O mundo segue tendências. E Hollywood, a maior fábrica de sonhos, não é diferente. No cinema, um famoso produtor disse uma vez que existem apenas sete tipos de histórias a serem contadas, o resto são derivações e leves modificações. Pensando estruturalmente pode até ser verdade. O que faz um grande filme, no entanto, são os pequenos diferenciais de excelência que, esses sim, geralmente trazem ares de grande novidade.
O que ocorre muitas vezes também é que realizadores precisam alterar seus temas ou a proposta de seu filme devido ao projeto de algum outro estúdio de assunto muito similar. Como forma de não saturar o público com histórias “iguais” sobre o mesmo tópico, muitas vezes obras cinematográficas se transformam completamente de sua ideia original. Mas não é sempre que produtores exibem esta cordialidade com os concorrentes.
E assim ganhamos os chamados “filmes gêmeos”, longas de grande orçamento, vindos dos maiores estúdios da meca do cinema, com diretores e astros renomados, que por alguma razão decidem contar a mesma história. Ou ao menos se utilizar do mesmo ponto de partida. Tais filmes acabam moldando uma determinada década ou uma geração, e terminam por se tornar tendência do período. Alguns perduram por muitos anos (como o caso dos filmes slasher, popularizados nos anos 1980 – ou o cinema catástrofe dos anos 1970) se tornando inclusive um subgênero próprio. O que chama atenção, porém, é quando estes filmes gêmeos são lançados no mesmo ano, às vezes com um intervalo pequeno entre as estreias.
Pensando nisso, trazemos em nossa nova matéria para você conhecer ou relembrar alguns dos filmes gêmeos mais marcantes dos queridos anos 90, que fizeram muitos de nós coçar a cabeça em confusão sem saber se já havíamos assistido ao determinado filme ou era apenas sua “outra versão”. Veja abaixo.
Os Robin Hood de 1991
Tudo bem que Robin Hood é um dos personagens mais clássicos da dramaturgia, tendo em sua origem relatos sobre uma figura histórica real. No cinema, sua primeira aparição data dos primórdios da sétima arte lá em 1913, quando foi personificado por William Russell. Na era de ouro, no entanto, Douglas Fairbanks e Errol Flynn ficariam marcados como o personagem em produções de 1922 e 1938 respectivamente. O icônico herói voltaria a ganhar atenção na década de 1970, com uma animação da Disney (1973) – onde o protagonista era uma raposa -, e numa versão da Columbia/Sony chamada Robin e Marian (1976), com Sean Connery na pele de um Robin Hood envelhecido, fazendo par com a musa Audrey Hepburn.
Mas foi em 1991, numa época de blockbusters já estabelecidos, que Robin Hood ganharia sua maior produção até então. E não apenas uma, como duas obras de bastante prestígio. Como sempre ocorre com filmes gêmeos, um termina sempre eclipsado pelo outro. E Robin Hood – O Príncipe dos Ladrões, superprodução de US$48 milhões da Warner, protagonizada por um Kevin Costner no topo do mundo após o sucesso do Oscarizado Dança com Lobos (1990) se tornou um dos maiores fenômenos das telonas no início da década. Pior para Robin Hood – O Herói dos Ladrões, que a Fox havia tirado da cartola um mês antes e que, com o bigodudo Patrick Bergin (quem? Isso mesmo) na pele do protagonista e Uma Thurman bem novinha como Marian, desceu rapidamente à obscuridade.
Dois anos depois, e o vetereno humorista Mel Brooks resolveu visitar também o tema em sua sátira A Louca! Louca História de Robin Hood (1993). O personagem voltaria aos holofotes num filme de Ridley Scott (2010) com Russell Crowe e Cate Blanchett, e numa adaptação estilo super-herói intitulada Robin Hood: A Origem (2018), com Taron Egerton e Jamie Foxx.
