quinta-feira , 26 dezembro , 2024

O Silêncio dos Inocentes | O Thriller Mais Prestigiado do Cinema Completa 30 Anos e Mantém Recorde no Oscar

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Lançado em circuito pelos EUA no dia 14 de fevereiro de 1991, tendo antes realizado sessões de pré-estreia em Nova York (30 de janeiro) e na Califórnia (1º de fevereiro), e chegando ao Brasil no dia 17 de maio do mesmo ano, O Silêncio dos Inocentes completa 30 anos em 2021. Parte do acervo daquele ano no celebrado Festival de Berlim, o filme, é claro, viveria para se tornar um dos mais queridos de todos os tempos na opinião dos fãs, cinéfilos, críticos e especialistas de forma geral. Além de seu invejável e muito comentado recorde ainda mantido nos prêmios da Academia, vulgo Oscar.

Não é todo dia que um filme de suspense com fortes tintas para o terror se torna fenômeno de popularidade conseguindo inclusive transcender seu próprio gênero. O Silêncio dos Inocentes é daquele tipo que mesmo os não adeptos de filmes mais intensos e explícitos terminam por apreciar. Em voga novamente devido ao recém-lançado programa televisivo Clarice (da rede CBS), O Silêncio dos Inocentes é um longa imperdível, que você pode conferir ou revisitar através da rede Telecine, ou no streaming Telecine Play neste exato momento.



O cartaz clássico de ‘O Silêncio dos Inocentes’.

O tópico que vem sempre à mente quando falamos em O Silêncio dos Inocentes é seu recorde no Oscar. O longa não se destaca somente por ser um dos poucos thrillers que flertam com o terror a serem indicados na categoria de melhor filme no Oscar – o que por si só já seria um grande feito. Mas O Silêncio dos Inocentes levou de fato tal prêmio, além de outros quatro, dos sete aos quais estava indicado. Estes, no entanto, não foram quaisquer cinco Oscar, e sim os principais prêmios da noite, conhecidos como o Big Five (melhor filme, diretor, ator, atriz e roteiro). Tão raro é este feito que na história do Oscar apenas outros dois longas foram capazes de realiza-lo: Aconteceu Naquela Noite (1934) e Um Estranho no Ninho (1975). Sendo que O Silêncio dos Inocentes ainda mantém o recorde como o último filme a levar o Big Five.

O Silêncio dos Inocentes é baseado no romance homônimo do escritor Thomas Harris – responsável por uma série de livros protagonizados pelo personagem Hannibal Lecter. A história apresenta uma recruta novata do FBI em treinamento, a agente Clarice Starling, se deparando com a maior oportunidade de sua curta carreira e também seu desafio mais assustador: manter laços profissionais com um psicopata encarcerado, o Dr. Hannibal ‘O Canibal’ Lecter, a fim de obter insights na caçada a outro maníaco, o travesti Buffalo Bill – que anda sequestrando e assassinando jovens mulheres.

O pôster alternativo do filme, estampado por Hannibal e não Clarice.

A jornada de Clarice é uma verdadeira descida ao inferno, que seria influente para produções como Seven (1995), de David Fincher, por exemplo. Clarice é uma personagem tão rica que além de ter sido votada a sexta na lista dos maiores heróis do cinema no AFI (American Film Institute), sendo a personagem feminina mais bem posicionada, ainda inspirou a criação de outra que se tornaria igualmente icônica: a agente Dana Scully (Gillian Anderson) do seriado Arquivo X (1993-2018), segundo o próprio dono da ideia Chris Carter.

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Para esta história, uma das inspirações para a relação entre a agente Clarice Starling e o psicopata Hannibal Lecter foi o relacionamento da vida real entre Robert Keppel, professor de criminologia e pesquisador da Universidade de Washington e serial killer Ted Bundy – que investigaram juntos o caso dos assassinatos de Green River, em Washington, levando à eventual prisão de Gary Ridgway, assassino confesso de quarenta e oito vítimas. Fora isso, assim como Psicose (1960) e O Massacre da Serra Elétrica (1974) antes dele, O Silêncio dos Inocentes também faz uso do modus operandi de outro psicopata da vida real: Ed Gein, notório por seus crimes de necrofilia e utilização de pele humana na confecção de objetos, mobília e máscaras em sua casa.

