sábado , 23 novembro , 2024

Crítica | Vice – Filme político com Christian Bale é ácido, criativo e engraçado

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Nas cabeças da corrida por indicações ao Oscar 2019 – entre elas melhor filme e melhor ator – Vice tem estreia programada para o dia 31 deste mês pela Imagem Filmes. Novo trabalho do diretor Adam McKay, criado nos mesmos moldes de seu prestigiado filme anterior (A Grande Aposta, 2015), o longa é a biografia de uma figura pouco popular da história recente norte-americana, Dick Cheney. O sujeito foi o vice-presidente do governo George W. Bush (2001-2009).

Este quadro de impopularidade não procura ser revertido como proposta desta produção, tampouco pelo retrato do camaleônico (e sempre ótimo) Christian Bale, que vive o protagonista. O ator inclusive vem papando todos os prêmios prévios e é um dos fortes candidatos a levantar a estatueta (de novo) no dia da cerimônia da Academia. Com a ajuda de uma impressionante maquiagem – do nível de O Destino de uma Nação (vencedor na categoria no ano passado), o intérprete desaparece e surge apenas seu personagem. Aliás, a história pode se repetir, com uma segunda vitória de um ator enterrado sobre quilos (falsos e reais) de maquiagem. Mas ao contrário do Winston Churchill de Gary Oldman – que enfrentou os últimos grandes vilões (do cinema e da humanidade), a luta de Cheney e Bale é menos simpática, e banhada em tonalidades de cinza.



O próprio Bale fez questão de se afastar o mais rápido possível de seu personagem e repudiá-lo – muitos intérpretes procuram entender o ponto de vista de seus papeis, até mesmo vilões, não é o caso aqui. Vice segue a juventude desajustada de Cheney, que entrou na política cedo e figurou em cargos importantes durante sua trajetória (como Chefe de Gabinete da Casa Branca na década de 1970, e Secretário de Defesa dos EUA – 1989 a 1993), e mostra que seu desejo verdadeiro era o poder no cargo máximo, algo que nunca conquistou. Ou será?

Como nos mostrou recentemente o jogo político brasileiro, os vices podem ser tão poderosos quanto os presidentes, ou quem sabe mais. No caso de Cheney, um acordo foi feito para que aceitasse ser o braço direito de Bush, e assim o ardiloso personagem ficou a cargo do comando de porções importantes do governo norte-americano, como as Forças Armadas. Cheney esteve por trás e articulou a Guerra do Iraque, em retaliação aos atentados de 11 de setembro – marcado na história como o pior atentado jamais imaginado pelo mundo. Cheney é um político extremo e duro, que não tem medo da impopularidade. Justamente por isso, não faltam paralelos com Trump – detratores e adoradores.

Voltando ao primeiro parágrafo, quando digo que Vice é produzido nos mesmos moldes de A Grande Aposta, me refiro à sua estrutura e narrativa. McKay parece ter criado para si este estilo, no qual aplica muita criatividade (seja na montagem ou na cena em si) para criar uma sátira adulta, dona de um humor histérico, porém, retratando um tema seríssimo. Se em A Grande Aposta tínhamos pausas para gente como Margot Robbie (interpretando a si mesma) explicar um pouco em termos leigos a crise econômica de 2008 – em Vice a gozação vai de devaneios dos personagens, brincadeiras com interações (quando Bale e Amy Adams recitam Shakespeare na cama) e quebra da quarta parede (a cena pós-créditos vale ouro).

O elenco está afiadíssimo, e além do irreconhecível Bale, temos Amy Adams como a esposa do protagonista, Sam Rockwell como George W. Bush e Steve Carell na pele do mentor Donald Rumsfield. A sintonia de todos pulsa em tela. Mas é preciso destacar Tyler Perry como Colin Powell, numa breve, porém, impactante atuação.

Independente de sua ideologia política, Vice consegue transcender devido a sua qualidade artística. Esta não é apenas mais uma biografia política, é uma obra autoral de um cineasta que conseguiu entender que hoje é necessário mais, é preciso arrojar a forma, mesmo que o conteúdo siga o mesmo. Nas entrelinhas, a intenção de McKay não é perdoar Cheney (embora tente humanizá-lo brevemente, em especial no que diz respeito à opção sexual da filha), mas sim apontar publicamente seus muitos erros – afinal não existe muita defesa para tortura. Vice procura ser o mais isento possível (ou tenta), como apresenta o discurso liberalista ao desfecho, mas surge como libelo ácido e muito crítico – como um bom filme deve ser. Doa a quem doer.