As Loiras Fatais de 1992
“Sexo vende”. Essa afirmação segue como verdade até mesmo numa época pudica e politicamente correta como a de hoje. E podemos rastrear o auge da popularidade de projetos assim para o fenômeno indicado ao Oscar Atração Fatal (1987), um thriller erótico elevado ao primeiro time, se tornando grande sucesso de público e crítica com seis indicações ao Oscar incluindo melhor filme. Podemos creditar ao filme a fama do que é provavelmente o maior thriller erótico dos anos 1990 – ou talvez da história do cinema – Instinto Selvagem (1992). Não por menos, o longa contou com o mesmo Michael Douglas da obra citada protagonizando e serviu para colocar o nome da musa Sharon Stone no mapa.
De fato, Sharon Stone ficaria marcada em uma série de filmes do tipo, vide Invasão de Privacidade, lançado logo no ano seguinte. Mas o que talvez poucos saibam, ou se lembrem, é que a material girl em pessoa, Madonna, optou por fazer seu próprio thriller erótico na mesma época. Com produção da Dino De Laurentiis Company e distribuição da MGM, Corpo em Evidência foi lançado quase um ano depois, em janeiro de 1993. Nos dois filmes, uma loira fatal, muito articulada, é acusada de cometer crime de assassinato durante o ato sexual, sendo adepta do sexo violento.
Las Vegas, Dinheiro e Traição em 1993
Outro longa com doses de erotismo que marcou o início dos anos 90 foi Proposta Indecente (1993), que carrega consigo a fama de ser também um filme muito romântico. Este, no entanto, não é um suspense, mas sim um drama, que alçou ao status de musa a atriz Demi Moore (uma morena, para variar). O longa é baseado no livro de Jack Engelhard e conta a história de um jovem casal (Moore e Woody Harrelson), que passa por sérios problemas financeiros. Num ato desesperado, viajam para Las Vegas a fim de ganhar dinheiro nos cassinos jogando, mas o que encontram é um milionário (Robert Redford) disposto a oferecer-lhes US$1 milhão por uma noite com a mulher.
Passando completamente abaixo de todos os radares, alguns meses antes, ainda em 1992, era lançado nos cinemas Lua de Mel a Três, dono de uma trama muito similar. Tudo bem, você não lembra. Mas olha o renome da obra: produção da New Line e Castle Rock, com distribuição da Columbia, o longa conta com James Caan, Nicolas Cage e Sarah Jessica Parker protagonizando, e rendeu duas indicações ao Globo de Ouro, melhor filme e ator para Cage (yes!). Veja esta história: Cage quer casar com Parker em Las Vegas, mas termina perdendo todo o dinheiro e se endividando. O ricaço para quem deve (Caan) faz uma proposta para passar o fim de semana com a noiva do sujeito a fim de esquecer a dívida, deixando a moça confusa sobre os dois homens. Familiar, certo?
Os Explosivos de 1994
Se hoje vivemos a era dos super-heróis de quadrinhos no cinema, ao voltarmos para 1994 a tendência era outra: bombas para todos os lados. Nunca os artefatos explosivos complexos viram tamanho auge de popularidade quanto em 1994. Bombas sempre fizeram parte das tramas de filmes de ação, mas o que se popularizou na época foram os explosivos colocados em elementos diários de nossa rotina, como elevadores, computadores ou caixas, onde qualquer movimento brusco seria o suficiente para fazê-las detonar. Dente as produções do estilo a mais famosa foi sem dúvida Velocidade Máxima, filme de ação que elevou as carreiras de Keanu Reeves e Sandra Bullock. Aqui, além do elevador, o desafio principal é uma bomba colocada em um ônibus, no qual o veículo não pode diminuir sua velocidade ou ela explodirá.