‘A Bela e a Fera’ – a relação de Hannibal e Claire foi inspirada na vida real.

O Silêncio dos Inocentes, embora poucos saibam, é um dos raros casos em que uma continuação se torna mais famosa e bem sucedida que seu predecessor. Explico. Acontece que o primeiro livro de Harris dentro do ‘Hannibalverse’ a ser adaptado ao cinema foi Caçador de Homens (Manhunter, 1986), de Michael Mann, um fiasco que terminou no ostracismo – hoje ressurgindo como cult. Neste filme, Hannibal é interpretado por Brian Cox. Ou seja, para O Silêncio dos Inocentes uma verdadeira reformulação de equipe, diretor e elenco precisou ocorrer a fim de se desassociar da produção anterior. E não poderia ter dado mais certo. Azar do produtor Dino De Laurentiis, que terminou passando a oportunidade de envolvimento com este filme, justamente pelo fato de que Caçador de Homens, produzido por ele, havia flopado. De Laurentiis seguiu para produzir Hannibal (2001) e Dragão Vermelho (2002) – sequência e pré-sequência de O Silêncio dos Inocentes, sendo este último a refilmagem de Caçador de Homens.

Todos os envolvidos na produção do filme tem o mérito pelo trabalho bem feito, mas como de costume, três se destacam. Estes sendo o diretor Jonatham Demme e os protagonistas Jodie Foster e Anthony Hopkins. Porém, o trio poderia ter ficado de fora da obra. Antes de Demme ser contratado existiu o fator Gene Hackman. O lendário ator eternizado como o primeiro Lex Luthor do cinema, comprou os direitos para a adaptação cinematográfica de O Silêncio dos Inocentes assim que terminou de ler o livro, batendo a atriz Jodie Foster na empreitada, que igualmente havia ficado fascinada com a trama. Hackman planejava fazer do longa sua estreia na direção, depois visando um papel no filme (Hackman cogitou ser Hannibal) e por fim cedendo os direitos para a Orion Pictures por US$500 mil. Gene Hackman nunca viria a dirigir um filme.

Criador e criatura. O diretor Jonathan Demme e Jodie Foster fizeram uma dupla de sucesso.

Com a entrada de Jonathan Demme, a protagonista Clarice quase teve as formas de uma atriz bem famosa, mas não Jodie Foster. Acontece que Demme havia dirigido Michelle Pfeiffer na comédia De Caso com a Máfia (1988) e desenvolvido com ela uma amizade, além de ter sido impressionado pelo talento da estrela. Pfeiffer, então com 33 anos, era uma jovem atriz em ascensão e nome quente da época, somando no currículo duas recentes e consecutivas indicações ao Oscar (coadjuvante por Ligações Perigosas e protagonista por Susie e os Baker Boys) em 1989 e 1990, os anos que precederam O Silêncio dos Inocentes. Justamente devido ao crescente prestígio, Pfeiffer exigia US$2 milhões para viver a agente Starling no cinema. Pré-requisito este não atendido pela produtora Orion Pictures, fazendo Pfeiffer e Starling seguirem caminhos diferentes.

Em cena entrava Jodie Foster, que na época igualmente colecionava duas indicações ao Oscar no currículo, mas com uma grande diferença: havia saído vitoriosa da segunda (por Acusados em 1989) – a primeira foi por Taxi Driver (em 1977). Foster, então com 29 anos, fazia forte lobby pelo papel e era a primeira opção do roteirista Ted Tally, responsável pela adaptação do livro para as telas. Com a saída de Pfeiffer de cena, Demme finalmente ficaria à vontade com a ideia de ter Jodie Foster no papel, a enaltecendo por sua força e determinação para ganhar a personagem. Demme a contratou após apenas um encontro.

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A ‘felina’ Michelle Pfeiffer quase foi Clarice Starling em ‘O Silêncio dos Inocentes’.

