segunda-feira, abril 15, 2024

Crítica | Para Minha Amada Morta

Este filme é repleto de boas qualidades, talvez o que se possa chamar de um bom filme para os padrões narrativos clássicos. Não é, porém, seguida uma cartilha de como fazer um bom filme de gênero. Elementos interessantes e não tão usuais permeiam o suspense angustiante de Aly Muritiba, fora outros aspectos mais comuns que tem solidez admirável. Por último e não menos importante, trata-se de um filme de suspense num pais que produz pouco ou nada de longas-metragens desse tipo. Não é obrigatório que seja produzido pelo menos um exemplar de cada gênero, mas a existência deste filme e outros como o excelente Mate-me por Favor, de Anita Rocha da Silveira, só enriquecem o nosso cinema.

A graça do filme de Muritiba reside não no que acontece, mas no que deixa de acontecer e na expectativa criada sobre isso. Como Bresson, parece mirar sempre em algo fora do próprio alcance; extra tela. O sentimento vem não só do que acontece, mas do que poderia acontecer e esse vai e não vai se mantém graciosamente até o final. Essa expectativa se constrói não só por cada um dos acontecimentos que culminam num impasse, mas também no grande objetivo estabelecido pelo protagonista.

Fernando (Fernando Alvez Pinto) não quer apenas vingança, ele quer acabar com a vida do homem que transou com sua esposa enquanto ela era viva (o ato foi consensual); quer destruir com precisão cirúrgica a vida de Salvador (Lourinelson Vladmir). Para isso ele se infiltra na vida do alvo visando destruí-lo por dentro, preferindo a dor lenta e gradual através da intervenção estratégica ao contrário da intensidade e rapidez de uma única investida.

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Fernando é bastante humano e o que o leva a apelar a esta estratégia é justamente não conseguir realizar a outra. Ele chega a seguir o sujeito até a sua casa, armado e pronto para descarregar o pente, mas chegando lá avista Salvador não sozinho, mas acompanhado da esposa e dos filhos; uma adolescente e uma criança de colo. Ele abaixa a cabeça e nesse momento o conflito que durará por toda a projeção começa a ser sentido.

Fernando é um Homem Kantiano por excelência; em eterno conflito, ele parece nunca chegar a um resultado concreto até o último plano. Seu lado racional e animalesco estão – através do excelentíssimo trabalho de Fernando Alves Pinto e Aly Muritiba na construção do personagem e seus conflitos – em eterno embate. Isso culmina nos ápices de tensão que aparecem com frequência ao longo do filme. Ás vezes representados pelos revólveres e pás empunhadas por um dos dois homens, outras por seus olhares e punhos cerrados que nessas circunstâncias poderiam se tornar armas.

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Muritiba tem um talento fora de sério para fazer crescer esses momentos. A câmera na mão, a baixa profundidade de campo (exagerada em alguns momentos) e a Mise-en-scène (posicionamento no espaço) constroem uma sensação perturbadora, aliadas ao uso espetacular de planos sequências (não há cortes) que fazem com que se prenda a respiração por dados momentos. Aly entende a natureza do tempo e como ela contribui na construção da tensão, firmando a cada segundo que passa um contrato de veracidade com o espectador.

Este embate vai sendo travado até o último plano quando Fernando parece finalmente resolvido sobre o ponto que se encontra. Ao mesmo tempo que este final não é grandioso; é. Além da extrema beleza visual e do próprio conteúdo do que acontece ser belo, há algo sublinhado no plano final que apaga a labareda acendida pelos cem minutos anteriores. O que importa num filme de suspense é o suspense. Parece óbvio, mas não é.

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