentando obstáculos que podemos imaginar dentro de um escopo como este – e tem como principal objetivo se reencontrar com a irmã, Katie (Aisling Franciosi), que era uma mera criança à época da tragédia e foi entregue ao Serviço Social, eventualmente adotada por uma família que se recusou a contar sobre seu passado.

Quando pensamos em Bullock, somos automaticamente atraídos por qualquer que seja a trama – como uma agente do FBI que se disfarça de miss para impedir um assassinato, uma golpista que deseja roubar um colar de diamantes ou uma astronauta que fica perdida na imensidão do espaço. Não é surpresa que o anúncio de que participaria de um novo projeto original de uma das gigantes do streaming tenha abarcado interesse dos mais diversos púbicos – principalmente aqueles que já se preparam para a temporada de premiações. É claro que a atriz não decepcionaria aqueles ansiosos para vê-la novamente em ação e, de fato, a performer entrega uma espetacular rendição que reitera uma versatilidade impressionante, invejável e de tirar o fôlego. O problema é que o filme, mesmo centrado naquilo que deseja entregar, não consegue acompanhá-la e mergulha numa cíclica e fastigiosa narrativa que não sabe em qual caminho seguir.



A produção é comandada por Nora Fingscheidt, diretora alemã que fez sua estreia oficial no cenário do entretenimento em meados dos anos 2000. Uma década e meia mais tarde, Fingscheidt foi contratada pela Netflix para comandar seu primeiro título em língua inglesa, prometendo fazer o melhor da adaptação da série britânica homônima lançada em 2009. A princípio, os elementos apresentados seguem uma fórmula básica, em que uma impávida figura sai da realidade que passou a conhecer e retorna para um mundo cruel que, ao que tudo indica, não está disposta a lhe dar uma segunda chance, ainda que tenha cumprido o que lhe foi sentenciado. Ruth, marcada por tudo o que perdeu e pela fortaleza que ergueu em volta de sua personalidade para se proteger de qualquer um; porém, um fantasma insiste em voltar para assombrá-la e relembrá-la de que tem assuntos pendentes a resolver (e que, mais cedo ou mais tarde, eles irão alcançá-las).

Em questões performativas, Bullock faz o que é esperado de uma artista consolidada em Hollywood, tornando-se irreconhecível e adotando as características do que exala ser uma extensa pesquisa de campo. A cada ato, a delineação que fornece à protagonista ganha uma nova camada, desconstruindo a figura engessada que é-nos apresentada nas sequências iniciais e demonstrando que ela se sente culpada por ter feito decisões erradas e abandonado a irmã. Apesar de não necessariamente dividir os holofotes com o restante do elenco, temos a presença de outros astros de peso na produção, que incluem Viola Davis e Vincent D’Onofrio como o casal Liz e John Ingram, e Richard Thomas e Linda Emond como Michael e Rachel Malcolm – todos fazendo máximo que podem dentro das restrições implicadas pelo enredo.

À medida que a obra se desenrola, a atmosfera adentra um território obscuro e denso – e aqui não digo de uma forma positiva, por assim dizer. Obviamente, o arco de Ruth é construído num traçado de ascensão e queda que remonta aos mais clássicos personagens do gênero, tratando com cautela o que ela representa para não tangenciar o melodramático. Entretanto, a condução de Fingscheidt oscila de maneirismos estranhos a previsíveis incursões premeditadas por uma trilha sonora pedante e exagerada; em outras palavras, promove-se um retorno constante às memórias enevoadas tanto de Ruth quanto de Katie, cujo desenlace alcança uma espécie de “final feliz” da maneira mais frustrante possível. Essa fragmentação (algo recorrente em diversos filmes e séries a que assisti recentemente) denota uma preocupação estilística que beira o hiperbólico e que deixa de lado elementos muito importantes – como o roteiro.

Não há de novo a ser visto nas investidas imagéticas, como a paleta de cores (que se isola em um monocromático discurso) e a fotografia (com seus enquadramentos sem muita imaginação). Peter Craig, Hillary Seitz e Courtenay Miles, contribuindo para a história, sabem o que desejam fazer até determinado ponto; mas, depois da chocante reviravolta que antecipa a conclusão, os eventos se arrastam em uma profusão de personagens desnecessários e que não contribuem em nada para si próprios e para os outros. Caso não fosse pela competência de um time de atores e atrizes que comanda cada cena que estrelam (em especial a irretocável encarnação de Bullock, que pode faturar uma indicação ao Oscar), o título seria apenas um divertimento barato sem algo de original a contar.

