Filme assistido durante o Festival de Toronto 2022
Entre idas e vindas de pessoas tão distintas, um antigo cinema chamado Empire é palco de memórias das mais diversas. Sua estrutura, que traz consigo os sinais do tempo, ainda exala uma certa exuberância e opulência bem art déco, com carpetes que tomam o chão e corrimões dourados que nos remetem à ascensão do cinema como uma experiência contemplativa. Império da Luz é um drama delicado sobre o fascínio de Sam Mendes pela indústria que se tornou a história da sua vida. Com fragmentos inspirados em sua própria juventude, ele reúne personagens que vivem os dilemas, agruras e alegrias todas dentro de um mesmo ambiente, fazendo desse palco de sonhos e aventuras o verdadeiro protagonista de sua trama.
Pela perspectiva de Hillary (Olivia Colman), vemos os dias nascerem e se findarem em uma pequena e fria região praiana da Inglaterra. Embora ela seja a personagem condutora da trama, Império da Luz é mais sobre a magia do cinema e como isso – de um jeito ou de outro – se conecta à sua instável e solitária vida. Tendo dedicado os seus melhores anos como funcionária da bomboniere do cinema Empire, ela gastou seu tempo testemunhando as experiências dos outros nas telonas, mas nunca vivendo as suas. Sempre cruzando com clientes diversos, ela viveu como uma espectadora da sua própria existência. Constantemente à deriva, debaixo de uma apática solidão, ela navega entre a sanidade à beira de um ataque de nervos e a instabilidade emocional.
E embora acompanhemos Hillary em meio à suas oscilações e um rápido romance com um jovem funcionário preto recém contratado, chamado Stephen (Michael Ward), o que descobrimos no drama do vencedor do Oscar é que não importa tamanha a euforia ou depressão testemunhada pela personagem – a plenitude nunca estará naquilo que ela pode tocar. Fazendo uma metáfora sobre a beleza e a simplicidade da vida, Império da Luz é a imperfeita tentativa de Sam Mendes de nos entregar uma simbólica homenagem ao cinema, o tornando o verdadeiro protagonista de todos os pequenos arcos que se desabrocham ao longo de suas quase duras horas de filme. No entanto, com um roteiro linear às vezes mal executado e pouco fluido, ficamos confusos quanto a quem de fato pertence o protagonismo da trama
Com um ritmo lento que pode desagradar os mais impacientes, o drama corre o risco de em certos momentos se tornar uma experiência mundana sobre o que é o amor pelo cinema. Embora tente seguir uma veia criativa semelhante a de Steven Spielberg em sua impecável cinebiografia The Fabelmans, Mendes fica no meio do caminho e entrega apenas metade do que poderia nos ter dado. Ainda assim, sua habilidosa direção e perspicácia em conduzir o excelente elenco são capazes de sobrepor todos os defeitos do filme. E com Olivia Colman se entregando em tela com uma delicadeza e fragilidade de encher os olhos e digna de uma indicação ao Oscar, Império da Luz consegue provar o seu valor, ainda que não se torne memorável como deveria ser.
Delicado em sua essência e incompleto em sua concepção final, O drama de Sam Mendes – que nos entregou o belíssimo filme de guerra 1917 -, é como um álbum de memórias avulsas do diretor. Trazendo alguns recortes históricos como o auge do movimento skinhead, as tensões raciais presentes na Inglaterra oitentista e o desenvolvimento das redes de cinema na década em questão, Império da Luz talvez funcione melhor na mente do diretor e no papel. De todo modo, o novo longa da Searchlight Pictures não é uma oportunidade perdida, mas também não é o emocionante banquete que poderia ser. Ainda que seus 5 minutos finais sejam definitivamente de aquecer o coração.