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Este quadro de impopularidade não procura ser revertido como proposta desta produção, tampouco pelo retrato do camaleônico (e sempre ótimo) Christian Bale, que vive o protagonista. O ator inclusive vem papando todos os prêmios prévios e é um dos fortes candidatos a levantar a estatueta (de novo) no dia da cerimônia da Academia. Com a ajuda de uma impressionante maquiagem – do nível de O Destino de uma Nação (vencedor na categoria no ano passado), o intérprete desaparece e surge apenas seu personagem. Aliás, a história pode se repetir, com uma segunda vitória de um ator enterrado sobre quilos (falsos e reais) de maquiagem. Mas ao contrário do Winston Churchill de Gary Oldman – que enfrentou os últimos grandes vilões (do cinema e da humanidade), a luta de Cheney e Bale é menos simpática, e banhada em tonalidades de cinza.

O próprio Bale fez questão de se afastar o mais rápido possível de seu personagem e repudiá-lo – muitos intérpretes procuram entender o ponto de vista de seus papeis, até mesmo vilões, não é o caso aqui. Vice segue a juventude desajustada de Cheney, que entrou na política cedo e figurou em cargos importantes durante sua trajetória (como Chefe de Gabinete da Casa Branca na década de 1970, e Secretário de Defesa dos EUA – 1989 a 1993), e mostra que seu desejo verdadeiro era o poder no cargo máximo, algo que nunca conquistou. Ou será?

Como nos mostrou recentemente o jogo político brasileiro, os vices podem ser tão poderosos quanto os presidentes, ou quem sabe mais. No caso de Cheney, um acordo foi feito para que aceitasse ser o braço direito de Bush, e assim o ardiloso personagem ficou a cargo do comando de porções importantes do governo norte-americano, como as Forças Armadas. Cheney esteve por trás e articulou a Guerra do Iraque, em retaliação aos atentados de 11 de setembro – marcado na história como o pior atentado jamais imaginado pelo mundo. Cheney é um político extremo e duro, que não tem medo da impopularidade. Justamente por isso, não faltam paralelos com Trump – detratores e adoradores.

Voltando ao primeiro parágrafo, quando digo que Vice é produzido nos mesmos moldes de A Grande Aposta, me refiro à sua estrutura e narrativa. McKay parece ter criado para si este estilo, no qual aplica muita criatividade (seja na montagem ou na cena em si) para criar uma sátira adulta, dona de um humor histérico, porém, retratando um tema seríssimo. Se em A Grande Aposta tínhamos pausas para gente como Margot Robbie (interpretando a si mesma) explicar um pouco em termos leigos a crise econômica de 2008 – em Vice a gozação vai de devaneios dos personagens, brincadeiras com interações (quando Bale e Amy Adams recitam Shakespeare na cama) e quebra da quarta parede (a cena pós-créditos vale ouro).

O elenco está afiadíssimo, e além do irreconhecível Bale, temos Amy Adams como a esposa do protagonista, Sam Rockwell como George W. Bush e Steve Carell na pele do mentor Donald Rumsfield. A sintonia de todos pulsa em tela. Mas é preciso destacar Tyler Perry como Colin Powell, numa breve, porém, impactante atuação.

Independente de sua ideologia política, Vice consegue transcender devido a sua qualidade artística. Esta não é apenas mais uma biografia política, é uma obra autoral de um cineasta que conseguiu entender que hoje é necessário mais, é preciso arrojar a forma, mesmo que o conteúdo siga o mesmo. Nas entrelinhas, a intenção de McKay não é perdoar Cheney (embora tente humanizá-lo brevemente, em especial no que diz respeito à opção sexual da filha), mas sim apontar publicamente seus muitos erros – afinal não existe muita defesa para tortura. Vice procura ser o mais isento possível (ou tenta), como apresenta o discurso liberalista ao desfecho, mas surge como libelo ácido e muito crítico – como um bom filme deve ser. Doa a quem doer.

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