O Festival de Cinema de Berlim (ou Berlinale) é um dos maiores festivais da Europa depois de Cannes e Veneza, além de ser o pontapé inicial das produções do ano. A partir desta quinta-feira, 15 de fevereiro, as ruas da Potsdamer Platz, no centro de Berlim, serão tomadas pelos tapetes vermelhos com a estreia mundial de Small Things Like These, filme de abertura do evento e baseado no romance histórico da autora irlandesa Claire Keegan.
Com o júri presidido pela mexicana-queniana Lupita Nyong’o, entre 15 e 25 de fevereiro, o evento recebe grandes nomes do cinema mundial e lança a primeira competição da temporada: a disputa pelo Urso de Ouro. Como no ano passado (veja tudo aqui), o CinePOP terá uma cobertura especial in loco para contar os detalhes em primeira mão dos lançamentos, as novidades, além das discussões e polêmicas dos bastidores.
Principal Polêmica Entre os Convidados
Quando às críticas não estão direcionadas a seleção oficial e a contínua disparidade de gênero, com 20 filmes, apenas seis dirigidos por mulheres (e dois deles em co-direção com homens), ela é no âmbito social-político. Os organizadores do Festival de Berlim desconvidaram cinco membros do partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD) da cerimônia de abertura.
Após semanas de discussão e uma carta aberta assinada por mais de 200 profissionais do cinema, os quais declararam ser “incompatível” com o compromisso do festival a presença de pessoas contra princípios básicos de empatia. Até a última quinta, dia 8 de fevereiro, os organizadores da Berlinale mantiveram a sua decisão, mas o debate tornou-se mais acalorado quando relatórios sobre uma reunião secreta dos políticos da AfD e ativistas neonazis vieram à luz do dia.
Nessa reunião, eles discutem um “plano diretor” de deportações em massa no caso de o partido chegar ao poder. Vale lembrar que em 2019, o então diretor da Berlinale, Dieter Kosslick, convidou os membros da AfD a participar no festival, instigando-os a ver um filme sobre a realidade da vida no gueto de Varsóvia. No fim das contas, a declaração é: “ todos os políticos da AfD anteriormente convidados (…) não são bem-vindos na Berlinale.”
Filmes em Sessão Especial
A atenção, entretanto, não estão somente nas polêmicas e na mostra competitiva, mas também na seleção Berlinale Special Gala, como as aguardadas produções: Spaceman, da Netflix, com Adam Sandler e Carey Mulligan; Love Lies Bleeding, com Kristen Stewart (presidente do júri do ano passado), recém-lançado em Sundance, em janeiro; e o suspense Cuckoo, com Hunter Schafer (da série Euphoria).
Dirigido pelo sueco Johan Renck, Spaceman é adaptação da obra literária Spaceman of Bohemia, de Jaroslav Kalfar, e mistura drama e ficção-científica. Aclamado pela minissérie Chernobyl (2019), o diretor teve passagens pela direção de Walking Dead e Breaking Bad, além de vários clipes musicais. Com estreia para dia 1° de março na plataforma de streaming, este pode ser considerado o primeiro longa-metragem do diretor, embora ele tenha dirigido o desconhecido A Libertação de Nancy (2008).
Com 90% de aprovação no Rotten Tomatoes, depois da première norte-americana em Sundance, Love Lies Bleeding chega à Europa com grandes expectativas. Produção da A24, este é o segundo filme de Rose Glass após o sucesso do terror Saint Maud (2019). Um filme com semelhante trajetória foi Vidas Passadas, de Celine Song, apresentado em Sundance, em seguida em Berlim, e hoje está entre os nomeados a Melhor Filme no Oscar 2024.
Após a participação no filme Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes (2023), a atriz transsexual Hunter Schafer ganha protagonismo fora da série Euphoria no papel de Gretchen, em Cuckoo. Segundo longa-metragem do diretor alemão Tilman Singer, o filme é um suspense obscuro e chama atenção mais pela atriz do que pela história em si.
Outra surpresa é o lançamento mundial da série italiana Supersex, da Netflix, no festival, prevista para chegar ao streaming em 6 de março. A série é livremente inspirada na vida e nas memórias do astro de filmes pornograficos Rocco Siffredi. Com 145 minutos, a produção busca um lançamento tal como The Idol, da HBO, no Festival de Cannes 2023, porém a esperança é algo melhor do que o produto estrelado por Lily-Rose Depp e The Weeknd.
Brasil representado na Alemanha
Mais uma vez o Brasil ficou de fora da mostra competitiva do festival. O país, entretanto, está representado pelos longas-metragens Betânia, de Marcelo Botta, e Cidade; Campo, de Juliana Rojas, nas respectivas mostras Panorama e Encounters. Além dos curtas-metragens Lapso, de Caroline Cavalcanti, e Quebrante, de Janaina Wagner.
