domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Death Note – adaptação de desenho japonês acerta no tom

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Que venha o mimimi!

Talvez eu realmente tenha visto um filme diferente da maioria em relação a Death Note, novo lançamento original Netflix. O filme estreou na plataforma na última sexta-feira, e como de costume a garotada fã de plantão correu para conferir, muitos inclusive acordaram cedo para tanto. Bem, pelo que tenho visto nas redes sociais e no apanhado da imprensa especializada no Rotten Tomatoes e afins, a produção não tem agradado muito.

Não sei se seria cabível a justificativa de que eu não esperava ou dava nada pela obra e por isso acabou me agradando, porque creio que muitos detratores também não são aficionados pelo material original. Não vi, não conhecia e não irei me embrenhar em tal universo logo em seguida. Portanto, meu conhecimento sobre este universo era igual a zero. Com obras baseadas em produções pré-existentes, são dois os caminhos a seguir. Ser conhecedor do material no qual o novo se baseia pode ser uma benção ou uma maldição. Foi o que ocorreu comigo na revisão de Sofia Coppola para O Estranho que Nós Amamos, por exemplo. Por mais que eu tentasse, não consegui me manter indiferente de bases comparativas com o original, e a versão de Coppola saiu perdendo nessa para mim.



O outro modo é você saber muito pouco ou quase nada do material fonte. E mesmo assim o resultado pode seguir caminhos opostos para você. Veja o caso de A Vigilante do Amanhã – Ghost in the Shell, lançado no início deste ano, e protagonizado por Scarlett Johansson. O desenho japonês, baseado previamente em um manga (ou quadrinhos japoneses), assim como este Death Note, tem uma grande legião de fãs. Entendo a sua importância, mas nada disso melhorou o resultado do longa dirigido por Rupert Sanders aos meus olhos, e no de muita gente, já que o filme dividiu opiniões. Já com Death Note, a alienação inicial era a mesma, no entanto, o saldo final foi bem mais positivo.

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Primeiro ponto positivo: Adam Wingard é um diretor muito talentoso. A maioria dos pós-adolescentes ranhentos provavelmente não conhecem a carreira do diretor, e deveriam procurar seus filmes anteriores, em especial Você é o Próximo (2013) e O Hóspede (2014) – vamos esquecer, para o bem do meu argumento, que ele foi o responsável pelo novo Bruxa de Blair (2016).  O sujeito também estará no comando de Godzilla vs. Kong, a ser lançado em 2020. Chama atenção a visceralidade com que Wingard cria esta história “para jovens”, não poupando na violência de suas mortes (cabeças não param de explodir – algo que chocou plateias há algumas décadas com Scanners, hoje parece sequer causar qualquer efeito em uma geração anestesiada).

A violência gratuita e sem contexto não funciona, vide os torture porn, mas Death Note está longe, bem longe de ser apenas grafismo e masoquismo. As principais reclamações dos fanboys são quanto à fidelidade. Mais uma vez, isso se perde para quem não é familiarizado e apenas ouvimos o quanto o original é melhor. Será mesmo? De qualquer forma, esta tradução ocidental funciona o suficiente para passar sua mensagem moralista, mas não sem antes ter caminhado num terreno extremamente perigoso e sombrio por quase duas horas de exibição. Fora isso, o desfecho é corajoso e dúbio, fazendo valer o que havia sido dito pelos envolvidos previamente, que a obra não seria domesticada. De fato não foi.

Na trama, acompanhamos o típico adolescente da geração geek atual. Tenho ouvido muito o termo “jovem bobão” sendo usado para definir o protagonista. O curioso é que antes, em filmes como Superbad – É Hoje (2007) e até mesmo Scott Pilgrim Contra o Mundo (2010), este tipo de personagem era usado para criar identificação e representar parte do público, fã deste tipo de material, que de fato sentia seus anseios, frustrações e aspirações reproduzidos em tela, criando assim grande conexão. De fato, não existe diferença entre Light Turner (Nat Wolff) e qualquer protagonista de filme adolescente, remetendo lá aos anos 1980 e aos filmes de John Hughes, afinal o sujeito comum é o tipo de personagem com que todos se identificam – que quando crescem vão protagonizar algum filme de Woody Allen. Ao que parece, os jovens queriam o personagem mais sombrio, com tendências psicopatas como no original – o que torna tudo mais surreal ainda em minha opinião, já que estamos falando de uma mudança brusca de personalidade.