‘Imperdoável’ não chega a ser intragável, mas também não é bom. Com exceção dos pontos positivos mencionados nos parágrafos acima, há um certo rigor a que Fingscheidt e seus colaboradores se prendem – e, tentando dar um passo maior do que consegue, deixa que a ambição desmedida leve a melhor.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Quando pensamos em Bullock, somos automaticamente atraídos por qualquer que seja a trama – como uma agente do FBI que se disfarça de miss para impedir um assassinato, uma golpista que deseja roubar um colar de diamantes ou uma astronauta que fica perdida na imensidão do espaço. Não é surpresa que o anúncio de que participaria de um novo projeto original de uma das gigantes do streaming tenha abarcado interesse dos mais diversos púbicos – principalmente aqueles que já se preparam para a temporada de premiações. É claro que a atriz não decepcionaria aqueles ansiosos para vê-la novamente em ação e, de fato, a performer entrega uma espetacular rendição que reitera uma versatilidade impressionante, invejável e de tirar o fôlego. O problema é que o filme, mesmo centrado naquilo que deseja entregar, não consegue acompanhá-la e mergulha numa cíclica e fastigiosa narrativa que não sabe em qual caminho seguir.

A produção é comandada por Nora Fingscheidt, diretora alemã que fez sua estreia oficial no cenário do entretenimento em meados dos anos 2000. Uma década e meia mais tarde, Fingscheidt foi contratada pela Netflix para comandar seu primeiro título em língua inglesa, prometendo fazer o melhor da adaptação da série britânica homônima lançada em 2009. A princípio, os elementos apresentados seguem uma fórmula básica, em que uma impávida figura sai da realidade que passou a conhecer e retorna para um mundo cruel que, ao que tudo indica, não está disposta a lhe dar uma segunda chance, ainda que tenha cumprido o que lhe foi sentenciado. Ruth, marcada por tudo o que perdeu e pela fortaleza que ergueu em volta de sua personalidade para se proteger de qualquer um; porém, um fantasma insiste em voltar para assombrá-la e relembrá-la de que tem assuntos pendentes a resolver (e que, mais cedo ou mais tarde, eles irão alcançá-las).

Em questões performativas, Bullock faz o que é esperado de uma artista consolidada em Hollywood, tornando-se irreconhecível e adotando as características do que exala ser uma extensa pesquisa de campo. A cada ato, a delineação que fornece à protagonista ganha uma nova camada, desconstruindo a figura engessada que é-nos apresentada nas sequências iniciais e demonstrando que ela se sente culpada por ter feito decisões erradas e abandonado a irmã. Apesar de não necessariamente dividir os holofotes com o restante do elenco, temos a presença de outros astros de peso na produção, que incluem Viola Davis e Vincent D’Onofrio como o casal Liz e John Ingram, e Richard Thomas e Linda Emond como Michael e Rachel Malcolm – todos fazendo máximo que podem dentro das restrições implicadas pelo enredo.

À medida que a obra se desenrola, a atmosfera adentra um território obscuro e denso – e aqui não digo de uma forma positiva, por assim dizer. Obviamente, o arco de Ruth é construído num traçado de ascensão e queda que remonta aos mais clássicos personagens do gênero, tratando com cautela o que ela representa para não tangenciar o melodramático. Entretanto, a condução de Fingscheidt oscila de maneirismos estranhos a previsíveis incursões premeditadas por uma trilha sonora pedante e exagerada; em outras palavras, promove-se um retorno constante às memórias enevoadas tanto de Ruth quanto de Katie, cujo desenlace alcança uma espécie de “final feliz” da maneira mais frustrante possível. Essa fragmentação (algo recorrente em diversos filmes e séries a que assisti recentemente) denota uma preocupação estilística que beira o hiperbólico e que deixa de lado elementos muito importantes – como o roteiro.

Não há de novo a ser visto nas investidas imagéticas, como a paleta de cores (que se isola em um monocromático discurso) e a fotografia (com seus enquadramentos sem muita imaginação). Peter Craig, Hillary Seitz e Courtenay Miles, contribuindo para a história, sabem o que desejam fazer até determinado ponto; mas, depois da chocante reviravolta que antecipa a conclusão, os eventos se arrastam em uma profusão de personagens desnecessários e que não contribuem em nada para si próprios e para os outros. Caso não fosse pela competência de um time de atores e atrizes que comanda cada cena que estrelam (em especial a irretocável encarnação de Bullock, que pode faturar uma indicação ao Oscar), o título seria apenas um divertimento barato sem algo de original a contar.

‘Imperdoável’ não chega a ser intragável, mas também não é bom. Com exceção dos pontos positivos mencionados nos parágrafos acima, há um certo rigor a que Fingscheidt e seus colaboradores se prendem – e, tentando dar um passo maior do que consegue, deixa que a ambição desmedida leve a melhor.

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Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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