sábado , 21 dezembro , 2024

Festival de Cannes 2021 | “Não é blasfêmia se é um fato histórico”, afirma Verhoeven sobre a freira lésbica Benedetta

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Lançado no Festival de Cannes na noite de sexta-feira, dia 9 de junho, Benedetta chama atenção pela sinopse, elenco e direção. Se até hoje a posição da igreja católica sobre relações homoafetivas causa controvérsias, imagina dentro da igreja e entre freiras no século XVII. Imaginou? Paul Verhoeven (Elle) deixou a mente correr solta ao ler o livro acadêmico Atos Impuros: a vida de uma freira lésbica na Itália renascentista, de Judith C. Brown, publicada em 1986, nos EUA, e decidiu adaptá-lo, ao seu modo, para o cinema. 

Paul Verhoeven com o livro Atos Impuros (Foto: Letícia Alassë)

Ficção ou realidade?



Acompanhado do livro como um escudo, o diretor holandês de 82 anos participou da coletiva de imprensa do Festival, ao lado do elenco e dos produtores, munido com o discurso de curiosidade e surpresa pelos acontecimentos dentro da igreja católica no século XVII. “Numa atmosfera da religião católica romana era desconhecido que duas mulheres pudessem ter uma relação sexual e os homens diziam que era impossível. Nós nos apoiamos nisso no filme.”, declara o diretor.

Ele continua a justificar o seu interesse em fazer um paralelo entre o passado de repressão católica e o atual momento  em relação à união homosexual. Benedetta Carlini é uma pessoa real, acusada de lesbianismo e condenada a viver uma espécie de prisão no convento até o dia da sua morte. A versão de Verhoeven não segue exatamente os mesmos meandros, mas ele afirma: “é um livro acadêmico, com notas no final, ou seja, não tinha narrativa. A gente criou uma narrativa, mas baseada completamente nos textos do livro e, assim, concluímos o roteiro”.

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Nudez e pudor

Não é de hoje que Paul Verhoeven causa polêmica e desagrado com a exposição do corpo feminino. O clássico ganhador da Framboesa de Ouro, ShowGirls (1995), é um exemplo perfeito do tiro que saiu pela culatra, no meio de outros acertos. Intérprete de Benedetta, a atriz Virginie Efira declarou ter adorado ficar nua durante as filmagens, porque ajudou a compreender o desprendimento da personagem. O que mais lhe atraiu ao papel foi a manipulação e a mentira através da crença de ser uma pessoa especial em contato com Jesus.

Virginie Efira vive a protagonista Benedetta (Foto: Letícia Alassë)

Ao questionada sobre o movimento de atrizes contra a nudez desnecessária no cinema, Virginie foi taxativa ao responder: “essa questão nunca teve vigor aqui na França”. Já a atriz, Daphné Patakia, que vive a amante de Benedetta, Bartolomea, confirmou que se sentiu livre nua em cena. “Lembro de um dia na gravação que Paul falou: ‘fazer um filme é uma democracia’. (…) Antes das gravações, eu procurei as coletivas dos filmes antigos do Paul para saber o que as atrizes falaram após trabalhar com ele”, confessa a jovem. 

Belga de 29 anos, Daphné estava completamente emocionada no tapete vermelho do dia anterior e, durante a coletiva, sempre perguntava se tinha explicado direito ou dito alguma bobagem. Para todas as perguntas sobre nudez e sexo, a atriz foi sucinta em explicar. “É como em Instinto Fatal (1992) [também de Paul Verhoeven] na cena de sexo [entre Sharon Stone e Michael Douglas] não é apenas a nudez, o sexo, é todo um contexto daquela sequência de suspense”. 

Reação do público

Paul Verhoeven disse que os jornalistas estavam muito puritanos. Uma deles fez uma comparação entre o episódio da charge de Maomé e o atentado à redação do Charlie Hebbo, em 2015, com a utilização de um imagem de madeira da Virgem Maria como consolo nos encontros sexuais entre Benedetta e Bartolomea. Ao que veemente Paul Verhoeven respondeu: “Não vejo relação na sua pergunta. Não é blasfêmia se é um fato histórico. Eu não posso desfazer o que [os membros] a igreja fez séculos atrás”. 

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Para finalizar a concentração de perguntas sobre o moralismo e o nudismo, o cineasta proclamou: “Para as pessoas fazerem sexo, elas têm que tirar a roupa”. Parece óbvio, mas quantidade de questões sobre o sexo o levou a ler uma passagem do livro adaptado, a qual enumerava a frequência com Benedetta se despia ou se tocava por dia e semana. Assim, ele concluiu: “isso responde sobre o que é o filme”. 

