domingo , 22 dezembro , 2024

[Exclusivo] BATE PAPO com EMERALD FENNELL sobre Saltburn: “Filmo cenas de sexo numa mistura de BELEZA e DEGRADAÇÃO”

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Ganhadora do Oscar de Melhor Roteiro Original por Bela Vingança (Promising Young Women) em 2021, Emerald Fennell aprimora o seu tom de humor atrelado a discussão social dentro de uma estonteante ambientação em Saltburn, lançado dia 22 de dezembro na Prime Video. Em bate-papo exclusivo numa sessão para apenas algumas dezenas de convidados no centro de Paris, a cineasta de 38 anos revelou suas influências, segredos sobre a cena final e motivações ao criar o satírico mundo do seu segundo longa-metragem. 

Com dois dos mais jovens talentosos atores da atualidade —  Barry Keoghan (Os Banshees de Inisherin) e Jacob Elordi (Priscilla) —, o longa é um burlesco e original jogo de manipulação e sedução pincelado de um vigoroso humor sombrio e sensual. Segundo Emerald, o filme é sobre “a dinâmica de poder em todas as relações”, pois para ela todos os relacionamentos, seja amizade, amorosos, seja profissionais, casuais são condicionados a esta batalha. 



Transgressão no cinema 

Com um lançamento tímido no Festival de Telluride, em Colorado, nos Estados Unidos, no fim de agosto, e no BFI – Festival de Londres, em outubro, Saltburn teve um recepção à margem dos grandes eventos de cinema, mas provocou algumas controvérsias pelo caminho. Com uma fotografia de enebriar os olhos, de Linus Sandgren — responsável por Babylon (2022) e La La Land – Cantando Estações (2016) —, cenas de nudez frontal e sexo com mestruação e homoafetivo, o longa chocou os mais conservadores. 

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Espero que todos os filmes sejam transgressores, porém honestos. Temos o direito de nos expressar através da metáfora e de fazer as pessoas olharem para coisas que não são confortáveis”, declarou Emerald sobre o projeto, diante da pequena plateia de convidados —  entre eles a atriz Catherine Deneuve, a atriz e diretora Agnés Jaoui (O Gosto dos Outros) e Guillaume Laurant, roteirista de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, entre outros títulos franceses, no último dia 6 de novembro. 

Eu amo Olivier [personagem de Barry Keoghan no filme], porque ele faz as coisas que todos nós gostaríamos de fazer. A minha metáfora busca destruir tudo que não gostamos, assim como Oliver reduz tudo às cinzas”, explica a cineasta britânica. “Não gosto de fazer julgamento moral, mas quero que as pessoas sintam [o filme] de forma autêntica. Todos nós somos, de certa maneira, monstruosos”, completa. 

Sexo e Degradação

Com um começo já sufocante por esplendidas imagens de Felix (Jacob Elordi), as cenas mais emblemàticas são de atos sexuais e nudez. Após declarar que a diretora francesa Catherine Breillat (Culpa e Desejo) é uma de suas cineasta preferidas, Emerald Fennell confessou sua visão sobre as cenas eróticas: 

Quando filmo uma cena de sexo entre duas pessoas, filmo uma mistura de beleza e degradação. É isso que as cenas de sexo do filme buscam: desejo e repulsão”, afirma a diretora. Sobre a cena de menstruação, ela confessa ter inspirado em Catherine Breillat para quebrar este tabu sobre a natureza do sexo. No filme Anatomia do Inferno (2004), a diretora francesa apresenta uma cena explícita de penetração sexual durante o período menstrual e o sangue é posto em evidência durante e depois da cena sexual. 

Em conversa com Emerald Fennell, ela alegou ter apreciado intensamente o último filme da diretora [Culpa e Desejo — apresentado na mostra competitiva do Festival de Cannes 2023], enquanto eu alegava um certo desconforto diante da proposta do filme. Porém, incômodo é exatamente uma das verves de seu trabalho, como em seu primeiro filme. 

Para a diretora britânica, os temas mais audaciosos devem ser tratados como metáforas artísticas, tal como ela realizou no premiado Bela Vingança (2020). No longa ganhador do Oscar, a personagem de Carey Mulligan busca vingar-se dos estupradores da sua amiga durante a faculdade (e ensinar uma lição aos homens aproveitadores) em uma estética pop cor-de-rosa.

Estética e Música 

Em uma ambientação fantástica e um elenco secundário de peso, como Carey Mulligan (Maestro) e Rosamund Pike (Garota Exemplar), Emerald conta que a inspiração para o design artístico e figurinos foram inspirados nos quadros do pintor barroco italiano Caravaggio. “Saltburn é como uma casa de bonecas”, sentencia a roteirista e diretora da produção.  