Desmistificando mais um item criticado, a adição de um romance na trama, trazido pela figura de Mia (Margaret Qualley). Primeiramente, romance, amor, são bons elementos. Todos que tem ou tiveram namoradas entenderão. Os que tiverem um dia também. Adolescentes querem participar de uma relação. Gostar de alguém e ser retribuído. Adultos também. Isso não é tão difícil de entender. Sim, aqui temos adicionado um relacionamento. Que bom. Seu desenvolvimento é ok. Não é ruim como o de Crepúsculo, e se faz entender. Partimos deste ponto, garoto conhece garota. É o princípio da estrutura de roteiro mais utilizada em filmes de amor. E se acha tão surreal um adolescente enamorado contar seu maior segredo para a pessoa por quem nutre sentimentos a fim de aprovação, bem, talvez tenha esquecido como era esta fase. Outros embora não desejem admitir, fariam o mesmo por menos.

Bom, voltando para a história, Light Turner, um jovem como eu e você, encontra o infame Death Note, o caderno da morte. Uma espécie de diário com inúmeras regras, que basicamente mata a pessoa cujo nome for escrito nele. Imagine um achado destes nas mãos de um adolescente. É claro que tudo tem o seu preço, e junto com o caderno, se faz presente a figura do demônio comedor de maçãs e brincalhão Ryuk (voz e captura de movimento facial de Willem Dafoe). Após o medo inicial garantido por uma figura monstruosa, e dos primeiros nomes escritos no caderno – todos vinganças pessoais – Light revela seu segredo para a paixão platônica Mia. Sim, é como o super-herói que decide revelar sua identidade para a pessoa amada. Falta de discernimento? Mais uma vez, bem vindo à adolescência.

Mia na realidade não é uma personagem descartável. Ela é o lado negro de Light. Tudo que o rapaz não consegue materializar. Toda a negatividade contida nele, mas que ele invariavelmente opta por regenerar. É a amargura deixada de lado pela maturidade. E este é um interessante arco dramático do protagonista. O que o roteiro faz aqui é pegar o protagonista do original e dividir em duas pessoas, criando uma história de amor com ela mesma. Tudo de pior contido da personalidade de Light é transferido, desde o início se formos parar para perceber, para Mia. O interessante é que o desfecho não suaviza isso. Mia segue seus princípios, terminando numa verdadeira tragédia digna de Shakespeare, vide Romeo e Julieta, os amantes que se matam.

Fora isso, existe toda a questão moral. O que faríamos se tivéssemos em nosso domínio o mecanismo extremo de punição para criminosos. Usaríamos? Obviamente, a coisa não é aprofundada em suas questões como num filme de arte, ou sequer um filme adulto. Mas ei, temos que lembrar que esta é uma produção voltada ao público adolescente, e este é o máximo de ênfase que poderia ser dado a tais questões, sem esquecer que outros elementos precisam entrar em jogo aqui. A direção de Wingard é precisa e cria muitos bons momentos, alguns até assustadores.

As atuações são propositalmente caricatas, já que o objetivo era adereçar na forma de homenagem o exagero geralmente contido em produções asiáticas do tipo, daquelas que os personagens dão seus urros e falam gritando como cantoria. Uma prova é o recente Creepy (2016), cujo assustador vilão em muitos momentos lembra um cartoon. É exatamente o que vemos com o personagem L (Lakeith Stanfield), o detetive mascarado, pura representação de um personagem asiático exagerado. Os protagonistas estão bem. Enquanto Nat Wolff faz o seu melhor para criar o sujeito comum, não pendendo para um lado nem para o outro do espectro, simplesmente caminhando no meio, Margaret Qualley exala carisma e sensualidade. Quem duvida, a procure na obra-prima Dois Caras Legais (2016), para entender um pouco mais o nível de talento que corre nas veias da moça.

Finalizando, Death Note é uma agradável surpresa. Um bom filme adolescente com mais conteúdo do que o esperado. Com um soco mais forte do que o imaginado. E com intrigantes questões ideológicas e morais.

