Crítica | Vermiglio: Vencedor do Festival de Veneza é um delicado e cru relato sobre amor e família

A calmaria do primeiro horário da manhã e a linda vista do céu no alto dos Alpes Italianos são os resquícios de uma vida à beira da mudança. A tranquilidade campestre da região revela uma típica família da Itália; Pai, mãe e uma pequena legião de filhos que seguem sua rotina, sob a tranquilidade e serenidade de um lar simples, mas aconchegante. É assim que Vermiglio se abre para a audiência.

Mulher de lenço na cabeça, olhando para trás.
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O longa de Maura Delpero acompanha as quatro estações que marcam o final da Segunda Guerra Mundial, a partir da intoxicante paixão entre um soldado desertor e a filha mais velha. E a chegada de Pietro, ao abandonar o confronto, significa mais do que um desconforto na pequena região. Ela também anuncia uma inesperada dinâmica disfuncional, onde um amor inconsequente desencadeará numa trágica espiral de caos e sofrimento que ainda implicam no lugar e no valor de uma mulher.

A arrebatadora paixão entre Pietro e Lucia, no auge de 1944, também simboliza um tempo onde pouco se sabia sobre o amor, relações amorosas e principalmente sexuais. E debaixo dessa lente histórica, acompanhamos os desdobramentos dessa imprudente aventura, que obviamente custará muito mais caro para essa jovem mulher, que é deixada em um beco sem saída. E a riqueza de Vermiglio reside nisso, nos detalhes que se desabrocham conforme um efêmero romance passa a deixar suas marcas em toda uma família.

Casal na cama, mulher grávida pensativa.
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Buscando observar melhor o cenário sociocultural de uma remota comunidade italiana em um hiato muito específico, o drama de Delpero opta por entregar um panorama mais amplo sobre família, papéis e responsabilidades. À medida em que traz vislumbres de uma guerra voraz e arrebatadora – que passa bem longe desse pequeno território, entendemos a dimensão de como algo tão distante é capaz de redefinir toda a trajetória de uma única casa. E pela história de amor de um jovem casal, grandes transformações sociais e relacionais se desabrocham, mostrando ainda o fim de uma era – com o término do conflito bélico -, e o início de uma outra.

Luto e frustrações amorosas ainda se cruzam com os alicerces da antiga fundação familiar, que nos tempos contemporâneos segue cada vez mais distante desse retrato de meados de 1944. Resgatando as particularidades das tradições italianas a partir do seio doméstico, Vermiglio conta com um roteiro delicado e pouco verbal, explorando a trama mais a partir de sua estonteante e idílica fotografia e da silenciosa, porém dramática e poderosa expressividade de seus personagens. Usando o histórico de sua própria família para criar um paralelo entre passado e presente, a produção é um requintado, porém lento, retrato vivo sobre escolhas e suas consequências e constante necessidade de adaptação em meio a um destino não programado.

E conforme vemos os vestígios dessa comunidade rural se dissiparem diante da mudança de zeitgeist, vemos também os ventos levarem consigo alguns parâmetros tão rigorosos e imperdoáveis que regiam tanto a pequena comunidade, como a família protagonista. E tratando tudo isso com delicadeza e uma simbólica estética que nos transporta para a Itália rural dos anos 40, Delpero nos faz entender porque sua história levou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Veneza de 2024. Trazendo leves pitadas de um doce e pueril humor que ajudam a dar um sabor especial a essa quase trágica jornada familiar, Vermiglio é um drama cru e honesto sobre a vida, o tempo e todos os seus entremeios.

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