domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Vozes e Vultos – Filme bipolar da Netflix promete terror e entrega fraco drama

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O Sem Talento Ripley

Em O Talentoso Ridley (1999), o “parasita” ambicioso Tom Ripley (Matt Damon) se vê degustando e se apegando à boa vida, mesmo que para chegar a seus objetivos termine trapaceando, escondendo, mentindo, falsificando e, eventualmente, por fim, assim como todos os sem escrúpulos, matando. É claro que o longa, já um clássico moderno, é baseado num livro de Patricia Highsmith, e tem direção de Anthony Minghella. E caso você não tenha visto, pare tudo e corra para assistir. E se já tiver conferido, revisite-o. Sem dúvida é melhor opção do que experimentar este Vozes e Vultos – lançamento da Netflix desta semana.

A Netflix é atualmente um colosso do audiovisual, e já fechou contrato com diversos pesos-pesados da indústria do entretenimento – entre atores, diretores, roteiristas, e outros. É claro também que com uma produção quase em larga escala, nem tudo será ouro. É o caso com este “terror” mequetrefe estrelado por Amanda Seyfried. A própria inclusive já participou de boas produções da casa, como o recente Mank (de David Fincher), pelo qual recebeu sua primeira nomeação para o Oscar – exibido no último domingo, 25 de abril.



Mas porque citei O Talentoso Ripley no começo do texto, você deve estar se perguntando. Pois bem, é que neste roteiro, baseado no livro de Elizabeth Brundage, adaptado pela dupla de diretores casados na vida real Shari Springer Berman e Robert Pulcini, podemos encontrar fortes ecos de tal obra em uma de suas subtramas. E caso a história tivesse se atido a desenvolver tais trechos apenas, quem sabe poderíamos ter um filme mais eficiente. Acontece que na mistura ainda temos elementos sobrenaturais de casa mal assombrada e uma mensagem feminista (que é o melhor momento da obra).

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Na trama, Seyfried é uma jovem mãe de família colocada numa encruzilhada. Ela é pedida para abdicar de sua vida profissional como restauradora de obras de arte na cidade a fim de apoiar a carreira do marido, que tem planos de leva-la ao interior, para morar numa grande casa na área rural ao lado da pequena filha dos dois. Tudo isso na transição do fim da década de 1970 para 1980, o que torna a posição da mulher dentro de um relacionamento e da sociedade em si ainda mais delicada. Na nova cidade, o marido, vivido por James Norton (da série The Nevers), irá ocupar um cargo de professor de arte, enquanto espera terminar seu livro. Além da dupla, o elenco conta ainda com “prata da casa” Natalia Dyer (Stranger Things), e os veteranos F. Murray Abraham (vencedor do Oscar por Amadeus) e Karen Allen (a eterna Marion de Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida).

Assim que chegam ao novo lar, os problemas no casamento dos protagonistas começam a sangrar como uma ferida aberta demonstrando sua enorme fragilidade. Não demora para o sujeito exalar sua masculinidade tóxica, menosprezando a esposa a toda oportunidade, inclusive iniciando um caso com uma jovem, e se comportando em variadas ocasiões de forma errática – com comentários ofensivos, entre outras coisas. Talvez fosse muito mais fácil demonizar tal comportamento atualmente, e por isso o propósito da história em relocar o tempo para algumas décadas no passado tenha como finalidade afirmar este ímpeto como algo mais “comum” para o período. Seja como for, é impossível fechar os olhos para o discurso feminista interessante ao qual o longa se propõe: com a jovem mulher presa a um casamento infeliz, ao lado de um verdadeiro “traste” com T maiúsculo, encontrando sua voz para dar um basta na situação. E justamente esse pode ter sido o elemento que atraiu Seyfried ao projeto.

