sábado, abril 27, 2024

Crítica | Entre Mulheres – Rooney Mara, Claire Foy e Frances McDormand brilham em drama indicado ao Oscar

Sob uma fotografia envelhecida, um grupo de mulheres discute o seu futuro em uma realidade retrógrada. Trajadas em tons escuros e sempre em círculo, elas encaram umas às outras dentro de um galpão, um celeiro que guarda seus traumas e dores mais profundos já vividos. Baseado no livro homônimo de Miriam Toews, lançado em 2018, Entre Mulheres (Women Talking) é direta e objetivamente o que seu título em inglês diz: mulheres conversando sobre suas lutas e dilemas, à medida em que decidem se devem ou não permanecer em uma pequena e perigosa comunidade religiosa que as oprime e abusa.

O longa de Sarah Polley é atípico e foge do formato padrão de três atos. Linear e sem um genuíno clímax, a produção é um convite profundo e delicado à uma reflexão poderosa sobre a vida e as escolhas de mulheres que por tanto tempo foram caladas. Entre abusos sexuais e agressões físicas, as personagens vividas por Claire Foy, Rooney Mara, Jessie Buckley e Judith Ivey são o espelho de milhares de rostos e vozes apagados pelas circunstâncias e esquecidos pelo tempo. E embora essa premissa bastante sombria e soturna determine o tom do roteiro do começo ao fim, Women Talking consegue quebrar essa atmosfera pesada, graças à sensibilidade de Polley em conduzir a narrativa.

Mantendo sempre um espírito esperançoso e otimista, em meio a diálogos dolorosos de se ouvir, a cineasta assume a direção e o roteiro com perspicácia e sutileza, se esquivando de uma perspectiva mais depressiva – que poderia até mesmo beirar a exaustão. E ainda assim, a mensagem confrontadora de Entre Mulheres continua ali. Mas no meio de toda a pesada nuvem que cerca nossas protagonistas, há também a doçura da feminilidade, a ingenuidade de que os abusos cessarão e a inocência de garotinhas que estão crescendo sob o estigma do machismo de seus pais e vizinhos. E diante da inescrupulosa bigorna da realidade, todos – audiência e personagens – somos confrontados com o fatídico destino que as aguarda, enquanto se digladiam entre permanecer na comunidade (e em seus abusos) ou fugir em direção ao desconhecido.

E conforme as ouvimos – degustando de cada pensamento revelado e de cada experiência compartilhada – vamos entendendo o quão singular o drama de Polley de fato é. Transcendendo a questão de ser ou não um mero entretenimento, Entre Mulheres é uma experiência única que raramente o cinema nos proporciona. Transformando palavras em sentimentos que escapam da tela e invadem nossa alma e coração, o filme é um poema sobre dor, lamento e, por fim, resolução. Como uma ode à libertação e todos os seus contratempos que surgem nesse processo de se ver livre, a produção é também uma vitrine para que Mara, Foy e Ivey transformem suas próprias experiências como mulheres em performances cruas, honestas e arrebatadoras. E aqui, elas entregam seu próprio espetáculo, em atuações ora intensas e catárticas, ora acuadas e internalizadas.

E Frances McDormand, como uma matriarca das antigas que permanece como uma observadora ao longo dessa catarse, é o silêncio inquisitor. Percorrendo nossas protagonistas sempre com olhos que condenam, ela é também fruto de seus próprios traumas – uma mulher presa em um passado que não lhe permite fugir em direção ao presente. Efêmera em diálogos, mas gigante em sua caracterização, ela é a prova de que não existem papéis pequenos em Hollywood, mas sim atores medíocres. E dentro desse contexto, somos absortos por uma paleta em tons mais frios e “envelhecidos”, que trazem a sensação de uma fotografia antiga, cuja coloração está se desfazendo.

E essas mesmas cores são mais um elemento crucial que torna o filme uma experiência muito mais completa do que se imagina. Como uma metáfora a um tempo do passado que ficou para trás, que não pertence ao presente e que gradativamente está sendo desfeito, a fotografia da obra de Polley se comunica como um personagem vivo. Seu tom levemente “apagado” e as cores sóbrias que estampam todo o design de produção destacam um campo sem vida, uma comunidade rural descolorida e sem brilho. Nessa estética, Entre Mulheres se revela em última análise como um filme que mais do que uma desconstrução, é de fato uma construção da dignidade de um grupo de mulheres que, após anos em silêncio, finalmente decidiram falar. E não pararam mais.

O Filme foi indicado a Oscar de Melhor Filme e Roteiro Adaptado.

Não deixe de assistir:

Filme assistido durante o Festival de Toronto.

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