Hoje, a palavra de ordem em Hollywood é franquia. Estabelecer uma marca de sucesso, ou reaproveita-la tirando todo o suco que ela pode oferecer. Estas propriedades milionárias são constantemente repaginadas para as novas gerações. Assim, temos as voltas de produtos lá da década de 1980 chegando aos montes, reconfigurados para os tempos modernos. É verdade que muitas propriedades anteriores ao marco geracional pop que foram os anos 80 igualmente são retrabalhadas para continuar a gerar empregos e dinheiro – como é o caso de obras como Psicose e Westworld, por exemplo, dentre inúmeras outras.
Para demonstrar o quão antiga é a prática das franquias em Hollywood, aqui retornaremos nada menos que 90 anos do passado para relembrar uma das primeiras propriedades lucrativas serializadas no cinema de um grande estúdio. Trata-se dos chamados Monstros da Universal Pictures – um dos primeiros estúdios considerados majors a pensar fora da caixinha e interligar produções de seus personagens mais famosos do período. Isso muitas décadas antes da Marvel Studios atingir magistralmente seu objetivo seguindo esta fórmula. Assim, antes do Homem de Ferro, Thor e Capitão América estrelando seus filmes e realizando encontros em outras produções, tínhamos nos anos 1930 e 1940 as figuras pop do período: Drácula, Frankenstein e o Lobisomem concretizando o mesmo. Figuras de terror extremamente vendáveis ao grande público, que seguem na cultura pop até os dias de hoje.
Pensando nisso, e no fato destas figuras serem a perfeita essência que define o dia das bruxas, iremos nesta matéria retornar para o passado onde tais figuras iniciaram um movimento de marketing que ajudaria muito o cinema entretenimento décadas depois. Vamos relembrar os principais longas do chamado universo dos monstros clássicos do cinema. Confira abaixo.
Drácula (1931)
Considerado por muitos “o” primeiro grande filme de terror da história do cinema, Drácula foi lançado em fevereiro de 1931 – há exatos 90 anos. Já imaginou? Por mais que a história de Bram Stoker sobre um nobre príncipe que é secretamente um morto-vivo sugador de sangue já tivesse sido levada às telas (mesmo que de maneira não oficial) em Nosferatu (1922), na era do cinema mudo, essa foi a primeira investida no texto de forma precisa e permitida. Dirigido por Todd Browning e Karl Freund (de forma não creditada), o filme imortalizou personagens que ficariam para sempre no subconsciente coletivo, como Van Helsing, por exemplo, o médico estudioso que é o primeiro a jogar luz na condição demoníaca de Drácula, e se tornou tão popular quando o vilão em si. O protagonista, por sua vez, ficaria para sempre marcado nas formas do romeno Bela Lugosi, o Drácula mais elegante da sétima arte. Em 1992, Francis Ford Coppola deu sua versão suntuosa do clássico.
Frankenstein (1931)
No mesmo ano do clássico atemporal Drácula, outra produção icônica era lançada em novembro e viria a ajudar o universo dos monstros a tomar forma. Produzido pela mesma Universal Pictures, e igualmente baseado num antigo romance literário de terror (esse da autora precursora Mary Shelley), Frankenstein ia mais longe ao abordar questões de amplo quadro dramático. No centro da trama está um gênio da ciência, se deixando controlar completamente por sua obsessão. Ao brincar de Deus, o Dr. Frankenstein concede vida a um morto – ou melhor, vários, já que o monstro de Frankenstein é a junção das partes de vários cadáveres costurados para formar o “homem perfeito”. Uma criatura profana, que não entende seu propósito no mundo, perdido no limbo entre os vivos e os mortos. James Whale dirige o clássico, protagonizado, é claro, por Boris Karloff. Em 1994, foi a vez de Kenneth Branagh tentar a sorte com uma adaptação.
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A Múmia (1932)
Depois de dois golaços com os góticos e mórbidos Drácula e Frankenstein, dois contos sobre o macabro, a Universal Pictures percebeu que esse filão poderia ser extremamente lucrativo. Assim tratou de trazer logo no ano seguinte uma produção à altura. Com direção de Karl Freund, que havia co-dirigido Drácula, e protagonizado pelo mesmo Boris Karloff de Frankenstein (agora o menino de ouro do estúdio no gênero), A Múmia não era a adaptação de um livro clássico, mas sim um roteiro original. Na trama, um novo mal antigo era trazido para aterrorizar as audiências em massa: o príncipe do leste europeu de Drácula, dava lugar a um príncipe egípcio chamado Im-Ho-Tep. Após ser acusado de sacrilégio, ele é condenado à morte e mumificado. Uma expedição em 1921, o encontra e o desperta de seu sono, onde volta à vida como uma criatura maligna. O conto retornaria pelas mãos da própria Universal em 1999, numa aventura de matinê nos moldes de Indiana Jones.
