domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Jogo Perigoso – Depois de ‘It’, mais um ótimo King em 2017

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Louca Obsessão encontra 127 Horas

Definitivamente 2017 foi o ano de Stephen King. O autor nunca esteve tão em voga, revigorado para um novo público quanto agora. Na minha infância, no início da década de 1990, eu e meus amigos víamos o autor como um verdadeiro mestre do que mais gostávamos: o terror. Naquela época, não tínhamos o maior dos discernimentos, é verdade, e tratávamos todos os filmes que levavam o nome do autor como verdadeiras obras-primas.

A minha geração não tinha do que reclamar no quesito, pois uma verdadeira enxurrada de Stephen King transbordava no mercado de VHS, fazendo nossas idas às locadoras (um dia explicamos para você o que era isso) ter sabor especial. Foi assim que descobri filmes como It – Uma Obra-Prima do Medo (sim, a versão em português trazia este subtítulo nada humilde) – que só muito tempo depois descobri não se tratar de um filme, mas uma minissérie – Sonâmbulos (1992), A Metade Negra (1993), Tommyknockers (1993) e A Dança da Morte (1994) – os dois últimos igualmente minisséries. Nada dos bons como Louca Obsessão (1990), no entanto, o que queríamos era o bom e velho terror: criaturas, alienígenas, palhaços, apocalipse e por aí.



Justamente por isso, por este clima nostálgico, que é muito bom perceber essa nova geração descobrindo Stephen King, assim como a minha fez há algumas décadas, interpretando o autor como dono de textos confeccionados justamente para eles. E se a minha geração morreu de medo com o It original (que se revisitado hoje, bem, melhor deixar pra lá), a geração atual pode celebrar o sucesso absurdo que o novo faz – muito superior, diga-se.

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Bem, e tudo isso para chegarmos até Jogo Perigoso, nova adaptação de um livro de King, que só demonstra o poder do autor. Tudo bem que nem todas as produções do ano que levam o nome do escritor foram ouro (cof cof A Torre Negra cof cof O Nevoeiro cof cof), mas o recém readquirido status do mestre é tanto, que ele ressurge quase como uma Marvel, transformando até textos mais obscuros em filmes comentadíssimos. Parte deste mérito deve ir para a Netflix, que tem acolhido as produções de King e em breve lançará também 1922 – a ansiedade é grande.

Em Gerald´s Game, no título original (ou o Jogo de Gerald), um casal decide apimentar sua relação, que anda meio desgastada. Para isso, resolvem passar um final de semana romântico e recheado de luxúria numa casa na floresta, afastada de tudo e todos. O fetiche do dia é algemar a esposa Jessie (papel de Carla Gugino). A fantasia de Gerald (Bruce Greenwood, roubando a cena em Kingsman: O Círculo Dourado, em cartaz nos cinemas), o marido, não termina bem e logo Jessie se vê sozinha, algemada na cama e precisando sair desta situação ingrata – ou passará dias sem comer, beber água, e morrerá.

Desta premissa que surge o elemento 127 Horas (2010), no qual temos apenas um personagem na maior parte da projeção, precisando utilizar todos os recursos que seu cérebro tem a oferecer para se safar da morte certa. Dentre as técnicas narrativas utilizadas pelo cineasta Mike Flanagan (O Espelho e Hush: A Morte Ouve), um dos mais proeminentes dentro do gênero hoje, para contar esta história estão flashbacks (com a protagonista voltando ao passado e relembrando uma ferida ainda não fechada em relação ao pai– momento bem polêmico na trama) e alucinações, nas quais Jessie fala com a imagem do marido, dela mesma, e de sua versão mirim (destaque para a ótima Chiara Aurelia).

As referências são muitas aqui também, mostrando que o autor (ou os diretores que o retratam) gostou muito de brincar com sua própria mitologia. Em Jogo Perigoso temos uma mulher presa à cama contra sua vontade (Louca Obsessão) e um cachorro faminto (Cujo). Além disso, no terceiro ato, o longa assume as tintas de um filme de terror, adicionando elementos típicos das mais assustadoras histórias de King, como psicopatas, assombrações e tudo o que diz respeito aos nossos piores pesadelos – só de lembrar já causa arrepios.

Jogo Perigoso é King adaptado da maneira certa. Misterioso, inteligente e dono de um formato que entrega o suficiente para que montemos todo o resto por conta própria. Discute tópicos atualíssimos como abuso infantil, pedofilia, abuso doméstico e traumas de infância. As atuações são outro destaque do longa, com a subestimada Carla Gugino segurando quase o filme todo nas costas. Os coadjuvantes Greenwood e Henry Thomas (o menino Elliott de ET – O Extraterrestre), que vive o pai da protagonista, dão mais do que o respaldo necessário, em papeis igualmente difíceis.

Este é um título que chega abaixo do radar, mas que deve ser descoberto pelos apreciadores não apenas de terror e suspense, mas de drama e de bons filmes. É King saindo de sua zona de conforto e oferecendo temas urgentes. E que venham mais obras com a assinatura do escritor este e nos próximos anos. Vida longa ao “Rei”.

