domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | ‘Pânico’, clássico de Wes Craven, continua como um dos mais importantes filmes slasher de todos os tempos

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Quando Wes Craven trouxe à vida o primeiro capítulo da icônica franquia Pânico, o mundo do cinema passou por uma grande transformação no tocante estético e narrativo pelo simples fator da metalinguagem. Obviamente, o teor autorreferenciativo já apareceu com brevidade em outras produções, como ‘Cantando na Chuva’ e ‘A Última Sessão’, mas nunca com peso dramático de tanta importância como aqui. Como bem apontou Roger Ebert em sua crítica sobre o longa-metragem, foi a partir do longa-metragem de Craven que os personagens começavam a discutir sobre o próprio processo fílmico em vez de apenas exaltar a existência do cinema.

A trama pode não ser original em seu âmago, visto que presta homenagem a outra clássica saga comandada pelo realizador, ‘A Hora do Pesadelo’, e a tantos filmes de sua carreira. Em Pânico, o gênero slasher ganha uma camada tragicômica que acompanha cada um dos protagonistas e coadjuvantes e que constrói um universo dentro de um universo, arquitetando um microcosmos que nos convida a participar da mentalidade que se esconde por trás do filme. O enredo é focado em um grupo de jovens que vira alvo de um assassino em série conhecido como Ghostface – e que aterroriza a pequena cidade de Woodsboro para provar um ponto bastante sórdido e para obter vingança que só se concretiza nas cenas finais.



No centro desse banho de sangue cinematográfico, está Sidney Prescott (Neve Campbell), uma jovem estudante que é idolatrada como a principal vítima do serial killer e que dialoga com um passado traumática envolvendo o homicídio da mãe. Observando impotente seus amigos e entes queridos morrerem um a um, Sidney é alimentada por uma vendeta pessoal que a faz querer por um fim nesse reino de caos e voltar a uma normalidade que talvez nem exista mais. Como se não bastasse, ela é acompanhada pelo delegado assistente Dewey Riley (David Arquette), pela melhor amiga Tatum Riley (Rose McGowan) e pelo namorado Billy Loomis (Skeet Ulrich) nessa empreitada – e enfrenta inúmeros obstáculos no caminho.

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A grande beleza do filme é não perceber sua grandiosidade; dessa forma, Craven tem plena ciência do que está fazendo sem querer revolucionar o método de se contar histórias (e, dessa maneira, o fazendo com solenidade marcante). Ghostface é tradução materializada dos mais memoráveis antagonistas do cinema e não pensa duas vezes antes de citar suas motivações (Qual o seu filme de terror favorito? é um de seus vários bordões), pincelado com uma caracterização pungente que ficaria eternizada na cultura pop. Eventualmente, o público sabe que a identidade do antagonista será revelada mais cedo ou mais tarde – mas o caminho que ele trilha também é motivo de convencer os espectadores a embarcar nessa perigosa e mortal jornada.

Campbell faz um trabalho incrível como Sidney, encarnando os atributos mais arquetípicos da final girl e, de certa maneira, premeditando que retornaria inúmeras vezes ao mesmo ciclo de angústia e de morte que lhe acompanhou desde jovem – ora, ela até mesmo pega referências performáticas de ‘Jovens Bruxas’, suspense teen que estrelara alguns meses antes. E, enquanto a atriz domina as cenas, ela divide a atenção da audiência com Arquette, que entra com um interessante apreço pelo escape cômico, com McGowan, infundida em uma irreverência dilacerante, e, num âmbito bem mais marcante, Matthew Lillard como o assustador Stu Macher e Courteney Cox em uma de suas melhores rendições como a ambiciosa jornalista Gale Weathers.

Além das incríveis performances, o longa conta com uma trama que usa e abusa de estereótipos e clichês do gênero – cortesia da surpreendente estreia de Kevin Williamson como roteirista. Williamson mostra que tem bagagem o suficiente para descontruir as fórmulas do terror e que não tem medo de ousar com fusões inesperadas de estilos. O slasher, os jumpscares e o suspense são os ingredientes de maior sabor nessa deliciosa miscelânea – mas a angústia de ver os personagens serem perseguidos por um homicida mascarado é interrompida por diálogos cômicos e quebras de expectativa muito bem-vindas, bem como pontuais incursões políticas que são resgatadas nas sequências. E, no topo de tudo isso, Marco Beltrami nos agracia com uma tétrica e sólida trilha sonora que remonta a Ennio Morricone e a lamentações melancólicas para contribuir para a complexidade dos personagens.

Pânico carrega um senso de discernimento que seria aproveitado e reutilizado ad nauseam nos anos que o seguiriam, motivo pelo qual boa parte das cenas são reproduzidas até hoje. Não é surpresa que a icônica cena de abertura, que imortalizou Drew Barrymore como Casey Becker, tenha servido de inspiração para tantas obras cinematográficas e televisivas.