Os diretores são talentosos e tem na bagagem obras de prestígio elogiadas pela imprensa: dentre as quais se destaca Anti-Herói Americano (2003) – que lhes rendeu uma indicação ao Oscar de roteiro adaptado. É claro que este é um elemento de igual atração para qualquer artista, e não seria diferente com os envolvidos aqui. Apesar desta subtrama justa e digna, indo ainda mais longe com o citado fator “Talentoso Ripley” do marido, no qual a esposa começa a desvendar uma verdadeira teia, que chega como uma bola de neve que só vai aumentando na falta de caráter da personalidade deste “partidão” com quem ela se juntou; o problema é justamente o elo com uma parte sobrenatural capenga, que simplesmente não dá liga.

Ah sim, é preciso ter em mente que Vozes e Vultos é anunciado como terror, caso você tenha ficado se perguntando onde se encontra o gênero nesta trama. Bem, ele aparece na nova residência do casal, tida como assombrada pelos espíritos dos antigos moradores. E adivinhe só: o sujeito era um machista misógino que termina matando sua mulher e a alma de ambos permanecem no local – fazendo a história se repetir. Assim, a mulher está lá para ajudar, enquanto o sujeito assombra os que não forem bons de coração. Como se as coisas não estivessem o tempo todo beirando sair dos trilhos, que tal uma pausa para o envolvimento amoroso relâmpago de Seyfried com um jovem parente dos antigos moradores, que agora faz serviço de reparos no lar dos protagonistas? Subtrama esta que vai do nada a lugar nenhum.

Dá para ver aonde em Vozes e Vultos se esconde um filme bem melhor, mas para isso seria preciso descascar camadas e jogar o sobressalente fora – além de lapidar mais o que deveria ser a espinha dorsal deste conto. Infelizmente, nem mesmo com toda a tarimba dos realizadores, eles são capazes de conceber um longa coerente. Assim ficamos com uma mistura entre um tema sério e sóbrio, e outro mais fantástico que não são capazes dialogar nunca entre si. Fora isso, os 120 minutos de projeção se arrastam fazendo a experiência desnecessariamente alongada, quando para o resultado final meia hora a menos daria conta do recado. Para colocar o prego no caixão, se você é daqueles que se incomodam com desfechos anticlimáticos, espere para ver como ficou o final deste Vozes e Vultos, e se prepare para urrar.

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O Sem Talento Ripley

Em O Talentoso Ridley (1999), o “parasita” ambicioso Tom Ripley (Matt Damon) se vê degustando e se apegando à boa vida, mesmo que para chegar a seus objetivos termine trapaceando, escondendo, mentindo, falsificando e, eventualmente, por fim, assim como todos os sem escrúpulos, matando. É claro que o longa, já um clássico moderno, é baseado num livro de Patricia Highsmith, e tem direção de Anthony Minghella. E caso você não tenha visto, pare tudo e corra para assistir. E se já tiver conferido, revisite-o. Sem dúvida é melhor opção do que experimentar este Vozes e Vultos – lançamento da Netflix desta semana.

A Netflix é atualmente um colosso do audiovisual, e já fechou contrato com diversos pesos-pesados da indústria do entretenimento – entre atores, diretores, roteiristas, e outros. É claro também que com uma produção quase em larga escala, nem tudo será ouro. É o caso com este “terror” mequetrefe estrelado por Amanda Seyfried. A própria inclusive já participou de boas produções da casa, como o recente Mank (de David Fincher), pelo qual recebeu sua primeira nomeação para o Oscar – exibido no último domingo, 25 de abril.

Mas porque citei O Talentoso Ripley no começo do texto, você deve estar se perguntando. Pois bem, é que neste roteiro, baseado no livro de Elizabeth Brundage, adaptado pela dupla de diretores casados na vida real Shari Springer Berman e Robert Pulcini, podemos encontrar fortes ecos de tal obra em uma de suas subtramas. E caso a história tivesse se atido a desenvolver tais trechos apenas, quem sabe poderíamos ter um filme mais eficiente. Acontece que na mistura ainda temos elementos sobrenaturais de casa mal assombrada e uma mensagem feminista (que é o melhor momento da obra).