Apesar do grande interesse de Jodie Foster pelo papel, a atriz sabia muito bem de seu status na indústria. Assim, mesmo após ter conseguido o trabalho que perseguia com unhas e dentes, a estrela tratou de orquestrar um acordo com a Orion Pictures a garantindo a direção de uma obra para a casa. O escolhido para a venda casada foi Mentes que Brilham, drama lançado no mesmo ano de O Silêncio dos Inocentes que marcou a estreia de Foster na direção e que a traz também como atriz no papel da mãe solteira de um menino gênio.

Mesmo após o acordo com Foster, a Orion Pictures precisava escolher um postulante ao Oscar em seu acervo de lançamentos da época, dentre três com mais potencial: O Silêncio dos Inocentes, Mentes que Brilham e Céu Azul. A escolha foi por evidenciar o primeiro, enquanto o terceiro era engavetado para um lançamento apenas três anos depois, em 1994. Céu Azul terminou levando o Oscar de protagonista para Jessica Lange. Já Foster não teve do que reclamar, já que embora Mentes que Brilham tenha passado longe do Oscar, O Silêncio dos Inocentes terminou garantindo para a atriz a estatueta de protagonista. Aos 29 anos, Jodie Foster se tornava a segunda atriz a ganhar dois Oscar antes dos 30 anos. A primeira havia sido a alemã Luise Rainer, aos 28 anos, por Ziegfeld – O Criador de Estrelas (1936) e Terra dos Deuses (1937). Em uma entrevista em 2010, Jodie Foster voltou a afirmar que O Silêncio dos Inocentes é um de seus favoritos em sua filmografia.

Mesmo adorando ‘O Silêncio dos Inocentes’, e talvez por isso mesmo, Jodie Foster se recusou a voltar ao papel.

Na contramão da popularidade de Jodie Foster, chegava Anthony Hopkins, então aos 54 anos. O vencedor do Oscar de melhor ator este ano por Meu Pai, estava inclusive pensando em desistir da carreira em Hollywood na época e voltar para a Inglaterra para focar no teatro. Apesar de já ter trabalhado em produções americanas, algumas inclusive de renome (como o indicado ao Oscar O Homem Elefante), sua carreira não havia decolado como imaginava. Assim, Hopkins dava sua última cartada para finalmente transcender ao time A de Hollywood com O Silêncio dos Inocentes.

Porém, a estrada para isso não foi tão suave quanto se pensa. Sean Connery era a primeira escolha do diretor Jonathan Demme para o papel de Hannibal Lecter. Já pensou? Fora isso, atores como Robert Duvall, Jack Nicholson, John Hurt, Dustin Hoffman, Robert De Niro e Louis Gossett Jr. foram considerados para o papel. Jeremy Irons foi um dos que recusaram a oferta, já que, segundo o ator, devido ao papel de Claus von Bulow em O Reverso da Fortuna (1990) – que lhe garantiu a vitória no Oscar -, visava dar um tempo de personagens sombrios. Imagina só, Irons poderia ter vencido dois Oscar consecutivos. Melhor para Hopkins que descolava sua primeira indicação ao Oscar, seguida de vitória e dava a volta por cima em sua carreira. Depois viriam mais quatro indicações para o ator até a segunda vitória recente.

Melhor ator e atriz. Anthony Hopkins e Jodie Foster levaram o Oscar pelo filme.

Com vinte e quarto minutos e cinquenta e dois segundos em tela, a participação de Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes é a segunda mais curta da história a vencer o prêmio de ator protagonista no Oscar – ficando atrás somente de David Niven pelo drama romântico Vidas Separadas (1958), que levou o Oscar por sua participação de vinte e três minutos e trinta e nove segundos em cena. Porém, as vitórias de Foster e Hopkins não foram sem esforço.

