terça-feira , 5 novembro , 2024

Crítica | ‘Lemonade’ se consagra como a magnum opus de Beyoncé

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Publicado originalmente em 09 de maio de 2019.

Beyoncé Knowles-Carter tornou-se bastante conhecida no final da década de 1990 ao integrar o grupo conhecido como Destiny’s Child. Desde então, a cantora norte-americana construiu uma carreira marcada por diversos sucessos, consagrando-se como uma das maiores artistas da indústria musical de todos os tempos. Entretanto, não seria até 2016 que Beyoncé entregaria a seus fãs e ao público de todo o mundo o melhor álbum de sua carreira: Lemonade, cuja construção, desde sua pré-produção até a chegada nos serviços de streamings, louva a cultura negra e o empoderamento feminino de forma impecavelmente envolvente e numa fusão de diversos gêneros musicais que o transformou em um lançamento necessário e memorável para os anos que virão.

A priori, é ímpar tem em mente que o disco é inteiramente visual; ainda que as poderosas letras, delineadas com maestria pela cantora em colaboração com nomes importantes da esfera fonográfica (incluindo The Weeknd, Kendrick Lamar e James Blake), perpassem por dias de luta e dias de glória e resgatem sua belíssima e aplaudível herança, os videoclipes não funcionam como produções à parte, e sim com extensão de algo inovador e renovador ao mesmo tempo. Afinal, é justamente aqui que Beyoncé abre portas para canções declarativas ao R&B, ao soul, ao jazz e ao folk, gêneros historicamente datados da cultura afrodescendente que encontrou uma expressão única ao serem marginalizados na sociedade estadunidense, bom, desde sempre.

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A estética visual, por exemplo, fala muito alto quando nos restringimos aos vídeos de “Hold Up” e “Formation”. O primeiro, de forma deliciosamente contemporânea, traz a lead singer encarnando Oxum, deusa da água iorubá do amor, da sensualidade e da fertilidade – ora, não é nenhuma surpresa que a artista declare no refrão “eles não te amam como eu te amo”, partindo de um escopo bastante pessoal para uma universalidade incrível que já se provou próprio de sua identidade musical. A canção, por sua vez, traz batidas próprias de um delicioso reggae, além de fazer claras referências de bandas que a influenciaram para construir o CD em si – como Soulja Boys. Talvez aqui, Knowles-Carter abra espaço para explorar timbres vocais sem qualquer peso artificial, fluidamente escorrendo em uma sutileza categórica e emocionante.

“Formation”, buscando elementos de um vanguardista R&B, borbulha com referências imagéticas e sonoras que ganham vida e nos levam através de uma história apagada pelo egocentrismo branco. É aqui que a cantora abraça de vez sua herança provinda de “meu pai, [do] Alabama; minha mãe, [de] Louisiana”, além de cutucar com sarcasmos deliciosos as múltiplas teorias da conspiração que insurgiram nos últimos anos para renegar a importância que trouxe para a valorização da cultura afro-americana. Em outras palavras, a track em questão alcança níveis de perfeição que sarcasticamente grita “eu tenho orgulho de ser quem eu sou”.

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De qualquer forma, essas não são as únicas composições a roubarem nossa atenção – muito pelo contrário: fica bastante claro os esforços de Beyoncé em transformar cada uma das produções pelas quais fica responsável em um discurso de “mais amor e menos ódio”, sem perder a força de seus solilóquios. Ora, não é à toa que ela traga samples de todas as pessoas que já lhe inspiraram na vida, incluindo a própria avó, Agnéz Deréon, e a avó de seu marido Jay-Z, Hattie White (bem como nomes como Malcolm X e Frank Ocean, este último com quem já trabalhou diversas vezes). A primeira faixa, “Pray You Catch Me”, é uma balada desconstruída que reflete as dores de um eu lírico marcado por dores, mais uma vez, passando do particular para o universal.

Passando por arranjos ainda mais cínicos com “Sorry” e por obscurantismos muito bem-vindos com a joia “6 Inch”, Knowles-Carter alcança mais um ápice em seu álbum com “Daddy Lessons”, que é diferente de tudo o que já ouvimos até hoje. Com a música em questão, a lead singer eleva as expectativas de sua própria sonoridade, iniciando com os primórdios do jazz apenas para cultivar um terreno propício à insurgência de um country texano que louva, como preconiza o título, as lições que seu pai lhe ensinou: “ele me disse para não chorar; meu pai disse ‘atire’”, repetindo o refrão inúmeras vezes como forma de encontrar as forças necessárias para seguir em frente; tudo isso incluso em um escopo paradoxalmente nostálgico e modernizado.

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Enquanto “Love Drought” e “Sandcastles” unem-se em uma narrativa com início, meio e fim – focando principalmente em mentiras e na consequente reconciliação -, “Freedom” volta com uma atmosfera quase gospel, marcada por um coro enérgico que vai ao encontro da instrumentalização própria do hip-hop, incluindo as batidas demarcadas de uma jovem banda colegial, ramificando suas mensagens de louvor para as gerações atuais. Lamar, que instantaneamente é reconhecido conforme entra na transição entre o segundo e o terceiro atos logo antes do último refrão, acrescenta ainda mais dinamismo à track.

Lemonade é nada menos que necessário. Uma nova e ocultada perspectiva de uma história que se repete há séculos e que, mais que nunca, reflete a importância do “conhecer a si mesmo”. Como já reafirma a premissa principal dessa obra-prima, se a vida lhe dá limões, faça uma limonada; e, bom, foi exatamente isso o que Beyoncé resolveu fazer.

