terça-feira , 24 dezembro , 2024

Crítica | Westworld 3×08 – Crisis Theory

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Aquele com o fim do mundo e respostas fáceis

Desde o início da 1ª temporada,Westworld fincou o pé como uma série sem respostas fáceis. Dentro da aventura traçada pelos visitantes no parque se escondia uma outra aventura, na forma de um convite ao espectador para que também se dispusesse a desbravar aquele estranho mundo do Velho Oeste. Fosse catalogando pistas ao longo dos episódios ou acompanhando as pessoas que melhor catalogam estas pistas, o público poderia escolher embarcar ou não neste desafio, e os resultados variavam entre muito bons ou exageradamente complicados. E nada disso é o caso da 3ª temporada.



Quando se despiu de seu quebra-cabeças e fez juras de uma nova temporada sem tantas linhas temporais misturadas e “mais simples” de se entender, uma novidade à época bem-vinda após um segundo ano lotado de conceitos e complicações, o resultado ficou longe de ser o que Westworld condicionou seu público a esperar. Os oito episódios da temporada cavalgam sem muita emoção pelos mesmos terrenos que já desbravou anteriormente, mas sem metade do deslumbre que já causou. Ao invés de dar belos saltos e trotar com elegância, como já fez um dia, simplesmente passa cabisbaixa por campos cheios de oportunidades não exploradas.

Metáforas equinas à parte, isso quer dizer que em um mundo repleto de novas oportunidades para continuar investigando a psique humana e a complexidade do conceito de livre-arbítrio em uma realidade controlada por inteligências artificiais (guardadas as devidas proporções, não muito diferente da nossa), a 3ª temporada cai em um lugar comum e repetitivo. Grande parte do problema aqui está em um conceito dos mais básicos, em que a temporada deixa bastante a desejar: nenhum dos personagens realmente parece um personagem, não há história ou laços emocionais o suficiente para que haja empatia com qualquer um deles. 

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Maeve (Thandie Newton) se transforma em um fantoche nas mãos de Serac (Vincent Cassel), e mesmo com a promessa de reuni-la com a filha, era de se esperar que ela fosse mais esperta antes de seguir os planos dele tão cegamente; o próprio Serac é desprovido de qualquer nuance, exceto uma fraca tentativa de algo a mais com uma história emotiva sobre seu passado com o irmão; quando falamos do outrora complexo Bernard, ou Bernarnold (Jeffrey Wright), o que resta aqui é um token que fica de um lado para outro obedecendo ordens sem saber exatamente por quê. E se a esperança era o novato Caleb Nichols (Aaron Paul), ele é uma boa tentativa, mas não passa disso. A sua história é apresentada de uma forma tão segmentada e errática que torna quase impossível criar qualquer laço aí, até mesmo porque nada parecido com isso emana de Dolores por ele. 

Isso tudo nos deixa com a única personagem que tem um arco narrativo simpático, mérito conjunto da história e do talento enfim aproveitado de Tessa Thompson. Westworld sempre esteve em seu melhor quando foi capaz de surpreender em mínimos detalhes, quando conseguiu criar empatia com as mais sinuosas relações familiares em meio a diálogos complexos sobre criação divina e ‘bom x mau’. É exatamente o que faz da história de ‘Hallelores’ aquela com a qual vale a pena passar um tempo, e não por acaso o episódio focado nela, ‘The Absence of Field’, permanece com o título de o melhor da temporada.

Ironicamente, desde aquele episódio ficou claro que o caminho de Hallelores seria o de eventualmente mudar de lado e ficar contra a sua criadora, mas isso não faz com que a jornada e o resultado sejam menos impactantes. Pelo contrário, essa incongruência serve como uma mensagem: para uma série tão preocupada com esconder suas reviravoltas e plantar mistérios, Westworld se sai melhor quando desce do pedestal de tentar debater filosofia com conceitos mitológicos e deixa seus personagens se transformarem de forma livre.

Tudo isso nos leva a este final de temporada que, a contragosto, se vê obrigado a encerrar a história. A contragosto porque alterna entre diálogos puramente expositivos — a cena de Caleb conversando com Dolores (Evan Rachel Wood) no corpo de metal e a cena em que Serac explica para Maeve que precisa de Dolores para reaver as coordenadas de onde está escondido o Sublime — e o momento em que Dolores e Maeve enfim dialogam e a loira explica o seu plano. Deixar esta conversa para o episódio final é algo que poderia ter funcionado se a narrativa da temporada não tivesse sido tão linear, e transforma duas das personagens mais interessantes da série em simples caricaturas do que elas aprenderam a ser nos anos anteriores. Fica um retrogosto amargo; ao tentar simplificar as coisas, Westworld escancarou uma história sem história: afinal, o que esta temporada realmente acrescenta a tudo que foi discutido nos anos anteriores? O fato de os humanos também estarem sujeitos aos seus ciclos narrativos em loop ou a grandiosa conclusão de as pessoas terem capacidade de escolha a respeito de seus destinos? Bem, deu para contar isso em três ou quatro episódios. 