Apesar de dividirem apenas quatro cenas juntos no filme, Hopkins estudou a fundo os serial killer, visitou prisões, pesquisou sobre assassinos condenados, chegando ao ponto de participar de audiências envolvendo crimes brutais e assassinatos em série. Já Foster passou muito tempo convivendo com a agente do FBI Mary Anne Krause, que lhe deu diversas dicas sobre o trabalho. A agência federal de investigação norte-americana, o FBI, deu completo e total apoio à produção. Entre outras coisas porque viam a oportunidade do filme servir como propaganda para o recrutamento de mais agentes mulheres na força.

O FBI apoiou a produção pensando em investir no recrutamento de novas Clarice Starling.

Com o orçamento de US$19 milhões, O Silêncio dos Inocentes recuperou o seu valor de produção apenas em seu primeiro fim de semana em cartaz. Nos EUA, o filme somou mais de US$130 milhões, e nas bilheterias internacionais rendeu mais de US$272 milhões, estabelecendo assim seu fenômeno. O filme permaneceu como número 1 nas bilheterias americanas por cinco semanas.

Sucesso absoluto. O Silêncio dos Inocentes é um dos filmes mais celebrados da história da sétima arte.

A popularidade do personagem Hannibal Lecter foi tanta que ele foi eleito pelo mesmo AFI o maior vilão do cinema de todos os tempos, o que terminou por gerar para a história uma continuação, Hannibal (2001), uma pré-sequência, Dragão Vermelho (2002), um filme de origem, Hannibal – A Origem do Mal (2007) e uma série de TV, Hannibal (2013-2015). Clarice Starling não ficou atrás, tendo aparecido em Hannibal (2001) – agora nas formas de Julianne Moore (após a recusa de Foster em reprisar o papel) – e ganha seu próprio seriado com Clarice, criado por Alex Kurtzman e Jenny Lumet (dupla de Star Trek Discovery), no qual é vivida pela atriz Rebecca Breeds. A série se passa um ano depois dos eventos de O Silêncio dos Inocentes e já exibiu sete episódios de sua primeira temporada.

Vinte anos após seu lançamento, em 2011, O Silêncio dos Inocentes foi selecionado pela biblioteca do Congresso norte-americano para a preservação no Registro Nacional de Filmes devido a seu significado histórico, cultural e estético. Uma honraria até maior do que o Oscar em si.

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Lançado em circuito pelos EUA no dia 14 de fevereiro de 1991, tendo antes realizado sessões de pré-estreia em Nova York (30 de janeiro) e na Califórnia (1º de fevereiro), e chegando ao Brasil no dia 17 de maio do mesmo ano, O Silêncio dos Inocentes completa 30 anos em 2021. Parte do acervo daquele ano no celebrado Festival de Berlim, o filme, é claro, viveria para se tornar um dos mais queridos de todos os tempos na opinião dos fãs, cinéfilos, críticos e especialistas de forma geral. Além de seu invejável e muito comentado recorde ainda mantido nos prêmios da Academia, vulgo Oscar.

Não é todo dia que um filme de suspense com fortes tintas para o terror se torna fenômeno de popularidade conseguindo inclusive transcender seu próprio gênero. O Silêncio dos Inocentes é daquele tipo que mesmo os não adeptos de filmes mais intensos e explícitos terminam por apreciar. Em voga novamente devido ao recém-lançado programa televisivo Clarice (da rede CBS), O Silêncio dos Inocentes é um longa imperdível, que você pode conferir ou revisitar através da rede Telecine, ou no streaming Telecine Play neste exato momento.

O cartaz clássico de ‘O Silêncio dos Inocentes’.

O tópico que vem sempre à mente quando falamos em O Silêncio dos Inocentes é seu recorde no Oscar. O longa não se destaca somente por ser um dos poucos thrillers que flertam com o terror a serem indicados na categoria de melhor filme no Oscar – o que por si só já seria um grande feito. Mas O Silêncio dos Inocentes levou de fato tal prêmio, além de outros quatro, dos sete aos quais estava indicado. Estes, no entanto, não foram quaisquer cinco Oscar, e sim os principais prêmios da noite, conhecidos como o Big Five (melhor filme, diretor, ator, atriz e roteiro). Tão raro é este feito que na história do Oscar apenas outros dois longas foram capazes de realiza-lo: Aconteceu Naquela Noite (1934) e Um Estranho no Ninho (1975). Sendo que O Silêncio dos Inocentes ainda mantém o recorde como o último filme a levar o Big Five.

