Muitas vezes recurso não recebe o devido reconhecimento
Categoria tradicional do Oscar, o reconhecimento para o melhor figurino sempre chama a atenção para o setor. Dentre os indicados da edição 2021 se encontra Emma, drama de época estrelado por Anya Taylor-Joy que parte como favorito para levar a estatueta, muito pela tradicional preferência da Academia pelos trajes típicos do subgênero. Porém, é importante ressaltar a briga acirrada que outros candidatos como Mulan e A Voz Suprema do Blues trazem à mesa, enriquecendo assim a categoria.
A questão é que mesmo não sendo uma das partes mais esperadas da noite, com exceção de edições pontuais, a celebração de melhor figurino tem um importante efeito de reconhecimento sobre uma das mais antigas ferramentas narrativas que um cineasta dispõe para contar suas histórias. Dessa maneira os trajes usados pelo elenco, e aqui ressalta-se que não é obrigatório ser um filme de época, são uma forma muito pessoal com que cada personagem presente pode exteriorizar quem ele é de fato sem recorrer à palavras.
Em Costume Design: Defining Character, guia de professor desenvolvido pela Academia do Oscar em parceria com Deborah Nadoolman Landis, é apontado desde cedo para a importância narrativa que compete a esse departamento e como ele serve ao filme de maneira discreta mas essencial.
“Todo vestuário usado em um filme é considerado um figurino. Figurinos são uma das muitas ferramentas que o diretor possui para contar uma história. Figurinos comunicam os detalhes da personalidade de um personagem à audiência, e ajuda os atores a se transformarem nesse novo indivíduo em tela”.
Com isso em mente, o momento de confecção dos figurinos precisa caminhar em concordância com diversos outros departamentos, a começar com o roteiro ainda em sua fase de estudo. É imperativo que o figurinista compreenda o roteiro da obra, principalmente no que consta a detalhes da narrativa, tanto geral quanto específica. Para isso é necessário que a visão esteja alinhada com a proposta do diretor não só sobre a história unicamente mas também à escalação de elenco, paleta de cores a serem usadas pelo diretor de fotografia e até composição de iluminação de cada cena.
A atenção aos detalhes da composição visual geralmente costuma caracterizar as grandes obras históricas e por consequência seus cineastas. Stanley Kubrick, saudado como um dos grandes gênios do cinema, foi famoso pela obsessão relacionada às pesquisas sempre que seus filmes ainda estavam na fase de pré-produção. Dessa forma, produções de época como Barry Lyndon, futuristas como 2001 – Uma Odisseia no Espaço e até de seus filmes que nunca chegaram a nascer como Napoleão envolveram um largo estudo histórico.
Essa, aliás, é uma etapa imperativa da pré-produção dos figurinos segundo a colocação de Deborah Landis. Uma vez que os pontos de vista são alinhados é necessário realizar um processo de pesquisa envolvendo diversas fontes e até locomoção presencial da equipe para determinados locais. Após essa fase entra a caracterização individual de cada personagem onde seu vestuário dialoga tanto com a composição daquele indivíduo quanto pela situação em que a trama se encontra.
Com isso ao longo do filme o figurino tende a mostrar como o personagem foi de um “ponto A” no início para um “ponto B” ao final. La La Land possui um trabalho estético que se enquadra muito nessa situação, principalmente no figurino da personagem de Emma Stone que vai variando conforme as estações do ano ao longo da trama assim o fazem; dessa maneira criando uma sensação de que a personagem não só foi mudando na passagem de tempo mas também que a própria escolha de se usar uma estrutura de estações dialoga com um elemento tão visual quanto o vestuário.
Já sobre como a roupa é importante para identificar cada personagem, principalmente em um elenco múltiplo, pode ser visto em Clube dos Cinco. No clássico de John Hughes cada um dos jovens presentes na detenção tem um tipo de roupa que, em termos de cor, o destaca como indivíduo além de que elas têm uma função de identificação na hierarquia da própria escola. O astro do esporte utiliza trajes adequados a essa posição, a menina popular à ela, o valentão à ele e por aí vai.
Essa exposição não verbal consequentemente casa com o que o roteiro vai estabelecendo com os diálogos e, além de evitar uma possível repetição, passa para o público a sensação de credibilidade e realidade para aquele leque de indivíduos fictícios. No mesmo artigo já mencionado é enfatizada a questão da cor como elemento de identificação em figurinos e tem-se o exemplo dado sobre o trabalho em Maria Antonieta.
“A diretora Sofia Coppola achou que uma paleta de cor pastel inspirada nos doces franceses seria mais apelativo para uma jovem audiência feminina, logo a designer Milena Canonero criou vestidos cor de sorvete. Esses vestidos possuem a silhueta adequada ao período, porém suas cores não se assemelhavam às das vestimentas da corte de Maria Antonieta preservadas nos museus”.
Por fim, as roupas são um elemento a sempre prestar atenção em qualquer filme. Daqueles que visivelmente querem que o público repare nesse elemento, àqueles tem um vestuário mais discreto todo filme concentra um enorme esforço de produção nessa área e ela, assim como na fotografia ou roteiro, tem sua própria história para contar.