Antes de atacarem esta crítica, lembrem-se que eu também tenho um caderno da morte e posso escrever o nome de vocês!

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Talvez eu realmente tenha visto um filme diferente da maioria em relação a Death Note, novo lançamento original Netflix. O filme estreou na plataforma na última sexta-feira, e como de costume a garotada fã de plantão correu para conferir, muitos inclusive acordaram cedo para tanto. Bem, pelo que tenho visto nas redes sociais e no apanhado da imprensa especializada no Rotten Tomatoes e afins, a produção não tem agradado muito.

Não sei se seria cabível a justificativa de que eu não esperava ou dava nada pela obra e por isso acabou me agradando, porque creio que muitos detratores também não são aficionados pelo material original. Não vi, não conhecia e não irei me embrenhar em tal universo logo em seguida. Portanto, meu conhecimento sobre este universo era igual a zero. Com obras baseadas em produções pré-existentes, são dois os caminhos a seguir. Ser conhecedor do material no qual o novo se baseia pode ser uma benção ou uma maldição. Foi o que ocorreu comigo na revisão de Sofia Coppola para O Estranho que Nós Amamos, por exemplo. Por mais que eu tentasse, não consegui me manter indiferente de bases comparativas com o original, e a versão de Coppola saiu perdendo nessa para mim.

O outro modo é você saber muito pouco ou quase nada do material fonte. E mesmo assim o resultado pode seguir caminhos opostos para você. Veja o caso de A Vigilante do Amanhã – Ghost in the Shell, lançado no início deste ano, e protagonizado por Scarlett Johansson. O desenho japonês, baseado previamente em um manga (ou quadrinhos japoneses), assim como este Death Note, tem uma grande legião de fãs. Entendo a sua importância, mas nada disso melhorou o resultado do longa dirigido por Rupert Sanders aos meus olhos, e no de muita gente, já que o filme dividiu opiniões. Já com Death Note, a alienação inicial era a mesma, no entanto, o saldo final foi bem mais positivo.

Primeiro ponto positivo: Adam Wingard é um diretor muito talentoso. A maioria dos pós-adolescentes ranhentos provavelmente não conhecem a carreira do diretor, e deveriam procurar seus filmes anteriores, em especial Você é o Próximo (2013) e O Hóspede (2014) – vamos esquecer, para o bem do meu argumento, que ele foi o responsável pelo novo Bruxa de Blair (2016).  O sujeito também estará no comando de Godzilla vs. Kong, a ser lançado em 2020. Chama atenção a visceralidade com que Wingard cria esta história “para jovens”, não poupando na violência de suas mortes (cabeças não param de explodir – algo que chocou plateias há algumas décadas com Scanners, hoje parece sequer causar qualquer efeito em uma geração anestesiada).

A violência gratuita e sem contexto não funciona, vide os torture porn, mas Death Note está longe, bem longe de ser apenas grafismo e masoquismo. As principais reclamações dos fanboys são quanto à fidelidade. Mais uma vez, isso se perde para quem não é familiarizado e apenas ouvimos o quanto o original é melhor. Será mesmo? De qualquer forma, esta tradução ocidental funciona o suficiente para passar sua mensagem moralista, mas não sem antes ter caminhado num terreno extremamente perigoso e sombrio por quase duas horas de exibição. Fora isso, o desfecho é corajoso e dúbio, fazendo valer o que havia sido dito pelos envolvidos previamente, que a obra não seria domesticada. De fato não foi.

Na trama, acompanhamos o típico adolescente da geração geek atual. Tenho ouvido muito o termo “jovem bobão” sendo usado para definir o protagonista. O curioso é que antes, em filmes como Superbad – É Hoje (2007) e até mesmo Scott Pilgrim Contra o Mundo (2010), este tipo de personagem era usado para criar identificação e representar parte do público, fã deste tipo de material, que de fato sentia seus anseios, frustrações e aspirações reproduzidos em tela, criando assim grande conexão. De fato, não existe diferença entre Light Turner (Nat Wolff) e qualquer protagonista de filme adolescente, remetendo lá aos anos 1980 e aos filmes de John Hughes, afinal o sujeito comum é o tipo de personagem com que todos se identificam – que quando crescem vão protagonizar algum filme de Woody Allen. Ao que parece, os jovens queriam o personagem mais sombrio, com tendências psicopatas como no original – o que torna tudo mais surreal ainda em minha opinião, já que estamos falando de uma mudança brusca de personalidade.