Já para a trilha sonora, Emerald Fennell compartilha que “são as músicas que eu ouço”. “Eu escrevo com uma trilha sonora que me coloca num espaço mental. Fizemos cinco versões do filme na montagem sem música para ter o tom do filme sem cair na nostalgia, mas eu uso especialmente música pop”, expõe. Com bandas como Girls Aloud, Block Party, Arcade Fire, Ladytron, MGMT, a artista realmente incorpora uma nostalgia da década passada, em um cenário sem redes sociais e adolescentes superconectados. 

Para definir o filme em uma palavra, Emerald Fennell escolheu: “vampiro”, o que levou a plateia a algumas risadas. Se Oliver é um alpinista social, sanguesuga no sentido figurado, no filme ele também pode ser considerado um “vampiro” no sentido denotativo durante uma cena de sexo oral. 

Por que Barry Keoghan

Se o sexo é sempre criador de polêmicas, a cena final do longa-metragem com Barry Keoghan deixa os espectadores de queixo caído ou completamento extasiados. “Eu assisti ao filme O Sacrifício do Cervo Sagrado [2017] e me perguntei: quem é esse ator incrível? Em todos os momentos, ele era a opção óbvia [para este filme]. Era impossível que outra pessoa fizesse esse papel”, relatou Fennell extremamente contente com a escolha.

Ela ainda confessa que escreveu Saltburn com o ator em mente, pois desde a sua descoberta durante o filme do grego Yorgos Lanthimos (Pobres Criaturas), ela queria trabalhar com ele. Um easter-egg desse primeiro encontro é deixado pela cineasta no filme, como ela mesma conta, em forma de adereço utilizado por Oliver durante a festa à fantasia da família Catton, onde ele começa a mostrar sua verdadeira faceta. 

Para a bela coreografia da cena final ao som da canção Murder on the Dancefloor, de Sophie Ellis-Bextor, Barry Keoghan refez a sequência mais de 10 vezes. Foram 11 takes e ele não ligou. Ele está interessado em fazer a cena da melhor forma possível. O que as pessoas acham difícil, para ele é fácil. Ele tem uma dimensão mais complexa, mais audaciosa, mais íntima. Às vezes, apenas em um olhar, a gente se compreendia”, assegura Fennell sobre a sua ótima parceria com o ator.

A atuação do ator irlandês já garantiu uma indicação de Melhor Ator de Drama no Globo de Ouro 2024 e com grandes chances de chegar entre os cinco nomeados ao Oscar 2024. Caso a promessa seja concretizada, ele será por dois anos seguidos na cerimônia, depois da nomeação como Ator Coadjuvante por Os Banshees de Inisherin, em 2023.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Com dois dos mais jovens talentosos atores da atualidade —  Barry Keoghan (Os Banshees de Inisherin) e Jacob Elordi (Priscilla) —, o longa é um burlesco e original jogo de manipulação e sedução pincelado de um vigoroso humor sombrio e sensual. Segundo Emerald, o filme é sobre “a dinâmica de poder em todas as relações”, pois para ela todos os relacionamentos, seja amizade, amorosos, seja profissionais, casuais são condicionados a esta batalha. 

Transgressão no cinema 

Com um lançamento tímido no Festival de Telluride, em Colorado, nos Estados Unidos, no fim de agosto, e no BFI – Festival de Londres, em outubro, Saltburn teve um recepção à margem dos grandes eventos de cinema, mas provocou algumas controvérsias pelo caminho. Com uma fotografia de enebriar os olhos, de Linus Sandgren — responsável por Babylon (2022) e La La Land – Cantando Estações (2016) —, cenas de nudez frontal e sexo com mestruação e homoafetivo, o longa chocou os mais conservadores. 

Espero que todos os filmes sejam transgressores, porém honestos. Temos o direito de nos expressar através da metáfora e de fazer as pessoas olharem para coisas que não são confortáveis”, declarou Emerald sobre o projeto, diante da pequena plateia de convidados —  entre eles a atriz Catherine Deneuve, a atriz e diretora Agnés Jaoui (O Gosto dos Outros) e Guillaume Laurant, roteirista de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, entre outros títulos franceses, no último dia 6 de novembro. 

Eu amo Olivier [personagem de Barry Keoghan no filme], porque ele faz as coisas que todos nós gostaríamos de fazer. A minha metáfora busca destruir tudo que não gostamos, assim como Oliver reduz tudo às cinzas”, explica a cineasta britânica. “Não gosto de fazer julgamento moral, mas quero que as pessoas sintam [o filme] de forma autêntica. Todos nós somos, de certa maneira, monstruosos”, completa. 

