terça-feira , 5 novembro , 2024

Vikings: Valhalla | O que é fato e o que é ficção sobre a nova série da Netflix

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Vikings: Valhalla chegou recentemente ao catálogo da Netflix e já se tornou uma das novas sensações da plataforma de streaming. Ambientada cem anos depois da série original, a narrativa acompanha a saga de Leif Erikson (Sam Corlett), Freydís Eiríksdóttir (Frida Gustavsson) e Harald Sigurdsson (Leo Suter), um grupo de guerreiros nórdicos que enfrenta o extermínio sistemático de seus clãs frente ao avanço da Inglaterra como potência ideológica e política mundial – premeditando o declínio da linhagem viking no continente europeu.

É claro que os vikings realmente existiram e, até hoje, são objetos de estudo por parte dos historiadores e de realizadores que resolvam se envolver com as histórias de outrora e como essa complexa sociedade dominou um território considerável durante alguns séculos. Entretanto, isso não significa que o criador da série, Jeb Stuart, não tenha utilizado alguns artifícios criativos para fornecer um pouco mais de misticismo e fábula a personagens que, de fato, habitaram a Europa – porém, não do jeito que imaginamos.

Como já mencionado na crítica que escrevi sobre o spin-offValhalla não tem a mínima intenção em fornecer qualquer estudo sólido e verdadeiro para o público, e sim expandir a mitologia iniciada com a produção original em uma exaltação dos dramas de época e de como a mentalidade da humanidade funcionava àquela época. Enquanto os acertos se restrigem essencialmente ao retrato dos cenários e aos figurinos, boa parte do enredo parte de criações fantasiosas cujo único objetivo é manter os espectadores ansiosos para as revelações em cada capítulo e como os arcos dos protagonistas e coadjuvantes irão colidir.

A obra se inicia com Harald deixando a Inglaterra ao lado do irmão, Olaf (Jóhannes Haukur Jóhannesson), em uma missão para reconquistar o trono norueguês do Rei dinamarquês Canute (Bradley Freegard). Todavia, na mesma noite, o Rei inglês Æthelred, o Despreparado, organiza um massacre contra os dinamarqueses que viviam em solo britânico, que ficou conhecido como o Massacre do Dia de São Brice de 1002, um acontecimento histórico que ganhou uma roupagem diferente, sugerindo que Æthelred queria, na verdade, limpar suas terras de qualquer um que fugisse à etnicidade inglesa. Em resposta ao massacre em questão, Canute une as forças da Noruega e da Dinamarca para invadir a Inglaterra, deixando de lado as diferenças entre as tribos para um bem maior

Mas não foi isso o que aconteceu exatamente.

A verdade é que Sweyn Forkbeard, pai de Canute, foi o responsável por retaliar a armada inglesa em 1003 como resposta ao extermínio de Æthelred. Canute só viria a assumir o trono após a morte de Sweyn, e 1014 – e, mais do que isso, Harald, que tem um papel importante em Valhalla, não havia nem nascido quando os combates ocorreram (isso aconteceria apenas em 1015). Olaf, inclusive, ascende ao domínio dos povos vikings antes de morrer, ser canonizado e só então abrir espaço para que Harald também faça história.

Como se não bastasse, temos também a introdução de um grupo de groenlandeses, liderado por Leif e Freydís, que aporta em Kattegat, uma das principais cidades vikings da Noruega, e ajuda Canute e Harald a lutar contra a opressão inglesa. Não obstante as boas intenções dos roteiristas em trazer um pouco mais de unificação aos guerreiros nórdicos, a Groenlândia se configurava como um território remoto em relação aos padrões vikings e não teve papel significativo nas engrenagens políticas da época; Leif e Freydís realmente existiram, assim como outros personagens já citados, mas foram parar na costa litorânea da América do Norte, como apontam as sagas literárias.

Uma outra mudança drástica que foi feita na série se volta à caracterização de Jarl Haakon, pintada como rainha de Kattegat e interpretada por Caroline Henderson. Nos episódios, Jarl Haakon revela sua história e comenta que o pai se apaixonou por uma guerreira africana e, pouco depois, viajaram para a Noruega, onde ela ascendeu ao trono e se tornou uma das combatentes mais temidas e poderosas do século XI. Mas a personagem, na verdade, é baseada em Haakon Ericsson, Lorde de Lade e governador noruguês entre os anos 1012 e 1015 (ou seja, antes mesmo de Harald nascer, como já mencionado), lutando lado a lado com Forkbeard.

Até mesmo o episódio que retrata sobre a queda da Ponte de Londres não pode ser adotada como totalmente verdadeira. Afinal, Stuart comentou em diversas entrevistas que se baseou em canções da época sobre os feitos vikings e adotou uma intitulada “Heimskringla”, uma coleção de sagas do século XII do historiados islandês Snorri Sturluson, que “cria a ideia de que a música fala sobre Olaf”, como ele mesmo disse. “Mas, francamente, às vezes a falta de evidência é ótimo para mim”, o criador completa, reiterando as pulsões fantasiosas da série.

Comentar sobre as imprecisões históricas de Vikings: Valhalla é um trabalho extenso e seria tema de um artigo científico, ainda mais juntando-as com os “erros” da série original. Entretanto, sabemos que, em se tratando de uma série ficcional, esses equívocos não são nada menos que expressões criativas de um time de artistas que criou uma aventura envolvente e que nos trouxesse um pouco de entretenimento para tempos tão complicados como o que vivemos.

