Em entrevista ao Digital Spy, o diretor Galder Gaztelu-Urrutia falou sobre as metáforas e simbolismos no filme ‘O Poço‘ (The Plataform), da Netflix.
“‘O Poço’ reflete a desumanização fria do mundo em que vivemos”, adianta o diretor.
“Certamente achamos que deve haver uma melhor distribuição da riqueza, mas o filme não é estritamente sobre o capitalismo. Pode haver uma crítica ao capitalismo desde o início, mas mostramos que, assim que Goreng e Baharat experimentam o socialismo para convencer os outros prisioneiros a compartilharem de boa vontade sua comida, eles acabam matando metade das pessoas que pretendem ajudar”, continua.
“No final, o problema surge quando você tenta exigir a colaboração de todos, e você vê que não há grandes conquistas até o desfecho. Goreng faz o que ele se propôs a fazer ao trazer a panna cotta e a criança para o nível mais baixo. Mas ele não mudou de ideia sobre compartilhar a comida. Para mim, esse nível mais baixo não existe. Goreng está morto antes de ele chegar, e essa é apenas sua interpretação do que ele sentiu que tinha que fazer”, observou Gaztelu-Urrita.
“No final, eu queria que fosse aberto à interpretação, se o plano funcionou e os superiores se importam com as pessoas na cova. Na verdade, filmamos um final diferente da garota que chega ao primeiro nível, mas a eliminamos do filme.”
“Vou deixar o que acontece com a sua imaginação.”, concluiu.
Atendendo a pedidos, decidimos explicar o final em vídeo e em texto:
O que a criança representa exatamente?
O filme é repleto de metáforas bíblicas, políticas e sociais. Através de uma metáfora, a trama explica que há comida e recursos mais do que suficientes para todos, mas o consumo excessivo daqueles em uma “posição melhor” inevitavelmente leva à desigualdade, que consequentemente leva à fome e à morte.
Se as pessoas que estão a cima realmente pensassem nos que estão abaixo, todos se alimentariam. Mas a ganância e o egoísmo não permitem que isso aconteça.
O filme traça um paralelo à armadilha que a sociedade lançou sobre si mesma, mas a solução não é simples. Apesar da mensagem poder chegar a todos.
Goreng e Baharat decidem mostrar que o sistema é falho enviando uma mensagem para seus criados. Eles tentam levar um dos pratos, uma pana cota, intacta até o final do poço: mostrando que eles não conseguiram corromper o espírito humano. Quando eles chegam ao final do poço, descobrem a verdadeira mensagem que está escondida no nível 333, um lugar aonde ninguém sobreviveu ou pode acessar.
A filha de Miharu realmente existe e está sã e salva lá. Miharu subia e descia todos os dias o poço, mas não estava à procura de sua filha. Na verdade, ela estava descendo todo dia ao nível mais baixo para levar um prato de comida para a criança, a mantendo segura em um nível que ninguém tem acesso. Como a criança chegou lá não é revelado, afinal, menores de 16 anos não são permitidos no Poço. Miharu podia levar algo com ela, teria sido a filha? Fica a dúvida.
A garotinha representa a esperança. Ela é a mensagem, e Goreng – que várias vezes é chamado de Messias – é o Mensageiro. Fica bem clara a alusão a Jesus e a Bíblia. Assim como Jesus, Goreng é o mensageiro incubado da salvação.
A criança ainda não foi corrompida pelo sistema, ao contrário de Goreng. Ele não é mais o mesmo depois de ter presenciado todos os horrores do poço, ele foi corrompido. Já a menina representa o espírito humano, ininterrupto, apesar da influência avassaladora e desumanizante do sistema.
No final, Goreng não pode subir com ela, e decide se sacrificar para provar ao sistema e às outras pessoas que EXISTE esperança, e que o sistema está QUEBRADO. Metaforicamente falando, a garota é o futuro, e provavelmente a única esperança que a humanidade ainda tem.
A menina é ao mesmo tempo um símbolo da resiliência da humanidade e uma indicação de que a mudança só pode vir da juventude.
E você, o que entendeu do final?
Confira a explicação em vídeo:
Crítica | O Poço – Netflix entrega seu filme mais angustiante e impactante
Na trama, parte da população tenta se hospedar em uma prisão subterrânea para ganhar posições sociais, mas é preciso descer aos níveis mais profundos do poço para sair vencedor da disputa.
Tentando quebrar o sistema, um prisioneiro vai fazer de tudo para descobrir os segredos de cada nível da prisão e ajudar uma jovem a dar uma vida digna para o seu filho.
Lançado nos cinemas espanhóis em 2019, o longa foi bastante elogiado pelo público e pelos críticos, alcançando 83% de aprovação no Rotten Tomatoes.
O suspense é dirigido por Galder Gaztelu-Urrutia e o elenco conta com Iván Massagué, Antonia San Juan, Zorion Eguileor, Alexandra Masangkay e Emilio Buale.
Dentro de um sistema prisional vertical, os detentos são destinados a um andar em específico e forçado a racionar comida de uma plataforma que se move pelos diferentes níveis. O filme é uma alegoria social sobre a raça humana em seu momento de maior desespero: a fome.