Em suma, são poucos os filmes de terror que superam o legado de uma das grandes obras de Craven. Cada elemento de sua estrutura é pensado com cautela invejável, dosando metalinguagem, ficção em realidade numa balança regada a mortes chocantes – e a uma das reviravoltas mais sangrentas do cinema.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Quando Wes Craven trouxe à vida o primeiro capítulo da icônica franquia Pânico, o mundo do cinema passou por uma grande transformação no tocante estético e narrativo pelo simples fator da metalinguagem. Obviamente, o teor autorreferenciativo já apareceu com brevidade em outras produções, como ‘Cantando na Chuva’ e ‘A Última Sessão’, mas nunca com peso dramático de tanta importância como aqui. Como bem apontou Roger Ebert em sua crítica sobre o longa-metragem, foi a partir do longa-metragem de Craven que os personagens começavam a discutir sobre o próprio processo fílmico em vez de apenas exaltar a existência do cinema.

A trama pode não ser original em seu âmago, visto que presta homenagem a outra clássica saga comandada pelo realizador, ‘A Hora do Pesadelo’, e a tantos filmes de sua carreira. Em Pânico, o gênero slasher ganha uma camada tragicômica que acompanha cada um dos protagonistas e coadjuvantes e que constrói um universo dentro de um universo, arquitetando um microcosmos que nos convida a participar da mentalidade que se esconde por trás do filme. O enredo é focado em um grupo de jovens que vira alvo de um assassino em série conhecido como Ghostface – e que aterroriza a pequena cidade de Woodsboro para provar um ponto bastante sórdido e para obter vingança que só se concretiza nas cenas finais.

No centro desse banho de sangue cinematográfico, está Sidney Prescott (Neve Campbell), uma jovem estudante que é idolatrada como a principal vítima do serial killer e que dialoga com um passado traumática envolvendo o homicídio da mãe. Observando impotente seus amigos e entes queridos morrerem um a um, Sidney é alimentada por uma vendeta pessoal que a faz querer por um fim nesse reino de caos e voltar a uma normalidade que talvez nem exista mais. Como se não bastasse, ela é acompanhada pelo delegado assistente Dewey Riley (David Arquette), pela melhor amiga Tatum Riley (Rose McGowan) e pelo namorado Billy Loomis (Skeet Ulrich) nessa empreitada – e enfrenta inúmeros obstáculos no caminho.

A grande beleza do filme é não perceber sua grandiosidade; dessa forma, Craven tem plena ciência do que está fazendo sem querer revolucionar o método de se contar histórias (e, dessa maneira, o fazendo com solenidade marcante). Ghostface é tradução materializada dos mais memoráveis antagonistas do cinema e não pensa duas vezes antes de citar suas motivações (Qual o seu filme de terror favorito? é um de seus vários bordões), pincelado com uma caracterização pungente que ficaria eternizada na cultura pop. Eventualmente, o público sabe que a identidade do antagonista será revelada mais cedo ou mais tarde – mas o caminho que ele trilha também é motivo de convencer os espectadores a embarcar nessa perigosa e mortal jornada.

Campbell faz um trabalho incrível como Sidney, encarnando os atributos mais arquetípicos da final girl e, de certa maneira, premeditando que retornaria inúmeras vezes ao mesmo ciclo de angústia e de morte que lhe acompanhou desde jovem – ora, ela até mesmo pega referências performáticas de ‘Jovens Bruxas’, suspense teen que estrelara alguns meses antes. E, enquanto a atriz domina as cenas, ela divide a atenção da audiência com Arquette, que entra com um interessante apreço pelo escape cômico, com McGowan, infundida em uma irreverência dilacerante, e, num âmbito bem mais marcante, Matthew Lillard como o assustador Stu Macher e Courteney Cox em uma de suas melhores rendições como a ambiciosa jornalista Gale Weathers.

Além das incríveis performances, o longa conta com uma trama que usa e abusa de estereótipos e clichês do gênero – cortesia da surpreendente estreia de Kevin Williamson como roteirista. Williamson mostra que tem bagagem o suficiente para descontruir as fórmulas do terror e que não tem medo de ousar com fusões inesperadas de estilos. O slasher, os jumpscares e o suspense são os ingredientes de maior sabor nessa deliciosa miscelânea – mas a angústia de ver os personagens serem perseguidos por um homicida mascarado é interrompida por diálogos cômicos e quebras de expectativa muito bem-vindas, bem como pontuais incursões políticas que são resgatadas nas sequências. E, no topo de tudo isso, Marco Beltrami nos agracia com uma tétrica e sólida trilha sonora que remonta a Ennio Morricone e a lamentações melancólicas para contribuir para a complexidade dos personagens.

Pânico carrega um senso de discernimento que seria aproveitado e reutilizado ad nauseam nos anos que o seguiriam, motivo pelo qual boa parte das cenas são reproduzidas até hoje. Não é surpresa que a icônica cena de abertura, que imortalizou Drew Barrymore como Casey Becker, tenha servido de inspiração para tantas obras cinematográficas e televisivas.

Em suma, são poucos os filmes de terror que superam o legado de uma das grandes obras de Craven. Cada elemento de sua estrutura é pensado com cautela invejável, dosando metalinguagem, ficção em realidade numa balança regada a mortes chocantes – e a uma das reviravoltas mais sangrentas do cinema.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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