Desmistificando mais um item criticado, a adição de um romance na trama, trazido pela figura de Mia (Margaret Qualley). Primeiramente, romance, amor, são bons elementos. Todos que tem ou tiveram namoradas entenderão. Os que tiverem um dia também. Adolescentes querem participar de uma relação. Gostar de alguém e ser retribuído. Adultos também. Isso não é tão difícil de entender. Sim, aqui temos adicionado um relacionamento. Que bom. Seu desenvolvimento é ok. Não é ruim como o de Crepúsculo, e se faz entender. Partimos deste ponto, garoto conhece garota. É o princípio da estrutura de roteiro mais utilizada em filmes de amor. E se acha tão surreal um adolescente enamorado contar seu maior segredo para a pessoa por quem nutre sentimentos a fim de aprovação, bem, talvez tenha esquecido como era esta fase. Outros embora não desejem admitir, fariam o mesmo por menos.

Bom, voltando para a história, Light Turner, um jovem como eu e você, encontra o infame Death Note, o caderno da morte. Uma espécie de diário com inúmeras regras, que basicamente mata a pessoa cujo nome for escrito nele. Imagine um achado destes nas mãos de um adolescente. É claro que tudo tem o seu preço, e junto com o caderno, se faz presente a figura do demônio comedor de maçãs e brincalhão Ryuk (voz e captura de movimento facial de Willem Dafoe). Após o medo inicial garantido por uma figura monstruosa, e dos primeiros nomes escritos no caderno – todos vinganças pessoais – Light revela seu segredo para a paixão platônica Mia. Sim, é como o super-herói que decide revelar sua identidade para a pessoa amada. Falta de discernimento? Mais uma vez, bem vindo à adolescência.

Mia na realidade não é uma personagem descartável. Ela é o lado negro de Light. Tudo que o rapaz não consegue materializar. Toda a negatividade contida nele, mas que ele invariavelmente opta por regenerar. É a amargura deixada de lado pela maturidade. E este é um interessante arco dramático do protagonista. O que o roteiro faz aqui é pegar o protagonista do original e dividir em duas pessoas, criando uma história de amor com ela mesma. Tudo de pior contido da personalidade de Light é transferido, desde o início se formos parar para perceber, para Mia. O interessante é que o desfecho não suaviza isso. Mia segue seus princípios, terminando numa verdadeira tragédia digna de Shakespeare, vide Romeo e Julieta, os amantes que se matam.

Fora isso, existe toda a questão moral. O que faríamos se tivéssemos em nosso domínio o mecanismo extremo de punição para criminosos. Usaríamos? Obviamente, a coisa não é aprofundada em suas questões como num filme de arte, ou sequer um filme adulto. Mas ei, temos que lembrar que esta é uma produção voltada ao público adolescente, e este é o máximo de ênfase que poderia ser dado a tais questões, sem esquecer que outros elementos precisam entrar em jogo aqui. A direção de Wingard é precisa e cria muitos bons momentos, alguns até assustadores.

As atuações são propositalmente caricatas, já que o objetivo era adereçar na forma de homenagem o exagero geralmente contido em produções asiáticas do tipo, daquelas que os personagens dão seus urros e falam gritando como cantoria. Uma prova é o recente Creepy (2016), cujo assustador vilão em muitos momentos lembra um cartoon. É exatamente o que vemos com o personagem L (Lakeith Stanfield), o detetive mascarado, pura representação de um personagem asiático exagerado. Os protagonistas estão bem. Enquanto Nat Wolff faz o seu melhor para criar o sujeito comum, não pendendo para um lado nem para o outro do espectro, simplesmente caminhando no meio, Margaret Qualley exala carisma e sensualidade. Quem duvida, a procure na obra-prima Dois Caras Legais (2016), para entender um pouco mais o nível de talento que corre nas veias da moça.

Finalizando, Death Note é uma agradável surpresa. Um bom filme adolescente com mais conteúdo do que o esperado. Com um soco mais forte do que o imaginado. E com intrigantes questões ideológicas e morais.

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