Na trama, Seyfried é uma jovem mãe de família colocada numa encruzilhada. Ela é pedida para abdicar de sua vida profissional como restauradora de obras de arte na cidade a fim de apoiar a carreira do marido, que tem planos de leva-la ao interior, para morar numa grande casa na área rural ao lado da pequena filha dos dois. Tudo isso na transição do fim da década de 1970 para 1980, o que torna a posição da mulher dentro de um relacionamento e da sociedade em si ainda mais delicada. Na nova cidade, o marido, vivido por James Norton (da série The Nevers), irá ocupar um cargo de professor de arte, enquanto espera terminar seu livro. Além da dupla, o elenco conta ainda com “prata da casa” Natalia Dyer (Stranger Things), e os veteranos F. Murray Abraham (vencedor do Oscar por Amadeus) e Karen Allen (a eterna Marion de Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida).

Assim que chegam ao novo lar, os problemas no casamento dos protagonistas começam a sangrar como uma ferida aberta demonstrando sua enorme fragilidade. Não demora para o sujeito exalar sua masculinidade tóxica, menosprezando a esposa a toda oportunidade, inclusive iniciando um caso com uma jovem, e se comportando em variadas ocasiões de forma errática – com comentários ofensivos, entre outras coisas. Talvez fosse muito mais fácil demonizar tal comportamento atualmente, e por isso o propósito da história em relocar o tempo para algumas décadas no passado tenha como finalidade afirmar este ímpeto como algo mais “comum” para o período. Seja como for, é impossível fechar os olhos para o discurso feminista interessante ao qual o longa se propõe: com a jovem mulher presa a um casamento infeliz, ao lado de um verdadeiro “traste” com T maiúsculo, encontrando sua voz para dar um basta na situação. E justamente esse pode ter sido o elemento que atraiu Seyfried ao projeto.

Os diretores são talentosos e tem na bagagem obras de prestígio elogiadas pela imprensa: dentre as quais se destaca Anti-Herói Americano (2003) – que lhes rendeu uma indicação ao Oscar de roteiro adaptado. É claro que este é um elemento de igual atração para qualquer artista, e não seria diferente com os envolvidos aqui. Apesar desta subtrama justa e digna, indo ainda mais longe com o citado fator “Talentoso Ripley” do marido, no qual a esposa começa a desvendar uma verdadeira teia, que chega como uma bola de neve que só vai aumentando na falta de caráter da personalidade deste “partidão” com quem ela se juntou; o problema é justamente o elo com uma parte sobrenatural capenga, que simplesmente não dá liga.

Ah sim, é preciso ter em mente que Vozes e Vultos é anunciado como terror, caso você tenha ficado se perguntando onde se encontra o gênero nesta trama. Bem, ele aparece na nova residência do casal, tida como assombrada pelos espíritos dos antigos moradores. E adivinhe só: o sujeito era um machista misógino que termina matando sua mulher e a alma de ambos permanecem no local – fazendo a história se repetir. Assim, a mulher está lá para ajudar, enquanto o sujeito assombra os que não forem bons de coração. Como se as coisas não estivessem o tempo todo beirando sair dos trilhos, que tal uma pausa para o envolvimento amoroso relâmpago de Seyfried com um jovem parente dos antigos moradores, que agora faz serviço de reparos no lar dos protagonistas? Subtrama esta que vai do nada a lugar nenhum.

Dá para ver aonde em Vozes e Vultos se esconde um filme bem melhor, mas para isso seria preciso descascar camadas e jogar o sobressalente fora – além de lapidar mais o que deveria ser a espinha dorsal deste conto. Infelizmente, nem mesmo com toda a tarimba dos realizadores, eles são capazes de conceber um longa coerente. Assim ficamos com uma mistura entre um tema sério e sóbrio, e outro mais fantástico que não são capazes dialogar nunca entre si. Fora isso, os 120 minutos de projeção se arrastam fazendo a experiência desnecessariamente alongada, quando para o resultado final meia hora a menos daria conta do recado. Para colocar o prego no caixão, se você é daqueles que se incomodam com desfechos anticlimáticos, espere para ver como ficou o final deste Vozes e Vultos, e se prepare para urrar.

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