Talvez o fato de ter migrado para o ‘mundo real’ tenha tornado mais difícil a suspensão da realidade que era muito mais simples dentro do parque, ou deixar de lado os enlaces temporais tenha realmente escancarado que Westworld não tinha muito a dizer este ano do que já havia dito. É triste ver esta temporada se encerrar tão sem vida, ou Vincent Cassel e Aaron Paul não terem conseguido fazer seus personagens saltarem aos olhos, como sabemos que eles são capazes de fazer. De uma forma ou de outra, sobra a reflexão: Westworld fez um trabalho melhor quando não tentava agradar a todo mundo. 

A cena pós-crédito

O mais revelador do episódio está, fato, no pós-créditos. Determinado a salvar o mundo, William (Ed Harris) vai até uma das sedes da Delos, em Dubai, onde ele se encontra com Hallelores, a cópia rebelde de Dolores no corpo de Charlotte Halle. Os planos dela, no entanto, estão à frente dele. Sabemos, do episódio 6 da temporada, que ela conseguiu salvar os dados dos anfitriões do parque antes de Serac tomar conta da Delos, e é isso que ela utilizou para fazer uma cópia de William. O anfitrião mata o verdadeiro William humano, e a partir de agora teremos apenas o Homem de Preto. Talvez isso ajude a situar melhor a cena pós-créditos da 2ª temporada, quando uma versão do Homem de Preto estava sendo testada por ‘fidelidade’ em um futuro distante, dentro do parque. 

Também entendemos que Hallelores está construindo todo um exército de anfitriões com os dados que recuperou da Delos e, longe dali, temos um Bernard que acorda todo empoeirado em um quarto de hotel após ter feito uma visita ao Sublime para descobrir “o que acontece após o fim do mundo”. Dada a camada de poeira sobre seu corpo, podemos entender que esta cena se passa em um futuro distante, talvez tão distante quanto o futuro da cena pós-créditos da 2ª temporada. O que será que Bernard descobriu em sua incursão? Seja o que for, o seu olhar quando acorda parece bem determinado e feroz, portanto é bom ficarmos de olho: talvez este futuro distante seja o que nos guarda para a temporada seguinte.

Quanto a Dolores? Em uma série como Westworld , nunca se sabe exatamente o que está em curso ou quais surpresas a 4ª temporada vai guardar. Dificilmente Evan Rachel Wood estará completamente de fora da temporada, mas aquele pareceu um encerramento genuíno para a jornada da personagem.

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Laysa Zanettihttps://cinepop.com.br
Repórter, Crítica de Cinema e TV formada em Twin Peaks, Fringe, The Leftovers e The Americans. Já vi Laranja Mecânica mais vezes que você e defendo o final de Lost.

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Quando se despiu de seu quebra-cabeças e fez juras de uma nova temporada sem tantas linhas temporais misturadas e “mais simples” de se entender, uma novidade à época bem-vinda após um segundo ano lotado de conceitos e complicações, o resultado ficou longe de ser o que Westworld condicionou seu público a esperar. Os oito episódios da temporada cavalgam sem muita emoção pelos mesmos terrenos que já desbravou anteriormente, mas sem metade do deslumbre que já causou. Ao invés de dar belos saltos e trotar com elegância, como já fez um dia, simplesmente passa cabisbaixa por campos cheios de oportunidades não exploradas.

Metáforas equinas à parte, isso quer dizer que em um mundo repleto de novas oportunidades para continuar investigando a psique humana e a complexidade do conceito de livre-arbítrio em uma realidade controlada por inteligências artificiais (guardadas as devidas proporções, não muito diferente da nossa), a 3ª temporada cai em um lugar comum e repetitivo. Grande parte do problema aqui está em um conceito dos mais básicos, em que a temporada deixa bastante a desejar: nenhum dos personagens realmente parece um personagem, não há história ou laços emocionais o suficiente para que haja empatia com qualquer um deles. 

Maeve (Thandie Newton) se transforma em um fantoche nas mãos de Serac (Vincent Cassel), e mesmo com a promessa de reuni-la com a filha, era de se esperar que ela fosse mais esperta antes de seguir os planos dele tão cegamente; o próprio Serac é desprovido de qualquer nuance, exceto uma fraca tentativa de algo a mais com uma história emotiva sobre seu passado com o irmão; quando falamos do outrora complexo Bernard, ou Bernarnold (Jeffrey Wright), o que resta aqui é um token que fica de um lado para outro obedecendo ordens sem saber exatamente por quê. E se a esperança era o novato Caleb Nichols (Aaron Paul), ele é uma boa tentativa, mas não passa disso. A sua história é apresentada de uma forma tão segmentada e errática que torna quase impossível criar qualquer laço aí, até mesmo porque nada parecido com isso emana de Dolores por ele. 

