quarta-feira, abril 24, 2024

Crítica | Novo ‘O Massacre da Serra Elétrica’ transforma a mitologia de Leatherface em uma atrocidade difícil de engolir

O gênero slasher é um dos mais populares do cinema e começou a dominar o cenário do entretenimento a partir da década de 1970, em que produtores e realizadores construíram personagens que ficaram marcados na cultura mundial – sendo um deles Leatherface, antagonista da icônica franquia ‘O Massacre da Serra Elétrica’. Lançado quatro anos antes de ‘Halloween’, de John Carpenter e no mesmo ano que o clássico ‘Black Christmas’, de Bob Clark, o longa-metragem conquistou a atenção do público por se basear em uma história real (que depois viríamos a descobrir que não era tão real assim) de um serial killer mascarado e sem escrúpulos que coletava vítimas utilizando uma serra elétrica, como bem aponta o título.

A princípio, a obra foi recebida com críticas mistas, mas logo alcançou um status lendário em meio aos especialistas da área, por sua instigante e sangrenta narrativa e por seu teor bastante controverso, que rendeu outros sete títulos – o mais recente funcionando como prequela. Agora, a Netflix, continuando com seu império na indústria dos streamings, resolveu reunir forças com o diretor David Blue Garcia (‘Tejano’) e com Chris Thomas Devlin, Fede Álvarez e Rodo Sayagues a encargo do roteiro para reapresentar o vilão à nova geração – e aqueles que podem nem ter chegado perto das iterações predecessoras. Apesar do material promocional e de nossos melhores desejos, ‘O Massacre da Serra Elétrica: O Retorno de Leatherface’ falha miseravelmente em todos os seus aspectos e consegue destruir o personagem titular em uma atrocidade fílmica inacabável.

A trama funciona como sequência direta do longa de 1974 e, é claro, é ambientada décadas depois dos eventos originais. Mais uma vez, acompanhamos um grupo de jovens sem sorte que cruza caminho com Leatherface: viajando à pequena cidade de Harlow, no interior do Texas, Melody (Sarah Yarkin), uma empreendedora, se junta com a irmã (Elsie Fisher) e seus amigos para visitar a vizinhança que, de alguma maneira que nunca é explicada, se tornou propriedade de um negócio com potencial lucrativo gigantesco. Ao chegarem lá, eles se veem num dilema ao perceber uma das propriedades adquiridas ainda é habitada pela debilitada Sra. Mc (Alice Krige) e por um de seus “filhos” (um dos garotos do orfanato de que tomava conta). A velha senhora, eventualmente, é acometida de um problema de saúde que tira sua vida, levando esse filho, que já imaginamos quem é, sair em uma matança descontrolada para uma provável vingança que também parece não sair do papel.

A verdade é que, quando pensamos em filmes slasher, fugir do óbvio é um pouco difícil – então, o que se deve fazer, é utilizar as fórmulas de modo a preencher uma necessidade intrínseca em se chocar e se envolver com o produto. Vimos isso, por exemplo, na quinta entrada da franquia ‘Pânico’, que se “livrou”, por assim dizer, dos personagens-legado e reapresentou Ghostface à geração dos streamings e do cotidiano virtual, sem perder mão da identidade dos anos 1990. Aqui, por mais que as ideias sejam interessantes, não há um consenso entre as mentes criativas em fazer algo acontecer, deixando o enredo estagnado em uma bolha perdida no tempo e que não tem nada de interessante a nos oferecer. Os personagens passam longe de ter um arco decente o bastante para nos causar alguma emoção; Leatherface demonstra um cansaço repetitivo em não ousar com ataques-surpresa; e Sally Hardesty, a única sobrevivente da obra original, ganha uma roupagem na pele de Olwen Fouéré do modo mais ridículo possível.

Para ser justo, há uma única sequência realmente boa, em que a descartável personagem de Jessica Allain, Ruth, tenta escapar de um acidente de carro e é surpreendida pelo assassino num jogo de câmera interessante – mas que perde força ao ser reencenada em uma insistência exaurível. A fotografia é insossa e não se esquiva da paleta de cores do desértico sul dos Estados Unidos, movida pela trivialidade do amarelo e do laranja apenas para dar espaço à terrosa sobriedade da noite chuvosa; de fato, o diretor tenta fornecer um pouco de arte quando opta pela simetria dos enquadramentos, mas aparenta ter nenhum domínio de montagem – porque as quebras de ritmo são imperdoáveis. O roteiro, então, resolve seguir um padrão similar: sem pé, nem cabeça, e manchado por frases de efeito vencidas, ele começa e termina dentro de uma previsibilidade escancarada.

Em entrevista ao ComicBook.com, Garcia comentou que não se restringiu a criar uma história mais amena para a saga e investiu esforços inimagináveis para arquitetar uma narrativa pesada, ampliando as cenas de morte e regando cada quadro com o máximo de sangue que pôde. Ao menos ele conseguiu cumprir com esse aspecto da iteração e encheu os olhos do público com mortes cruéis e viscerais – que, caindo na própria armadilha, ficam risíveis pela atuação pífia de um elenco desperdiçado. Se há algo que se concretiza, entretanto, é a impassividade monotônica do personagem titular (não que isso aumente seu mistério, mas ao menos se ata à mitologia apresentada anos atrás).

Não deixe de assistir:

Se você esperava uma redenção para tantas sequências e derivados de ‘O Massacre da Serra Elétrica’, ‘O Retorno de Leatherface’ não é o que você quer; todavia, se você tem uma hora e vinte para perder de seu dia, vá em frente: a melhor coisa a ser vista é quando os créditos finais aparecem na tela.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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