segunda-feira, março 18, 2024

Friends 25 anos | Problematizações exageradas são injustas com uma série que marcou época

“Mas o mundo hoje está muito chato.” “Não se pode falar mais nada.” “É muito mimimi.” “Tudo é politicamente correto agora.” Frases como estas, geralmente, são usadas por pessoas incomodadas por terem perdido o direito de ser intolerantes e preconceituosas por aí. O mundo mudou e tem muita gente que tem dificuldade em enxergar.

Dito isso, é importante reconhecer que há exageros em algumas abordagens, especialmente quando tentam analisar obras do passado com o olhar de hoje. Toda obra de arte é aberta a reinterpretações, mas também é um retrato da época em que foi realizada. Nos últimos tempos, temos visto uma tendência muito forte de reanalisar Friends através dos olhares de hoje em dia. Muita coisa mudou de 1994 pra cá. São 25 anos desde que a série estreou em 22 de setembro de 94.

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25 anos. Um quarto de século. Quando Friends foi lançada, Itamar Franco era presidente, o Brasil havia acabado de ser tetracampeão da Copa do Mundo, a internet era privilégio de poucos e o cinema fazia barulho com O Rei Leão e Forrest Gump. Muita coisa mudou. E continua mudando, algo inerente deste atual momento marcado pela globalização e pela vasta produção de conteúdo.

Antes de nos aprofundarmos no debate, é importante ressaltar que em nenhum momento defendemos que os espectadores deixem de reconhecer problemas eventuais na série e questões que hoje são bastante incômodas. O que não podemos é querer “cancelar” Friends por causa de um humor que era absolutamente normal nos anos 90 e início dos 2000.

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Se antigamente o debate envolvia o fato de que os seis jamais conseguiriam morar em apartamentos como os da série ou pela ausência de personagens negros (o que de fato era um problema), hoje trata temas como homofobia, gordofobia, machismo e misoginia.

A tendência de uma revisita crítica ao universo de Friends já tem alguns anos. Provavelmente, surge com o debate se Ross (David Schwimmer) seria ou não um “boy lixo”. Embora com bons argumentos (ele é sim ciumento e possessivo em inúmeros episódios, e todo debate sobre se “estavam dando um tempo ou não” nasce por causa de uma traição instantânea), é bem verdade que a discussão se aproveita de algumas picuinhas que são simplesmente gatilhos do roteiro, meras piadinhas que faziam sentido à época e que hoje estão ultrapassadas. É verdade que Ross se incomoda do filho brincar de boneca, faz comentários jocosos sobre ter sido trocado por outra mulher, se irrita com a possibilidade de um homem ser babá e por aí vai. São atitudes idiotas analisadas isoladamente, mas era tudo a serviço de um roteiro, de um humor que era comum à época. Além disso, não podemos ignorar outros momentos em que Ross foi uma boa pessoa, como quando convence Susan a se casar com Carol, quando ajuda a irmã financeiramente após ela perder o emprego ou mesmo quando dá uma bicicleta para Phoebe (Lisa Kudrow).

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Não deixe de assistir:

Ah… existe todo o debate sobre ele ter feito Rachel (Jennifer Aniston) desistir de seu sonho de trabalhar em Paris. Além da discussão excluir o fato de Rachel decidir não ir por conta própria (um direito dela), também ignora todo um contexto narrativo. Estamos diante de uma série de comédia. É uma ficção. Por dez temporadas, a público ficou na torcida por Ross e Rachel, qualquer coisa diferente seria anti-clímax. Se ele fosse para Paris com ela, o debate seria sobre o fato dele abandonar Ben. Então, não tem jeito certo para Ross.

Ao longo de seus dez anos, Friends cometeu alguns equívocos que são ainda mais evidentes nos dias de hoje. Todas as histórias sobre a adolescência de Monica (Courtney Cox) são baseadas em seu peso numa clara demonstração de gordofobia e seu “traje de gorda” nunca foi realmente divertido. Ainda que traçado como adorável, Joey (Matt LeBlanc) tinha seus momentos de machismo e objetificação de mulheres, embora nunca no mesmo nível de Charlie Harper (Two and a Half Men) ou Barney Stinson (How I Met Your Mother). Temos também piadas homofóbicas, principalmente na trama envolvendo o pai de Chandler (Matthew Perry).

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Mais uma vez, é importante aceitar e debater os problemas, mas também olhar com a visão da época. Hoje em dia, a trama do pai do Chandler é notoriamente equivocada, até com relação a uma distinção mais clara. A série não deixa claro se estamos diante de uma mulher trans, uma travesti ou uma drag queen. E não é por maldade, mas talvez por uma falta de clareza na questão de gênero, que não era tão debatida quanto hoje. Ainda que sem saber trabalhar bem a história e a personagem, não há como não reconhecer que a série investiu em uma personagem LGBTQ e fez questão de debater questões sobre aceitação familiar.

Na hora de atacar Friends, muita gente lembra das piadinhas homofóbicas ou de Joey sexualizando ao máximo a relação entre Carol e Susan, mas parecem se esquecer de um ponto fundamental: a série retratou um casamento LGBTQ logo em sua segunda temporada. Foi a primeira produção televisiva da história a mostrar um casamento entre duas mulheres. O episódio causou polêmica nos Estados Unidos, com ameaças de boicote, mas bateu recordes de audiência e ajudou a consolidar o sucesso da produção. Para terem ideia do quão revolucionário foi este momento televisivo, o clássico episódio de Ellen, em que Ellen DeGeneres sai do armário, foi exibido quase um ano após o casamento de Carol e Susan.

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A série também foi muito importante no debate acerca de infertilidade, adoção e alternativas de famílias. Não só Phoebe aceita ser barriga de aluguel do irmão, e a série retrata a dificuldade da decisão ao mesmo tempo em que faz piada com isso, como Monica e Chandler também buscam a adoção ao descobrir que não poderiam ter um filho biológico.

E não podemos esquecer do quanto a série valorizava personagens femininas. Eram três protagonistas mulheres, todas independentes, trabalhadoras e sexualmente ativas. Logo no primeiro episódio, Monica dorme com seu encontro na primeira noite. A série brinca com isso, mas nunca a julga de forma excessiva. Neste sentido, é curioso notar ainda que Monica e Rachel são muito mais bem sucedidas em suas carreiras do que seus amigos homens.

Pegar piadas ou núcleos isolados da série para transformá-la em algo que nunca foi é uma injustiça. Friends nunca foi politicamente incorreta. Tem piadas que não funcionam tão bem atualmente? Sem dúvida. Mas segue sendo uma obra incrível sobre amizade, confiança, amor e tudo mais. E é por isso que segue sendo vista e revista de forma ininterrupta na Netflix e na Warner Channel.

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