Isso tudo nos deixa com a única personagem que tem um arco narrativo simpático, mérito conjunto da história e do talento enfim aproveitado de Tessa Thompson. Westworld sempre esteve em seu melhor quando foi capaz de surpreender em mínimos detalhes, quando conseguiu criar empatia com as mais sinuosas relações familiares em meio a diálogos complexos sobre criação divina e ‘bom x mau’. É exatamente o que faz da história de ‘Hallelores’ aquela com a qual vale a pena passar um tempo, e não por acaso o episódio focado nela, ‘The Absence of Field’, permanece com o título de o melhor da temporada.

Ironicamente, desde aquele episódio ficou claro que o caminho de Hallelores seria o de eventualmente mudar de lado e ficar contra a sua criadora, mas isso não faz com que a jornada e o resultado sejam menos impactantes. Pelo contrário, essa incongruência serve como uma mensagem: para uma série tão preocupada com esconder suas reviravoltas e plantar mistérios, Westworld se sai melhor quando desce do pedestal de tentar debater filosofia com conceitos mitológicos e deixa seus personagens se transformarem de forma livre.

Tudo isso nos leva a este final de temporada que, a contragosto, se vê obrigado a encerrar a história. A contragosto porque alterna entre diálogos puramente expositivos — a cena de Caleb conversando com Dolores (Evan Rachel Wood) no corpo de metal e a cena em que Serac explica para Maeve que precisa de Dolores para reaver as coordenadas de onde está escondido o Sublime — e o momento em que Dolores e Maeve enfim dialogam e a loira explica o seu plano. Deixar esta conversa para o episódio final é algo que poderia ter funcionado se a narrativa da temporada não tivesse sido tão linear, e transforma duas das personagens mais interessantes da série em simples caricaturas do que elas aprenderam a ser nos anos anteriores. Fica um retrogosto amargo; ao tentar simplificar as coisas, Westworld escancarou uma história sem história: afinal, o que esta temporada realmente acrescenta a tudo que foi discutido nos anos anteriores? O fato de os humanos também estarem sujeitos aos seus ciclos narrativos em loop ou a grandiosa conclusão de as pessoas terem capacidade de escolha a respeito de seus destinos? Bem, deu para contar isso em três ou quatro episódios. 

Talvez o fato de ter migrado para o ‘mundo real’ tenha tornado mais difícil a suspensão da realidade que era muito mais simples dentro do parque, ou deixar de lado os enlaces temporais tenha realmente escancarado que Westworld não tinha muito a dizer este ano do que já havia dito. É triste ver esta temporada se encerrar tão sem vida, ou Vincent Cassel e Aaron Paul não terem conseguido fazer seus personagens saltarem aos olhos, como sabemos que eles são capazes de fazer. De uma forma ou de outra, sobra a reflexão: Westworld fez um trabalho melhor quando não tentava agradar a todo mundo. 

A cena pós-crédito

O mais revelador do episódio está, fato, no pós-créditos. Determinado a salvar o mundo, William (Ed Harris) vai até uma das sedes da Delos, em Dubai, onde ele se encontra com Hallelores, a cópia rebelde de Dolores no corpo de Charlotte Halle. Os planos dela, no entanto, estão à frente dele. Sabemos, do episódio 6 da temporada, que ela conseguiu salvar os dados dos anfitriões do parque antes de Serac tomar conta da Delos, e é isso que ela utilizou para fazer uma cópia de William. O anfitrião mata o verdadeiro William humano, e a partir de agora teremos apenas o Homem de Preto. Talvez isso ajude a situar melhor a cena pós-créditos da 2ª temporada, quando uma versão do Homem de Preto estava sendo testada por ‘fidelidade’ em um futuro distante, dentro do parque. 

Também entendemos que Hallelores está construindo todo um exército de anfitriões com os dados que recuperou da Delos e, longe dali, temos um Bernard que acorda todo empoeirado em um quarto de hotel após ter feito uma visita ao Sublime para descobrir “o que acontece após o fim do mundo”. Dada a camada de poeira sobre seu corpo, podemos entender que esta cena se passa em um futuro distante, talvez tão distante quanto o futuro da cena pós-créditos da 2ª temporada. O que será que Bernard descobriu em sua incursão? Seja o que for, o seu olhar quando acorda parece bem determinado e feroz, portanto é bom ficarmos de olho: talvez este futuro distante seja o que nos guarda para a temporada seguinte.

Quanto a Dolores? Em uma série como Westworld , nunca se sabe exatamente o que está em curso ou quais surpresas a 4ª temporada vai guardar. Dificilmente Evan Rachel Wood estará completamente de fora da temporada, mas aquele pareceu um encerramento genuíno para a jornada da personagem.

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Laysa Zanettihttps://cinepop.com.br
Repórter, Crítica de Cinema e TV formada em Twin Peaks, Fringe, The Leftovers e The Americans. Já vi Laranja Mecânica mais vezes que você e defendo o final de Lost.

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