O Silêncio dos Inocentes é baseado no romance homônimo do escritor Thomas Harris – responsável por uma série de livros protagonizados pelo personagem Hannibal Lecter. A história apresenta uma recruta novata do FBI em treinamento, a agente Clarice Starling, se deparando com a maior oportunidade de sua curta carreira e também seu desafio mais assustador: manter laços profissionais com um psicopata encarcerado, o Dr. Hannibal ‘O Canibal’ Lecter, a fim de obter insights na caçada a outro maníaco, o travesti Buffalo Bill – que anda sequestrando e assassinando jovens mulheres.

O pôster alternativo do filme, estampado por Hannibal e não Clarice.

A jornada de Clarice é uma verdadeira descida ao inferno, que seria influente para produções como Seven (1995), de David Fincher, por exemplo. Clarice é uma personagem tão rica que além de ter sido votada a sexta na lista dos maiores heróis do cinema no AFI (American Film Institute), sendo a personagem feminina mais bem posicionada, ainda inspirou a criação de outra que se tornaria igualmente icônica: a agente Dana Scully (Gillian Anderson) do seriado Arquivo X (1993-2018), segundo o próprio dono da ideia Chris Carter.

Para esta história, uma das inspirações para a relação entre a agente Clarice Starling e o psicopata Hannibal Lecter foi o relacionamento da vida real entre Robert Keppel, professor de criminologia e pesquisador da Universidade de Washington e serial killer Ted Bundy – que investigaram juntos o caso dos assassinatos de Green River, em Washington, levando à eventual prisão de Gary Ridgway, assassino confesso de quarenta e oito vítimas. Fora isso, assim como Psicose (1960) e O Massacre da Serra Elétrica (1974) antes dele, O Silêncio dos Inocentes também faz uso do modus operandi de outro psicopata da vida real: Ed Gein, notório por seus crimes de necrofilia e utilização de pele humana na confecção de objetos, mobília e máscaras em sua casa.

‘A Bela e a Fera’ – a relação de Hannibal e Claire foi inspirada na vida real.

O Silêncio dos Inocentes, embora poucos saibam, é um dos raros casos em que uma continuação se torna mais famosa e bem sucedida que seu predecessor. Explico. Acontece que o primeiro livro de Harris dentro do ‘Hannibalverse’ a ser adaptado ao cinema foi Caçador de Homens (Manhunter, 1986), de Michael Mann, um fiasco que terminou no ostracismo – hoje ressurgindo como cult. Neste filme, Hannibal é interpretado por Brian Cox. Ou seja, para O Silêncio dos Inocentes uma verdadeira reformulação de equipe, diretor e elenco precisou ocorrer a fim de se desassociar da produção anterior. E não poderia ter dado mais certo. Azar do produtor Dino De Laurentiis, que terminou passando a oportunidade de envolvimento com este filme, justamente pelo fato de que Caçador de Homens, produzido por ele, havia flopado. De Laurentiis seguiu para produzir Hannibal (2001) e Dragão Vermelho (2002) – sequência e pré-sequência de O Silêncio dos Inocentes, sendo este último a refilmagem de Caçador de Homens.

Todos os envolvidos na produção do filme tem o mérito pelo trabalho bem feito, mas como de costume, três se destacam. Estes sendo o diretor Jonatham Demme e os protagonistas Jodie Foster e Anthony Hopkins. Porém, o trio poderia ter ficado de fora da obra. Antes de Demme ser contratado existiu o fator Gene Hackman. O lendário ator eternizado como o primeiro Lex Luthor do cinema, comprou os direitos para a adaptação cinematográfica de O Silêncio dos Inocentes assim que terminou de ler o livro, batendo a atriz Jodie Foster na empreitada, que igualmente havia ficado fascinada com a trama. Hackman planejava fazer do longa sua estreia na direção, depois visando um papel no filme (Hackman cogitou ser Hannibal) e por fim cedendo os direitos para a Orion Pictures por US$500 mil. Gene Hackman nunca viria a dirigir um filme.