No mês seguinte, foi a vez do veterano Jeff Bridges viver um especialista do esquadrão antibombas, em Contagem Regressiva, filme que terminou à sombra de Velocidade Máxima. Na trama, Bridges e Tommy Lee Jones são dois ex-revolucionários irlandeses. Jones foi preso, mas ao conseguir escapar decide se vingar de seu colega, agora vivendo uma vida confortável nos EUA. Aqui temos uma bomba num computador, o qual explodirá se a vítima parar de digitar. No fim do mesmo ano foi a vez do astro Sylvester Stallone em O Especialista. No filme, ele vive um ex-agente, agindo como renegado, contratado por uma mulher (Sharon Stone) para se vingar de uma família de mafiosos. No seu encalço, James Woods é um ex-parceiro, hoje trabalhando com autoridades antibomba. Finalizando o lote, lançado no ano seguinte, até Bruce Willis e seu John McClane entravam na febre das bombas em Duro de Matar: A Vingança, no qual um terrorista (Jeremy Irons) faz chantagem e explode com armadilhas elaboradas metade de Nova York.
Porquinhos encantadores de 1995
Muita gente não tem conhecimento, mas é algo que o grande Jô Soares sempre frisava em seus programas quando falava dos prêmios da Academia: Babe – O Porquinho Atrapalhado (1995) foi indicado ao Oscar de melhor filme! O longa da Universal sobre um porquinho falante com aspirações de ser pastor de ovelhas, e sua amizade com o dono fazendeiro foi um verdadeiro fenômeno na época. Esta coprodução australiana, que tem George Miller (da trilogia Mad Max) como produtor – cuja continuação de 1998 foi dirigida pelo próprio – recebeu 7 nomeações ao Oscar, incluindo melhor filme, e levou a de efeitos especiais.
No entanto, o mundo não é justo. E nem sempre o pioneiro é o que se tornará bem-sucedido ou popular. Mas não pense você que Gordy – O Porquinho Herói é uma produção B do cinema. O filme tem prestígio de sobra por trás, sendo uma obra de ninguém menos que a Disney, ou ao menos de suas subsidiárias Buena Vista e Miramax. A trama é a mesma: Gordy é um porquinho falante que fará de tudo para salvar sua família do matadouro. Apesar disso, Gordy chegou antes, estreando em algumas cidades americanas ainda em 1994, e depois fazendo sua estreia nacional em maio de 1995. Babe chegaria depois em agosto do mesmo ano. Pensa quantos pais que não conseguiram ingresso para Babe, terminaram levando seus filhos para ver Gordy.
As quatro mulheres de 1995
Somos totalmente a favor do empoderamento feminino no cinema e de termos cada vez mais mulheres protagonizando não apenas filmes e séries, mas também superproduções de todos os gêneros. No entanto, por alguma razão os executivos de Hollywood nos anos 90 acharam que quatro seria o número mágico para isso acontecer. Assim, tivemos na década diversas produções de variados gêneros protagonizadas por… você acertou, quatro mulheres de fibra. O primeiro a chegar foi Quatro Mulheres e um Destino, em 1994, no qual Drew Barrymore, Madeleine Stowe, Mary Stuart Masterson e Andie MacDowell viravam as pistoleiras mais bad ass do velho oeste.
No ano seguinte foi a vez das amigas de infância Christina Ricci, Thora Birch, Gabby Hoffmann e Ashleigh Aston Moore provarem sua forte ligação através da vida adulta nas formas de Rosie O’Donnell, Melanie Griffith, Demi Moore e Rita Wilson na comédia dramática Agora e Sempre. No mesmo ano, quatro atrizes negras (a musa Whitney Houston, Angela Bassett, Loretta Devine e Lela Rochon) discutiam sua amizade, frustrações e relacionamentos em Falando de Amor. Finalizando, em 1996, outras quatro talentosas atrizes negras (Jada Pinkett Smith, Queen Latifah, Vivica A. Fox e Kimberly Elise) viviam amigas desesperadas, optando por iniciar uma vida de crimes no cult Até as Últimas Consequências.