Sexo e Degradação

Com um começo já sufocante por esplendidas imagens de Felix (Jacob Elordi), as cenas mais emblemàticas são de atos sexuais e nudez. Após declarar que a diretora francesa Catherine Breillat (Culpa e Desejo) é uma de suas cineasta preferidas, Emerald Fennell confessou sua visão sobre as cenas eróticas: 

Quando filmo uma cena de sexo entre duas pessoas, filmo uma mistura de beleza e degradação. É isso que as cenas de sexo do filme buscam: desejo e repulsão”, afirma a diretora. Sobre a cena de menstruação, ela confessa ter inspirado em Catherine Breillat para quebrar este tabu sobre a natureza do sexo. No filme Anatomia do Inferno (2004), a diretora francesa apresenta uma cena explícita de penetração sexual durante o período menstrual e o sangue é posto em evidência durante e depois da cena sexual. 

Em conversa com Emerald Fennell, ela alegou ter apreciado intensamente o último filme da diretora [Culpa e Desejo — apresentado na mostra competitiva do Festival de Cannes 2023], enquanto eu alegava um certo desconforto diante da proposta do filme. Porém, incômodo é exatamente uma das verves de seu trabalho, como em seu primeiro filme. 

Para a diretora britânica, os temas mais audaciosos devem ser tratados como metáforas artísticas, tal como ela realizou no premiado Bela Vingança (2020). No longa ganhador do Oscar, a personagem de Carey Mulligan busca vingar-se dos estupradores da sua amiga durante a faculdade (e ensinar uma lição aos homens aproveitadores) em uma estética pop cor-de-rosa.

Estética e Música 

Em uma ambientação fantástica e um elenco secundário de peso, como Carey Mulligan (Maestro) e Rosamund Pike (Garota Exemplar), Emerald conta que a inspiração para o design artístico e figurinos foram inspirados nos quadros do pintor barroco italiano Caravaggio. “Saltburn é como uma casa de bonecas”, sentencia a roteirista e diretora da produção.  

Já para a trilha sonora, Emerald Fennell compartilha que “são as músicas que eu ouço”. “Eu escrevo com uma trilha sonora que me coloca num espaço mental. Fizemos cinco versões do filme na montagem sem música para ter o tom do filme sem cair na nostalgia, mas eu uso especialmente música pop”, expõe. Com bandas como Girls Aloud, Block Party, Arcade Fire, Ladytron, MGMT, a artista realmente incorpora uma nostalgia da década passada, em um cenário sem redes sociais e adolescentes superconectados. 

Para definir o filme em uma palavra, Emerald Fennell escolheu: “vampiro”, o que levou a plateia a algumas risadas. Se Oliver é um alpinista social, sanguesuga no sentido figurado, no filme ele também pode ser considerado um “vampiro” no sentido denotativo durante uma cena de sexo oral. 

Por que Barry Keoghan

Se o sexo é sempre criador de polêmicas, a cena final do longa-metragem com Barry Keoghan deixa os espectadores de queixo caído ou completamento extasiados. “Eu assisti ao filme O Sacrifício do Cervo Sagrado [2017] e me perguntei: quem é esse ator incrível? Em todos os momentos, ele era a opção óbvia [para este filme]. Era impossível que outra pessoa fizesse esse papel”, relatou Fennell extremamente contente com a escolha.

Ela ainda confessa que escreveu Saltburn com o ator em mente, pois desde a sua descoberta durante o filme do grego Yorgos Lanthimos (Pobres Criaturas), ela queria trabalhar com ele. Um easter-egg desse primeiro encontro é deixado pela cineasta no filme, como ela mesma conta, em forma de adereço utilizado por Oliver durante a festa à fantasia da família Catton, onde ele começa a mostrar sua verdadeira faceta. 

Para a bela coreografia da cena final ao som da canção Murder on the Dancefloor, de Sophie Ellis-Bextor, Barry Keoghan refez a sequência mais de 10 vezes. Foram 11 takes e ele não ligou. Ele está interessado em fazer a cena da melhor forma possível. O que as pessoas acham difícil, para ele é fácil. Ele tem uma dimensão mais complexa, mais audaciosa, mais íntima. Às vezes, apenas em um olhar, a gente se compreendia”, assegura Fennell sobre a sua ótima parceria com o ator.

A atuação do ator irlandês já garantiu uma indicação de Melhor Ator de Drama no Globo de Ouro 2024 e com grandes chances de chegar entre os cinco nomeados ao Oscar 2024. Caso a promessa seja concretizada, ele será por dois anos seguidos na cerimônia, depois da nomeação como Ator Coadjuvante por Os Banshees de Inisherin, em 2023.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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