sexta-feira, abril 26, 2024

Crítica | 6ª temporada de ‘Black Mirror’ é uma das mais FRACAS e decepcionantes da antologia!

‘Black Mirror’ estreou há mais de uma década e, em pouco tempo, tornou-se uma das maiores antologias da contemporaneidade – além de se consagrar como uma das responsáveis por revitalizar o formato na televisão e no streaming. E, doze anos depois, é notável como a pungente qualidade da produção decaiu consideravelmente, mergulhando em análises superficiais da realidade e esquecendo-se dos elementos pelos quais nos apaixonamos, como o niilismo social, o pessimismo tecnológico e até mesmo a submissão inconsciente. É só nos recordamos da frustrante temporada anterior e do episódio especial intitulado “Bandersnatch”, que falharam em entregar o que prometiam e já revelavam um cansaço tristonho para a produção.

Agora, estamos de volta com um promissor sexto ano que, além de contar com um elenco de peso, tinha tudo para se transformar em uma das melhores entradas de 2023 e do show em si. Infelizmente, o resultado não foi como o esperado, visto que o criador Charlie Booker, que também fica responsável pelos roteiros dos novos episódios, se engolfou em uma melancolia excessiva para construir reflexões óbvias demais – com algumas, inclusive, abandonando por completo a identidade que vimos nas iterações predecessoras. Com exceção de algumas escolhas certeiras, os cinco capítulos originais são óbvios demais para fornecer algo novo e apostam em malabarismos técnicos para mascarar cansativas fórmulas.

O ciclo começa de modo muito sólido: “A Joan É Péssima” constrói uma tragédia metalinguística multi-nivelada que, no papel, poderia dar muito errado – mas que compreende os próprios limites estruturais para delinear um enredo bem explicado e com uma reviravolta encantadora. Aqui, Annie Murphy interpreta Joan, gerente de uma grande empresa multinacional que vê sua vida virar de cabeça para baixo quando descobre que a plataforma Streamberry (uma piada envolvendo a própria Netflix) produziu uma série baseada em seu dia a dia – recontando, inclusive, segredos que compartilha com sua terapeuta e que guarda do conhecimento do noivo, Krish (Avi Nash). Na dramatização, Joan é encarnada por Salma Hayek Pinault (que também interpreta ela mesma no capítulo) e, tentando burlar o sistema em si, faz de tudo para retornar à normalidade.

O episódio soa como um clássico tirado das temporadas iniciais de ‘Black Mirror’, apostando fichas na espetacularização da vida como entretenimento e nas críticas filosóficas a reality shows – ainda que Joan se veja em uma série de ficcionalizada. E, com sua vida exposta a todos que tenham acesso ao Streamberry, ela se transforma em uma pessoa pública que enfrenta os perigos das inteligências artificiais, do cerceamento do livre-arbítrio e até mesmo dos acordos insanos que, de fato, ninguém lê. E, como se não bastasse, Murphy e Hayek desfrutam de uma química apaixonante e de poderosas atuações que são fortes o suficiente para mascarar os pontuais deslizes.

Todavia, esse comprometimento com a simplicidade não permanece nos capítulos seguintes: “Loch Henry” volta-se para os surtos dos programas true crime que sempre estão no topo dos mais assistidos das plataformas virtuais, novamente mergulhando de cabeça nas incursões metadiegéticas e desperdiçando um potencial magnífico – ainda que o plot twist seja, em partes, gratificante para o espectador. “Beyond the Sea” migra para a vastidão do espaço, em que dois astronautas têm a oportunidade de pular da realidade inóspita do cosmos para a família que deixaram na Terra, encarnados em réplicas robóticas perfeitas. Aqui, Aaron Paul, Josh Hartnett e Kate Mara dão de tudo de si em uma chocante epopeia sci-fi que discorre sobre confiança, solidão, insanidade e vingança – e Paul, especificamente, reitera seu status como um dos grandes atores da atualidade, tendo grandes chances de ser indicado ao Emmy. O problema é que, desde os primeiros minutos, qualquer um que deseje unir as engrenagens pode prever o final.

Vale dizer que a direção de todos os capítulos é digna de atenção – e é notável o movimento promovido pelo time de realizadores em criar uma identidade única para cada um deles à medida que contribuem para a expansão de um dos universos mais icônicos da Netflix. Porém, conforme a equipe criativa investe em peso nesse quesito, o roteiro é deixado de lado: “Mazey Day”, que fala sobre privacidade, fama e a ação coercitiva dos paparazzi, é, sem sombra de dúvida, uma das piores iterações da memória recente – em que terror e fantasia são enfiados em um cansativo arco dramático que não diz nada com nada; “Demônio 79” é uma adição bem-vinda, mas, ao abrir portas para o sobrenatural, enjeita qualquer aspecto que ressoe com a série (mesmo com a ótima performance de Anjana Vasan).

Não deixe de assistir:

‘Black Mirror’ retorna anos depois de sua última inflexão com uma leva de episódios medíocre, por assim dizer. Apesar dos pontos altos existirem, como já explicado nos parágrafos acima, o resultado é muito aquém do esperado e nos leva a pensar se já é hora de reformular a série – ou até mesmo encerrá-la.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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