Criador e criatura. O diretor Jonathan Demme e Jodie Foster fizeram uma dupla de sucesso.

Com a entrada de Jonathan Demme, a protagonista Clarice quase teve as formas de uma atriz bem famosa, mas não Jodie Foster. Acontece que Demme havia dirigido Michelle Pfeiffer na comédia De Caso com a Máfia (1988) e desenvolvido com ela uma amizade, além de ter sido impressionado pelo talento da estrela. Pfeiffer, então com 33 anos, era uma jovem atriz em ascensão e nome quente da época, somando no currículo duas recentes e consecutivas indicações ao Oscar (coadjuvante por Ligações Perigosas e protagonista por Susie e os Baker Boys) em 1989 e 1990, os anos que precederam O Silêncio dos Inocentes. Justamente devido ao crescente prestígio, Pfeiffer exigia US$2 milhões para viver a agente Starling no cinema. Pré-requisito este não atendido pela produtora Orion Pictures, fazendo Pfeiffer e Starling seguirem caminhos diferentes.

Em cena entrava Jodie Foster, que na época igualmente colecionava duas indicações ao Oscar no currículo, mas com uma grande diferença: havia saído vitoriosa da segunda (por Acusados em 1989) – a primeira foi por Taxi Driver (em 1977). Foster, então com 29 anos, fazia forte lobby pelo papel e era a primeira opção do roteirista Ted Tally, responsável pela adaptação do livro para as telas. Com a saída de Pfeiffer de cena, Demme finalmente ficaria à vontade com a ideia de ter Jodie Foster no papel, a enaltecendo por sua força e determinação para ganhar a personagem. Demme a contratou após apenas um encontro.

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A ‘felina’ Michelle Pfeiffer quase foi Clarice Starling em ‘O Silêncio dos Inocentes’.

Apesar do grande interesse de Jodie Foster pelo papel, a atriz sabia muito bem de seu status na indústria. Assim, mesmo após ter conseguido o trabalho que perseguia com unhas e dentes, a estrela tratou de orquestrar um acordo com a Orion Pictures a garantindo a direção de uma obra para a casa. O escolhido para a venda casada foi Mentes que Brilham, drama lançado no mesmo ano de O Silêncio dos Inocentes que marcou a estreia de Foster na direção e que a traz também como atriz no papel da mãe solteira de um menino gênio.

Mesmo após o acordo com Foster, a Orion Pictures precisava escolher um postulante ao Oscar em seu acervo de lançamentos da época, dentre três com mais potencial: O Silêncio dos Inocentes, Mentes que Brilham e Céu Azul. A escolha foi por evidenciar o primeiro, enquanto o terceiro era engavetado para um lançamento apenas três anos depois, em 1994. Céu Azul terminou levando o Oscar de protagonista para Jessica Lange. Já Foster não teve do que reclamar, já que embora Mentes que Brilham tenha passado longe do Oscar, O Silêncio dos Inocentes terminou garantindo para a atriz a estatueta de protagonista. Aos 29 anos, Jodie Foster se tornava a segunda atriz a ganhar dois Oscar antes dos 30 anos. A primeira havia sido a alemã Luise Rainer, aos 28 anos, por Ziegfeld – O Criador de Estrelas (1936) e Terra dos Deuses (1937). Em uma entrevista em 2010, Jodie Foster voltou a afirmar que O Silêncio dos Inocentes é um de seus favoritos em sua filmografia.

Mesmo adorando ‘O Silêncio dos Inocentes’, e talvez por isso mesmo, Jodie Foster se recusou a voltar ao papel.

Na contramão da popularidade de Jodie Foster, chegava Anthony Hopkins, então aos 54 anos. O vencedor do Oscar de melhor ator este ano por Meu Pai, estava inclusive pensando em desistir da carreira em Hollywood na época e voltar para a Inglaterra para focar no teatro. Apesar de já ter trabalhado em produções americanas, algumas inclusive de renome (como o indicado ao Oscar O Homem Elefante), sua carreira não havia decolado como imaginava. Assim, Hopkins dava sua última cartada para finalmente transcender ao time A de Hollywood com O Silêncio dos Inocentes.

