Na segunda temporada de ‘His Dark Materials’, a série da BBC e da HBO entra em território desconhecido nas adaptações. Os novos episódios cobrem boa parte do segundo livro da saga de Philip Pullman, ‘A Faca Sutil’, e enfrentam um desafio que é ao mesmo tempo mais simples que o da primeira temporada (por já ter o complexo universo da história e os protagonistas já estabelecidos) e mais difícil: adaptar este livro pode ser ainda mais penoso. Um resultado incompreensível está a uma vírgula de distância de um roteiro que cometa o pecado de se encantar demais com o que tem em mãos.
Após Lorde Asriel (James McAvoy) ter aberto um portal entre dois universos nos momentos finais da primeira temporada, Lyra segue a luz e acaba atravessando até Cittàgazze. É uma cidade, aparentemente vazia e abandonada, regida por leis diferentes das que ela conhece e entende. A solitude de Lyra e Pan, tanto um artifício para que ela se reconheça longe das influências quanto uma forma de introduzir aos poucos ideias ainda mais complexas, é logo interrompida quando ela cruza com o caminho de Will Parry e essa se torna uma série com dois protagonistas ao invés de um.
É a partir daí que fica mais claro que existem duas séries dentro de uma: a His Dark Materials de Lyra e Will, seja em Cittàgazze ou em outros lugares que em breve vão aparecer, é um show vivo de energia e gênios fortes que tem consequências e repercussões emocionais o suficiente para que o público se engaje. Dafne Keen é feroz e rápida, sua expressividade um trunfo insubstituível. Amir Wilson, mais recluso e silencioso, exala o gênio forte da raiva de Will em poucas palavras e em uma dinâmica fluida com Keen. O exercício de opostos entre os dois atores e os dois personagens é o que causa simpatia e ao mesmo mantém a narrativa dinâmica.
A outra His Dark Materials, consideravelmente mais desinteressante, é curiosamente aquela que tem a personagem mais complexa da história.
Embora tenha um universo rico e profundo a explorar com a Senhora Coulter, Lee Scoresby, as bruxas e o Magistério, His Dark Materials permanece incapaz de dialogar com o público de forma eloquente sem ser excessivamente didática ou misteriosa e dramática ao ponto de tudo soar exagerado. Tratando-se de um universo fantástico que se ampara tanto em efeitos visuais, é preciso ter cautela na orientação dos atores e na relação entre os personagens, para que exista algo realista que crie empatia com o público.
Ao invés disso, o que Jack Thorne e Jamie Childs fazem é se encantarem com os próprios exageros, e o resultado é uma trama que não consegue captar a audiência porque tudo é distante e raso, não há nuances na construção de como os personagens se comportam ou quais são os seus desejos e as suas ambições.
Dessa forma, o que His Dark Materials pode chegar a ser ainda deve estar guardado, e mesmo com os tropeços é seguro dizer que os protagonistas conseguem manter o ritmo e lutarem contra a correnteza.
His Dark Materials vai ao ar aos domingos, na HBO, a partir de 16 de novembro.