O Homem Invisível (1933)
A cada novo ano, a Universal Pictures colocava mais uma pedra na construção de sua grande casa assombrada. Para o seu quarto grande filme na galeria dos monstros, mais uma obra literária clássica era usada como matéria-prima para uma de suas produções. Depois de Bram Stoker e Mary Shelley, um dos pais da “ficção científica” na cultura pop, H.G. Wells, era tema de um longa de terror da Universal. O Homem Invisível trazia em sua narrativa muito de Frankenstein, no sentido em que dois gênios da ciência criavam invenções profanas, mesmo tendo boas intenções. No fim das contas, os dois acabavam ensandecidos com suas experiências e se tornavam os verdadeiros monstros aqui. A diferença é que ao contrário do Dr. Frankenstein, o Dr. Jack Griffin (Claude Rains) usava a si mesmo como cobaia de seu experimento. Assim, ele se tornava o homem invisível, uma aberração sem forma e sanidade. Na direção, o estúdio revezava seus talentos e aqui contratava James Whale novamente.
A Noiva de Frankenstein (1935)
Em time que está ganhando não se mexe. Assim, James Whale, prata da casa da Universal nesta fase, havia criado dois filmes sobre cientistas loucos e seus experimentos inconcebíveis, que desafiavam a razão e as leis dos homens. O Homem Invisível fez sucesso, mas não se tornou um ícone como Frankenstein. Assim, o estúdio resolveu manter Whale perto de sua criação para um novo round com o monstro zumbi que é feito de partes de cadáveres. A opção foi por uma sequência. Uma que muitos afirmam ser ainda melhor do que o original. Usado como complemento do texto que Mary Shelley havia escrito para o livro original, A Noiva de Frankenstein introduz a primeira personagem feminina desta galeria de clássicos monstros, imortalizada por uma performance inesquecível de Elsa Lanchester. Novamente trazendo Karloff como o monstro, a história mostra o mesmo cientista louco criando uma companheira para seu “filho”.
O Lobisomem (1941)
Embora seja considerado parte da “tríade” dos monstros, ao lado de Drácula e Frankenstein, O Lobisomem não foi pensando logo de início para compor esse time terrivelmente assustador. Pelo contrário, nos primórdios, na década de 1930, outros seres macabros chegaram antes dele como pilares da franquia no estúdio: vide A Múmia, O Homem Invisível e A Noiva de Frankenstein. O homem lobo só seria revelado dez anos depois do início de tudo, em 1941, numa nova década. Novamente apostando numa ideia original, assim como A Múmia, O Lobisomem era criado a partir de um roteiro e não de um romance clássico. Na trama, Larry Talbot (Lon Chaney Jr.) é amaldiçoado ao ser mordido por um lobo, se transformando assim numa criatura metade homem, metade lobo, quando a lua cheia ganha os céus. Uma criatura irracional que é puro instinto assassino e que pode vir a dilacerar qualquer pessoa, inclusive os que o homem por trás do lobo ama. O monstro fez tanto sucesso que apareceria em encontros ao lado de Frankenstein e Drácula, se tornando assim uma das criaturas mais populares do estúdio.
O Monstro da Lagoa Negra (1954)
Durante a década de 1940, após a introdução do muito bem sucedido Lobisomem como uma das figuras celebradas no panteão do universo de monstros do estúdio, a “tríade” (Frankenstein, Drácula e Lobisomem) estrelaram diversos crossover, que dominaram a década. Assim como outras marcas como A Múmia e O Homem Invisível seguiram gerando sequências em suas próprias linhas narrativas. Com a chegada dos anos 50, a era do terror abria espaço para o desconhecido da ficção científica. Em pleno auge dos vilões extraterrestres, a Universal apostava em uma criatura diferente para se tornar o último grande personagem desta galeria. Em 1954 surgia O Monstro da Lagoa Negra, um elo perdido entre homem e peixe, surgido das profundezas para ser estudado por cientistas. Uma curiosidade é que a continuação do filme, lançada logo no ano seguinte, trouxe um dos primeiros papeis de Clint Eastwood no cinema. Fora isso, essa criatura seria homenageada por Guillermo del Toro em A Forma da Água (2017), vencedor do Oscar de melhor filme.