Porém, a estrada para isso não foi tão suave quanto se pensa. Sean Connery era a primeira escolha do diretor Jonathan Demme para o papel de Hannibal Lecter. Já pensou? Fora isso, atores como Robert Duvall, Jack Nicholson, John Hurt, Dustin Hoffman, Robert De Niro e Louis Gossett Jr. foram considerados para o papel. Jeremy Irons foi um dos que recusaram a oferta, já que, segundo o ator, devido ao papel de Claus von Bulow em O Reverso da Fortuna (1990) – que lhe garantiu a vitória no Oscar -, visava dar um tempo de personagens sombrios. Imagina só, Irons poderia ter vencido dois Oscar consecutivos. Melhor para Hopkins que descolava sua primeira indicação ao Oscar, seguida de vitória e dava a volta por cima em sua carreira. Depois viriam mais quatro indicações para o ator até a segunda vitória recente.

Melhor ator e atriz. Anthony Hopkins e Jodie Foster levaram o Oscar pelo filme.

Com vinte e quarto minutos e cinquenta e dois segundos em tela, a participação de Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes é a segunda mais curta da história a vencer o prêmio de ator protagonista no Oscar – ficando atrás somente de David Niven pelo drama romântico Vidas Separadas (1958), que levou o Oscar por sua participação de vinte e três minutos e trinta e nove segundos em cena. Porém, as vitórias de Foster e Hopkins não foram sem esforço.

Apesar de dividirem apenas quatro cenas juntos no filme, Hopkins estudou a fundo os serial killer, visitou prisões, pesquisou sobre assassinos condenados, chegando ao ponto de participar de audiências envolvendo crimes brutais e assassinatos em série. Já Foster passou muito tempo convivendo com a agente do FBI Mary Anne Krause, que lhe deu diversas dicas sobre o trabalho. A agência federal de investigação norte-americana, o FBI, deu completo e total apoio à produção. Entre outras coisas porque viam a oportunidade do filme servir como propaganda para o recrutamento de mais agentes mulheres na força.

O FBI apoiou a produção pensando em investir no recrutamento de novas Clarice Starling.

Com o orçamento de US$19 milhões, O Silêncio dos Inocentes recuperou o seu valor de produção apenas em seu primeiro fim de semana em cartaz. Nos EUA, o filme somou mais de US$130 milhões, e nas bilheterias internacionais rendeu mais de US$272 milhões, estabelecendo assim seu fenômeno. O filme permaneceu como número 1 nas bilheterias americanas por cinco semanas.

Sucesso absoluto. O Silêncio dos Inocentes é um dos filmes mais celebrados da história da sétima arte.

A popularidade do personagem Hannibal Lecter foi tanta que ele foi eleito pelo mesmo AFI o maior vilão do cinema de todos os tempos, o que terminou por gerar para a história uma continuação, Hannibal (2001), uma pré-sequência, Dragão Vermelho (2002), um filme de origem, Hannibal – A Origem do Mal (2007) e uma série de TV, Hannibal (2013-2015). Clarice Starling não ficou atrás, tendo aparecido em Hannibal (2001) – agora nas formas de Julianne Moore (após a recusa de Foster em reprisar o papel) – e ganha seu próprio seriado com Clarice, criado por Alex Kurtzman e Jenny Lumet (dupla de Star Trek Discovery), no qual é vivida pela atriz Rebecca Breeds. A série se passa um ano depois dos eventos de O Silêncio dos Inocentes e já exibiu sete episódios de sua primeira temporada.

Vinte anos após seu lançamento, em 2011, O Silêncio dos Inocentes foi selecionado pela biblioteca do Congresso norte-americano para a preservação no Registro Nacional de Filmes devido a seu significado histórico, cultural e estético. Uma honraria até maior do que o Oscar em si.

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