Para completar a seleção, o Brasil também aparece em duas co-produções internacionais, são elas Shikun, de Amos Gitai, como a produtora brasileira Ventre Studio; e Dormir de olhos abertos, de Nele Wohlatz, com a produção da Cinemascópio, fundada por Kleber Mendonça Filho.
Os detalhes de cada produção podem ser encontrados no nosso artigo especial sobre o cinema nacional no Festival de Berlim 2024.
Júri de Estrelas do Urso de Ouro
Presidido por Lupita Nyong’o, o júri do festival é composto de outros seis atores, diretores e artistas do cinema para condecorar os filmes em oito categorias. Sob o comando de Kristen Stewart, o último grande prêmio foi concedido ao documentário No Adamant, de Nicolas Philibert, apresentado somente na Mostra de São Paulo, no Brasil.
Um dos membros do júri é o ator e diretor Brady Corbet, conhecido por seus papéis em Mistérios da Carne (2004) e a refilmagem de Violência Gratuita (2007). Como diretor, ele apresentou Vox Lux (2018), com Natalie Portman, no Festival de Venice 2018. Junto dele estará o diretor alemão Christian Petzold, cinco vezes selecionado na Competição de Berlim, e, no ano passo, ganhador do Urso de Prata – Grande Prêmio do Júri com o drama romântico Afire (2023).
Parte também do júri é a atriz e diretora de Hong Kong Ann Hui. Pouco conhecida em território brasileiro, um dos seus títulos mais famosos é Uma Vida Simples (2011), lançado no Festival de Veneza. Outros nomes são a atriz italiana Jasmine Trinca, conhecida por O Quarto do Filho (2001); o diretor espanhol Albert Serra, selecionado em Cannes 2022, com o filme Pacifiction (2022); e a escritora ucraniana Oksana Zabuzhko.
Filmes da Mostra Competitiva
Como supracitado, a competição deste ano conta com 20 filmes, entre eles dois documentários, e grande destaque para produções e co-produções europeias. Os mais aguardados são sempre os com atores conhecidos como Cillian Murphy, Gael Garcia Bernal, Rooney Mara, Isabelle Huppert e Sebastian Stan, além da presença dupla da atriz norueguesa Renate Reinsve – protagonista de A Pior Pessoa do Mundo (2021) -, em Another End e A Different Man.
Além das estrelas internacionais, alguns diretores também prometem surpreender por conta dos seus trabalhos anteriores, como o francês Olivier Assayas, responsável por Acima das Nuvens (2014) e Personal Shopper (2016), ambos com Kristen Stewart, e a franco-senegalesa Mati Diop, após o sucesso de Atlantique (2019), premiado em Cannes.
Os principais títulos são o filme de abertura Small Things Like These, de Tim Mielants, com Cillian Murphy; Black Tea, do cineasta mauritano Abderrahmane Sissako, uma odisseia cultural entre África e Ásia; e ainda A Different Man, com o ator Adam Pearson, que possui neurofibromatose e esteve no filme Sob a Pele (2013), de Jonathan Glazer.
Veja a lista completa da Mostra Competitiva:
- Another End, de Piero Messina, Itália
- Architecton, de Victor Kossakovsky, Alemanha / França
- Black Tea, de Abderrahmane Sissako, França / Luxemburgo / Taiwan / Mauritânia / Costa do Marfim
- La Cocina, de Alonso Ruizpalacios, México / EUA
- Dahomey, de Mati Diop, França / Senegal / Benin
- A Different Man, de Aaron Schimberg, EUA
- L’ Empire (The Empire), de Bruno Dumont, França / Itália / Alemanha / Bélgica / Portugal
- Gloria!, de Margherita Vicario, Itália / Suíça
- Hors du temps (Suspended Time), de Olivier Assayas, França
- In Liebe, Eure Hilde (From Hilde, With Love), de Andreas Dresen, Alemanha
- Keyke mahboobe man (My Favourite Cake), de Maryam Moghaddam, Behtash Sanaeeha, Irã / França / Suécia / Alemanha
- Langue Étrangère, de Claire Burger, França / Alemanha / Belgica
- Mé el Aïn (Who Do I Belong To), de Meryam Joobeur, Tunísia / França / Canadá / Noruega / Qatar / Arábia Saudita
- Pepe, de Nelson Carlos De Los Santos Arias, República Dominicana / Namíbia / Alemanha / França
- Shambhala, de Min Bahadur Bham, Nepal / França / Noruega / Hong Kong, China / Turquia / Taiwan / EUA / Qatar
- Small Things Like These (Kleine Dinge wie diese), de Tim Mielants, Irlanda / Bélgica
- Sterben (Dying), de Matthias Glasner, Alemanha
- Des Teufels Bad (The Devil’s Bath), de Veronika Franz e Severin Fiala, Áustria / Alemanha
- Vogter (Sons), de Gustav Möller, Dinamarca / Suécia
- Yeohaengjaui pilyo (A Traveler’s Needs), de Hong Sangsoo, Coreia do Sul