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Definitivamente 2017 foi o ano de Stephen King. O autor nunca esteve tão em voga, revigorado para um novo público quanto agora. Na minha infância, no início da década de 1990, eu e meus amigos víamos o autor como um verdadeiro mestre do que mais gostávamos: o terror. Naquela época, não tínhamos o maior dos discernimentos, é verdade, e tratávamos todos os filmes que levavam o nome do autor como verdadeiras obras-primas.

A minha geração não tinha do que reclamar no quesito, pois uma verdadeira enxurrada de Stephen King transbordava no mercado de VHS, fazendo nossas idas às locadoras (um dia explicamos para você o que era isso) ter sabor especial. Foi assim que descobri filmes como It – Uma Obra-Prima do Medo (sim, a versão em português trazia este subtítulo nada humilde) – que só muito tempo depois descobri não se tratar de um filme, mas uma minissérie – Sonâmbulos (1992), A Metade Negra (1993), Tommyknockers (1993) e A Dança da Morte (1994) – os dois últimos igualmente minisséries. Nada dos bons como Louca Obsessão (1990), no entanto, o que queríamos era o bom e velho terror: criaturas, alienígenas, palhaços, apocalipse e por aí.

Justamente por isso, por este clima nostálgico, que é muito bom perceber essa nova geração descobrindo Stephen King, assim como a minha fez há algumas décadas, interpretando o autor como dono de textos confeccionados justamente para eles. E se a minha geração morreu de medo com o It original (que se revisitado hoje, bem, melhor deixar pra lá), a geração atual pode celebrar o sucesso absurdo que o novo faz – muito superior, diga-se.

Bem, e tudo isso para chegarmos até Jogo Perigoso, nova adaptação de um livro de King, que só demonstra o poder do autor. Tudo bem que nem todas as produções do ano que levam o nome do escritor foram ouro (cof cof A Torre Negra cof cof O Nevoeiro cof cof), mas o recém readquirido status do mestre é tanto, que ele ressurge quase como uma Marvel, transformando até textos mais obscuros em filmes comentadíssimos. Parte deste mérito deve ir para a Netflix, que tem acolhido as produções de King e em breve lançará também 1922 – a ansiedade é grande.

Em Gerald´s Game, no título original (ou o Jogo de Gerald), um casal decide apimentar sua relação, que anda meio desgastada. Para isso, resolvem passar um final de semana romântico e recheado de luxúria numa casa na floresta, afastada de tudo e todos. O fetiche do dia é algemar a esposa Jessie (papel de Carla Gugino). A fantasia de Gerald (Bruce Greenwood, roubando a cena em Kingsman: O Círculo Dourado, em cartaz nos cinemas), o marido, não termina bem e logo Jessie se vê sozinha, algemada na cama e precisando sair desta situação ingrata – ou passará dias sem comer, beber água, e morrerá.

Desta premissa que surge o elemento 127 Horas (2010), no qual temos apenas um personagem na maior parte da projeção, precisando utilizar todos os recursos que seu cérebro tem a oferecer para se safar da morte certa. Dentre as técnicas narrativas utilizadas pelo cineasta Mike Flanagan (O Espelho e Hush: A Morte Ouve), um dos mais proeminentes dentro do gênero hoje, para contar esta história estão flashbacks (com a protagonista voltando ao passado e relembrando uma ferida ainda não fechada em relação ao pai– momento bem polêmico na trama) e alucinações, nas quais Jessie fala com a imagem do marido, dela mesma, e de sua versão mirim (destaque para a ótima Chiara Aurelia).

As referências são muitas aqui também, mostrando que o autor (ou os diretores que o retratam) gostou muito de brincar com sua própria mitologia. Em Jogo Perigoso temos uma mulher presa à cama contra sua vontade (Louca Obsessão) e um cachorro faminto (Cujo). Além disso, no terceiro ato, o longa assume as tintas de um filme de terror, adicionando elementos típicos das mais assustadoras histórias de King, como psicopatas, assombrações e tudo o que diz respeito aos nossos piores pesadelos – só de lembrar já causa arrepios.

Jogo Perigoso é King adaptado da maneira certa. Misterioso, inteligente e dono de um formato que entrega o suficiente para que montemos todo o resto por conta própria. Discute tópicos atualíssimos como abuso infantil, pedofilia, abuso doméstico e traumas de infância. As atuações são outro destaque do longa, com a subestimada Carla Gugino segurando quase o filme todo nas costas. Os coadjuvantes Greenwood e Henry Thomas (o menino Elliott de ET – O Extraterrestre), que vive o pai da protagonista, dão mais do que o respaldo necessário, em papeis igualmente difíceis.

Este é um título que chega abaixo do radar, mas que deve ser descoberto pelos apreciadores não apenas de terror e suspense, mas de drama e de bons filmes. É King saindo de sua zona de conforto e oferecendo temas urgentes. E que venham mais obras com a assinatura do escritor este e nos próximos anos. Vida longa ao “Rei”.

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