De qualquer forma, é possível que a próxima temporada, caso confirmada pela Netflix, aposte fichas em um pouco mais de verossimilhança, em vez de se basear apenas em fábulas incríveis de verdadeiros heróis e antagonistas – impulsionando, por exemplo, a viagem de Leif e Freydís à América do Norte e a jornada de Harald à Constantinopla e à Sícilia (dois de seus maiores feitos).

Lembrando que a iteração de estreia já está disponível na plataforma de streaming.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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É claro que os vikings realmente existiram e, até hoje, são objetos de estudo por parte dos historiadores e de realizadores que resolvam se envolver com as histórias de outrora e como essa complexa sociedade dominou um território considerável durante alguns séculos. Entretanto, isso não significa que o criador da série, Jeb Stuart, não tenha utilizado alguns artifícios criativos para fornecer um pouco mais de misticismo e fábula a personagens que, de fato, habitaram a Europa – porém, não do jeito que imaginamos.

Como já mencionado na crítica que escrevi sobre o spin-offValhalla não tem a mínima intenção em fornecer qualquer estudo sólido e verdadeiro para o público, e sim expandir a mitologia iniciada com a produção original em uma exaltação dos dramas de época e de como a mentalidade da humanidade funcionava àquela época. Enquanto os acertos se restrigem essencialmente ao retrato dos cenários e aos figurinos, boa parte do enredo parte de criações fantasiosas cujo único objetivo é manter os espectadores ansiosos para as revelações em cada capítulo e como os arcos dos protagonistas e coadjuvantes irão colidir.

A obra se inicia com Harald deixando a Inglaterra ao lado do irmão, Olaf (Jóhannes Haukur Jóhannesson), em uma missão para reconquistar o trono norueguês do Rei dinamarquês Canute (Bradley Freegard). Todavia, na mesma noite, o Rei inglês Æthelred, o Despreparado, organiza um massacre contra os dinamarqueses que viviam em solo britânico, que ficou conhecido como o Massacre do Dia de São Brice de 1002, um acontecimento histórico que ganhou uma roupagem diferente, sugerindo que Æthelred queria, na verdade, limpar suas terras de qualquer um que fugisse à etnicidade inglesa. Em resposta ao massacre em questão, Canute une as forças da Noruega e da Dinamarca para invadir a Inglaterra, deixando de lado as diferenças entre as tribos para um bem maior

Mas não foi isso o que aconteceu exatamente.

A verdade é que Sweyn Forkbeard, pai de Canute, foi o responsável por retaliar a armada inglesa em 1003 como resposta ao extermínio de Æthelred. Canute só viria a assumir o trono após a morte de Sweyn, e 1014 – e, mais do que isso, Harald, que tem um papel importante em Valhalla, não havia nem nascido quando os combates ocorreram (isso aconteceria apenas em 1015). Olaf, inclusive, ascende ao domínio dos povos vikings antes de morrer, ser canonizado e só então abrir espaço para que Harald também faça história.

Como se não bastasse, temos também a introdução de um grupo de groenlandeses, liderado por Leif e Freydís, que aporta em Kattegat, uma das principais cidades vikings da Noruega, e ajuda Canute e Harald a lutar contra a opressão inglesa. Não obstante as boas intenções dos roteiristas em trazer um pouco mais de unificação aos guerreiros nórdicos, a Groenlândia se configurava como um território remoto em relação aos padrões vikings e não teve papel significativo nas engrenagens políticas da época; Leif e Freydís realmente existiram, assim como outros personagens já citados, mas foram parar na costa litorânea da América do Norte, como apontam as sagas literárias.

Uma outra mudança drástica que foi feita na série se volta à caracterização de Jarl Haakon, pintada como rainha de Kattegat e interpretada por Caroline Henderson. Nos episódios, Jarl Haakon revela sua história e comenta que o pai se apaixonou por uma guerreira africana e, pouco depois, viajaram para a Noruega, onde ela ascendeu ao trono e se tornou uma das combatentes mais temidas e poderosas do século XI. Mas a personagem, na verdade, é baseada em Haakon Ericsson, Lorde de Lade e governador noruguês entre os anos 1012 e 1015 (ou seja, antes mesmo de Harald nascer, como já mencionado), lutando lado a lado com Forkbeard.

Até mesmo o episódio que retrata sobre a queda da Ponte de Londres não pode ser adotada como totalmente verdadeira. Afinal, Stuart comentou em diversas entrevistas que se baseou em canções da época sobre os feitos vikings e adotou uma intitulada “Heimskringla”, uma coleção de sagas do século XII do historiados islandês Snorri Sturluson, que “cria a ideia de que a música fala sobre Olaf”, como ele mesmo disse. “Mas, francamente, às vezes a falta de evidência é ótimo para mim”, o criador completa, reiterando as pulsões fantasiosas da série.

Comentar sobre as imprecisões históricas de Vikings: Valhalla é um trabalho extenso e seria tema de um artigo científico, ainda mais juntando-as com os “erros” da série original. Entretanto, sabemos que, em se tratando de uma série ficcional, esses equívocos não são nada menos que expressões criativas de um time de artistas que criou uma aventura envolvente e que nos trouxesse um pouco de entretenimento para tempos tão complicados como o que vivemos.

De qualquer forma, é possível que a próxima temporada, caso confirmada pela Netflix, aposte fichas em um pouco mais de verossimilhança, em vez de se basear apenas em fábulas incríveis de verdadeiros heróis e antagonistas – impulsionando, por exemplo, a viagem de Leif e Freydís à América do Norte e a jornada de Harald à Constantinopla e à Sícilia (dois de seus maiores feitos).

Lembrando que a iteração de estreia já está disponível na plataforma de streaming.

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