Nota por faixa:

1. Pray You Catch Me – 4,5/5
2. Hold Up – 5/5
3. Don’t Hurt (feat. Jack White) – 4,5/5
4. Sorry – 5/5
5. 6 Inch (feat. The Weekend) – 5/5
6. Daddy Lessons – 5/5
7. Love Drought – 4/5
8. Sandcastles – 5/5
9. Forward (feat. James Blake) – 4,5/5
10. Freedom (feat. Kendrick Lamar) – 5/5
11. All Night – 4,5/5
12. Formation – 5/5
13. Sorry – Original Demo – 5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A priori, é ímpar tem em mente que o disco é inteiramente visual; ainda que as poderosas letras, delineadas com maestria pela cantora em colaboração com nomes importantes da esfera fonográfica (incluindo The Weeknd, Kendrick Lamar e James Blake), perpassem por dias de luta e dias de glória e resgatem sua belíssima e aplaudível herança, os videoclipes não funcionam como produções à parte, e sim com extensão de algo inovador e renovador ao mesmo tempo. Afinal, é justamente aqui que Beyoncé abre portas para canções declarativas ao R&B, ao soul, ao jazz e ao folk, gêneros historicamente datados da cultura afrodescendente que encontrou uma expressão única ao serem marginalizados na sociedade estadunidense, bom, desde sempre.

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A estética visual, por exemplo, fala muito alto quando nos restringimos aos vídeos de “Hold Up” e “Formation”. O primeiro, de forma deliciosamente contemporânea, traz a lead singer encarnando Oxum, deusa da água iorubá do amor, da sensualidade e da fertilidade – ora, não é nenhuma surpresa que a artista declare no refrão “eles não te amam como eu te amo”, partindo de um escopo bastante pessoal para uma universalidade incrível que já se provou próprio de sua identidade musical. A canção, por sua vez, traz batidas próprias de um delicioso reggae, além de fazer claras referências de bandas que a influenciaram para construir o CD em si – como Soulja Boys. Talvez aqui, Knowles-Carter abra espaço para explorar timbres vocais sem qualquer peso artificial, fluidamente escorrendo em uma sutileza categórica e emocionante.

“Formation”, buscando elementos de um vanguardista R&B, borbulha com referências imagéticas e sonoras que ganham vida e nos levam através de uma história apagada pelo egocentrismo branco. É aqui que a cantora abraça de vez sua herança provinda de “meu pai, [do] Alabama; minha mãe, [de] Louisiana”, além de cutucar com sarcasmos deliciosos as múltiplas teorias da conspiração que insurgiram nos últimos anos para renegar a importância que trouxe para a valorização da cultura afro-americana. Em outras palavras, a track em questão alcança níveis de perfeição que sarcasticamente grita “eu tenho orgulho de ser quem eu sou”.

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De qualquer forma, essas não são as únicas composições a roubarem nossa atenção – muito pelo contrário: fica bastante claro os esforços de Beyoncé em transformar cada uma das produções pelas quais fica responsável em um discurso de “mais amor e menos ódio”, sem perder a força de seus solilóquios. Ora, não é à toa que ela traga samples de todas as pessoas que já lhe inspiraram na vida, incluindo a própria avó, Agnéz Deréon, e a avó de seu marido Jay-Z, Hattie White (bem como nomes como Malcolm X e Frank Ocean, este último com quem já trabalhou diversas vezes). A primeira faixa, “Pray You Catch Me”, é uma balada desconstruída que reflete as dores de um eu lírico marcado por dores, mais uma vez, passando do particular para o universal.

Passando por arranjos ainda mais cínicos com “Sorry” e por obscurantismos muito bem-vindos com a joia “6 Inch”, Knowles-Carter alcança mais um ápice em seu álbum com “Daddy Lessons”, que é diferente de tudo o que já ouvimos até hoje. Com a música em questão, a lead singer eleva as expectativas de sua própria sonoridade, iniciando com os primórdios do jazz apenas para cultivar um terreno propício à insurgência de um country texano que louva, como preconiza o título, as lições que seu pai lhe ensinou: “ele me disse para não chorar; meu pai disse ‘atire’”, repetindo o refrão inúmeras vezes como forma de encontrar as forças necessárias para seguir em frente; tudo isso incluso em um escopo paradoxalmente nostálgico e modernizado.

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Enquanto “Love Drought” e “Sandcastles” unem-se em uma narrativa com início, meio e fim – focando principalmente em mentiras e na consequente reconciliação -, “Freedom” volta com uma atmosfera quase gospel, marcada por um coro enérgico que vai ao encontro da instrumentalização própria do hip-hop, incluindo as batidas demarcadas de uma jovem banda colegial, ramificando suas mensagens de louvor para as gerações atuais. Lamar, que instantaneamente é reconhecido conforme entra na transição entre o segundo e o terceiro atos logo antes do último refrão, acrescenta ainda mais dinamismo à track.

Lemonade é nada menos que necessário. Uma nova e ocultada perspectiva de uma história que se repete há séculos e que, mais que nunca, reflete a importância do “conhecer a si mesmo”. Como já reafirma a premissa principal dessa obra-prima, se a vida lhe dá limões, faça uma limonada; e, bom, foi exatamente isso o que Beyoncé resolveu fazer.

Nota por faixa:

1. Pray You Catch Me – 4,5/5
2. Hold Up – 5/5
3. Don’t Hurt (feat. Jack White) – 4,5/5
4. Sorry – 5/5
5. 6 Inch (feat. The Weekend) – 5/5
6. Daddy Lessons – 5/5
7. Love Drought – 4/5
8. Sandcastles – 5/5
9. Forward (feat. James Blake) – 4,5/5
10. Freedom (feat. Kendrick Lamar) – 5/5
11. All Night – 4,5/5
12. Formation – 5/5
13. Sorry – Original Demo – 5/5

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