O produtor executivo Saïd Ben Saïd resumiu o projeto com algumas palavras: “é um filme experimental. Não é um filme de grande evidência, mas um filme muito misterioso, enigmático e estranho por vários aspectos. Além do mais, ele surpreende o espectador (…). É um filme desestabilizador.” Com Jesus a cavalgar um cavalo branco e exterminar os cavaleiros  para salvar a donzela em perigo, uma nova concepção de Jesus pode ser desestabilizadora.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Paul Verhoeven com o livro Atos Impuros (Foto: Letícia Alassë)

Ficção ou realidade?

Acompanhado do livro como um escudo, o diretor holandês de 82 anos participou da coletiva de imprensa do Festival, ao lado do elenco e dos produtores, munido com o discurso de curiosidade e surpresa pelos acontecimentos dentro da igreja católica no século XVII. “Numa atmosfera da religião católica romana era desconhecido que duas mulheres pudessem ter uma relação sexual e os homens diziam que era impossível. Nós nos apoiamos nisso no filme.”, declara o diretor.

Ele continua a justificar o seu interesse em fazer um paralelo entre o passado de repressão católica e o atual momento  em relação à união homosexual. Benedetta Carlini é uma pessoa real, acusada de lesbianismo e condenada a viver uma espécie de prisão no convento até o dia da sua morte. A versão de Verhoeven não segue exatamente os mesmos meandros, mas ele afirma: “é um livro acadêmico, com notas no final, ou seja, não tinha narrativa. A gente criou uma narrativa, mas baseada completamente nos textos do livro e, assim, concluímos o roteiro”.

Nudez e pudor

Não é de hoje que Paul Verhoeven causa polêmica e desagrado com a exposição do corpo feminino. O clássico ganhador da Framboesa de Ouro, ShowGirls (1995), é um exemplo perfeito do tiro que saiu pela culatra, no meio de outros acertos. Intérprete de Benedetta, a atriz Virginie Efira declarou ter adorado ficar nua durante as filmagens, porque ajudou a compreender o desprendimento da personagem. O que mais lhe atraiu ao papel foi a manipulação e a mentira através da crença de ser uma pessoa especial em contato com Jesus.

Virginie Efira vive a protagonista Benedetta (Foto: Letícia Alassë)

Ao questionada sobre o movimento de atrizes contra a nudez desnecessária no cinema, Virginie foi taxativa ao responder: “essa questão nunca teve vigor aqui na França”. Já a atriz, Daphné Patakia, que vive a amante de Benedetta, Bartolomea, confirmou que se sentiu livre nua em cena. “Lembro de um dia na gravação que Paul falou: ‘fazer um filme é uma democracia’. (…) Antes das gravações, eu procurei as coletivas dos filmes antigos do Paul para saber o que as atrizes falaram após trabalhar com ele”, confessa a jovem. 

Belga de 29 anos, Daphné estava completamente emocionada no tapete vermelho do dia anterior e, durante a coletiva, sempre perguntava se tinha explicado direito ou dito alguma bobagem. Para todas as perguntas sobre nudez e sexo, a atriz foi sucinta em explicar. “É como em Instinto Fatal (1992) [também de Paul Verhoeven] na cena de sexo [entre Sharon Stone e Michael Douglas] não é apenas a nudez, o sexo, é todo um contexto daquela sequência de suspense”. 

Reação do público

Paul Verhoeven disse que os jornalistas estavam muito puritanos. Uma deles fez uma comparação entre o episódio da charge de Maomé e o atentado à redação do Charlie Hebbo, em 2015, com a utilização de um imagem de madeira da Virgem Maria como consolo nos encontros sexuais entre Benedetta e Bartolomea. Ao que veemente Paul Verhoeven respondeu: “Não vejo relação na sua pergunta. Não é blasfêmia se é um fato histórico. Eu não posso desfazer o que [os membros] a igreja fez séculos atrás”. 

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Para finalizar a concentração de perguntas sobre o moralismo e o nudismo, o cineasta proclamou: “Para as pessoas fazerem sexo, elas têm que tirar a roupa”. Parece óbvio, mas quantidade de questões sobre o sexo o levou a ler uma passagem do livro adaptado, a qual enumerava a frequência com Benedetta se despia ou se tocava por dia e semana. Assim, ele concluiu: “isso responde sobre o que é o filme”. 

O produtor executivo Saïd Ben Saïd resumiu o projeto com algumas palavras: “é um filme experimental. Não é um filme de grande evidência, mas um filme muito misterioso, enigmático e estranho por vários aspectos. Além do mais, ele surpreende o espectador (…). É um filme desestabilizador.” Com Jesus a cavalgar um cavalo branco e exterminar os cavaleiros  para salvar a donzela em perigo, uma nova concepção de Jesus pode ser desestabilizadora.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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