Nos últimos tempos, Hollywood tem se fartado com histórias reais de celebridades geeks, migrando para as telas algumas das desventuras mais icônicas que transformaram tanto o Vale do Silício, bem como o mundo empresarial digital. E entre títulos como o sucesso A Rede Social, o drama quase teatral e indicado ao Oscar, Steve Jobs, e a mais recente minissérie The Dropout, nasce também WeCrashed, nova série biográfica do famigerado casal Rebekah e Adam Neumann, a dupla que fez da startup WeWork uma chacota em meio aos nerds e – principalmente – em Wall Street.
O autointitulado “empreendedor em série” Adam Neumann tinha tudo para genuinamente ser o que tanto almejava: trilionário e visionário. Mas a nova série da Apple TV+, co-criada pelo produtor de The Office, Lee Eisenberg, logo de início nos mostra como sua arrogância e presunção antecederam sua queda. E mesmo que o slogan da WeWork ainda seja “Faça o que Você Ama”, o roteiro da produção mostra para audiência que o clichê “disruptivo” nada mais é que uma frase de efeito adotada por um homem que apenas queria fama e dinheiro e que se esforçou tanto para se tornar uma lenda, que de fato até conseguiu – mas não pelos motivos que desejava.
WeCrashed apresenta ao público como um dos fundadores da startup WeWork – que trouxe um modelo inovador de espaços de coworking – fez de sua emergente empresa uma grande piada no mercado empresarial global, ao inflar sua avaliação financeira, a fim de abrir capital na bolsa de valores. Falando no bom e velho português, Neumann e seu sócio, Miguel McKelvey, tentaram vender gato por lebre ao mentir que sua empresa valia US $47 bilhões, quando mal valia US $10 milhões. Abordando a ascensão e queda do empreendedor sensação de Nova York, a série foca na relação do egocêntrico líder e de sua esposa cheia de sincretismos holísticos, Rebekah – que por sinal ainda é prima da atriz Gwyneth Paltrow.
E um dos aspectos mais cativantes de WeCrashed é justamente sua dupla de protagonistas. Os vencedores do Oscar, Anne Hathaway e Jared Leto, dão vida ao casal com duas atuações excepcionais. Despidos de uma maquiagem mais carregada, ambos concentram suas performances nos maneirismos de Rebekah e Adam, explorando seus sotaques, timbres de voz e linguagem corporal. Aqui, um dos elementos que mais nos atrai é a simplicidade e simultânea profundidade no trabalho entregue à audiência. E sob um roteiro que quebra sua linearidade com lapsos temporais, a série conquista os fãs de cinebiografia, ainda que talvez não cative uma audiência maior.
Mas WeCrashed consegue ser o tipo de série que nos atrai com facilidade. Explorando as peculiaridades de seus protagonistas, Lee Eisenberg e Drew Crevello reforçam alguns estigmas que norteiam o inusitado submundo dos empreendedores nerds da era digital, trazendo algumas caricaturas que vez outra nos remetem à excelente série original da HBO, Silicon Valley. Tentando explicar o inexplicável, a produção da Apple TV+ é uma vitrine para Hathaway e Leto mostrarem sua versatilidade em tela, conforme também supre a curiosidade do mundo ocidental a respeito de como os gênios e as fraudes são formados nessa nova era cheia de presunçosos discursos e do chato hábito de chamar tudo de “disruptivo“. E por sinal, acho que essa palavra já deu, não é?