Os anjos de 1996
Os anjos também vieram à Terra na década de 1990. Ou ao menos no cinema. Mais especificamente em 1996, dois grandes astros personificaram tais figuras celestiais em missões muito mundanas. E esta batalha angelical foi travada nas bilheterias do mês de dezembro, já que ambos foram lançados no mesmo mês, com diferença de semanas em sua estreia. Quem saiu na frente foi o multi talentoso Denzel Washington com Um Anjo em Minha Vida. Neste remake do clássico Um Anjo Caiu do Céu (1947) – com Cary Grant e David Niven -, Washington vive um anjo vindo dos céus para ajudar um pastor a salvar sua igreja e sua família. Penny Marshall dirige e Whitney Houston (ela de novo, e que falta faz!) interpreta a mulher do pastor. Duas semanas depois, foi a vez de John Travolta dançar, brigar e conquistar as moças como o anjo beberão e incorreto Michael, no homônimo Michael – Anjo e Sedutor, de Nora Ephron. Ah sim, não podemos esquecer que dois anos depois foi a vez de Nicolas Cage em pessoa se apaixonar por Meg Ryan e abdicar de seu posto no paraíso em Cidade dos Anjos, remake do alemão Asas do Desejo (1987).
Os vulcões de 1997
O cinema catástrofe fez um baita sucesso nos anos 1970. E vinte anos depois eram resgatados na década de 1990, após o sucesso de Twister (1996). No ano seguinte foi a vez de dois vulcões entrarem em erupção, em filmes onde a verdadeira estrela eram os efeitos visuais da época, propícios para uma grande aventura onde poderíamos ver na telona de forma muito realística estes milagres da natureza. O primeiro a chegar foi O Inferno de Dante, protagonizado pelos astros da ação Pierce Brosnan (então o novo 007) e Linda Hamilton (a eterna Sarah Connor). Alguns meses depois e quem comandava o show era Tommy Lee Jones e Anne Heche (que pisava no estrelato na época) em Volcano – A Fúria, onde víamos um vulcão entrar em erupção no meio de Los Angeles. Se isso não é cinema catástrofe em toda a sua glória, não sabemos o que é.
Os meteoros da paixão de 1998
Seguindo de perto os vulcões, os executivos de Hollywood trataram de pensar rapidamente numa nova ameaça. Maremotos? Não. Algo mais seco. Geadas Mortais? Calor Carioca? Nada disso parecia apetecer muito os produtores. Até que tiraram da cartola um meteoro em colisão com a Terra. Mas não apenas um, e sim dois. Isso sim é bem dramático. Impacto Profundo (que não é título de filme pornô, acredite) foi o pioneiro. Dirigido por Mimi Leder, e com Robert Duvall, Téa Leoni e Morgan Freeman como o presidente dos EUA, o filme marcou o auge da recém inaugurada Dreamworks no cinema. Mas mostrando que ninguém entende de destruição como ele, Michael Bay arquitetou Armageddon para a Disney/Touchstone Pictures, e trouxe Bruce Willis, Ben Affleck, Liv Tyler e a chiclete I Don’t Wanna Miss a Thing do Aerosmith para o seu fim do mundo.
As casas assombradas de 1999
Chega de catástrofe. Pelo menos no tema, já que o resultado destes filmes gêmeos aqui muito bem se enquadram em tal adjetivo. O ano de 1999 foi, entre outras coisas, o lar das produções milionárias sobre casas mal assombradas. Ambas, não por menos, adaptações de clássicos do gênero. Quem saía na frente era Steven Spielberg e sua Dreamworks, que escalavam Jan de Bont (Twister) para o comando de A Casa Amaldiçoada, adaptação de Desafio do Além (1963) e do livro de Shirley Jackson, com Catherine Zeta-Jones e Liam Neeson. Depois, a Warner tirava do forno A Casa da Colina, remake de O Casa dos Maus Espíritos (1959), com Geoffrey Rush, Famke Janssen e Ali Larter.