Teatro e cinema são dois tipos de arte bem diferentes. Ainda que o princípio seja o mesmo – o de atuar uma história –, são adaptações distintas que requerem preparações igualmente distintas: enquanto o cinema conta com ambientes reais que ajudem a contar a trama, por exemplo, o teatro, por sua vez, conta com cenários construídos que visam recriar espaços para ambientar a trama a ser encenada. Esta é apenas uma das muitas diferenças entre ambas as artes, mas que, vira e mexe, acabam se encontrando em versões audiovisuais de peças previamente encenadas. É o caso de ‘Sêneca: A Respeito dos Terremotos’, drama exibido logo no primeiro dia do Festival do Rio 2023.
Sêneca (John Malkovich) é o principal conselheiro do império do jovem Nero (Tom Xander). É ele cujas opiniões sobre guerra, comportamento, reino, relacionamentos e todo tipo de inter-relações são ouvidas e levadas em conta pelo imprudente imperador. Seus conselhos se estendem até mesmo à mãe de Nero, Agrippina (Mary-Louise Parker). Assim, sua influência sobre Roma e todo o império ao mesmo tempo em que vai se estendendo, também vai gerando preocupações e cultivando inimizades. Entretanto, da mesma forma com que Sêneca ascendeu nas graças do governante, também caiu em desgraça com a mesma velocidade no dia em que Nero decidiu que seus serviços não eram mais necessários e chamou um mercenário para matá-lo. Para sobreviver, o conselheiro terá que contar com toda a sua habilidade na oratória para tentar convencer seu carrasco a mudar de ideia.
Com quase duas horas de duração, a sensação é de que ‘Sêneca: A Respeito dos Terremotos’ dura pelo menos o dobro disso. Encabeçado pelo premiado John Malkovich, é o tipo de filme que chama a atenção dentro de um festival de cinema justamente por ser esta a oportunidade de vermos filmes de menor orçamento, mas que demonstram o potencial de atuação desses nomes consagrados. Porém este filme é, em suma, um verborrágico quase monólogo de John Malkovich, que passa a sensação de não terminar nunca. O roteiro de Robert Schwentke e Matthew Wilder deve ter umas mil páginas, tamanha a quantidade de falas. Tudo bem que os textos clássicos gregos são um apanhado de aforismos que buscavam a iluminação intelectual dos seres humanos a partir do registro de exemplos e pensamentos que, esperava-se, ajudaria a humanidade a ser melhor. Mas, para um filme, esse formato de diálogo é simplesmente maçante.
Com participação luxuosa de Geraldine Chaplin (filha de Charles Chaplin), quem se destaca é o jovem ator Tom Xander, com um semblante sádico e repulsivo que de primeira causa estranhamento, mas em seguida faz sentido para um personagem cruel como Nero. O longa é também o último trabalho do ator Julian Sands, que fora encontrado morto no início de 2023 após ter ficado desaparecido por alguns dias.
‘Sêneca: A Respeito dos Terremotos’ é bem o tipo de filme que a gente só vem em festival, mas não é exatamente um filme, mas sim uma encenação dramatúrgica no meio de um deserto recheado de cenas escatológicas, violências e exageros. Mais um trabalho esquisitão na carreira do excêntrico ator John Malkovich.