O inimigo público número 1 da indústria do cinema, também conhecido como o “Anti-Oscar”, o “prêmio” Framboesa de Ouro segue incomodando muita gente, e fazendo outros tantos darem boas risadas. A cerimônia é uma grande brincadeira com filmes que foram execrados pela crítica, que grande parte do público torceu o nariz, mas que ninguém tem coragem de gritar aos quatro ventos o quão desagradáveis foram. Bem, não tinha. Numa época em que o politicamente correto impera, quem sabe algum dia o Framboesa de Ouro possa vir a ser extinto. Mas enquanto isso, continuamos celebrando estes filmes ruins que todos nós adoramos.
É claro que como toda premiação que se preze, o Framboesa de Ouro já errou muito, e terminou indicado filmes bons de verdade. Ah, a ironia das coisas. Na maioria das vezes, acerta em cheio ao lembrar-nos de produções que nem as mães dos envolvidos teriam coragem de defender, vide A Reconquista (2000), com John Travolta, e Mulher-Gato (2004), com Halle Berry. Os indicados deste ano já foram revelados, mas enquanto o prêmio para eles não sai – em geral ocorrem na véspera do Oscar – propomos algo diferente. O Framboesa está firme e forte até hoje, tendo iniciado seus trabalhos em 1981, bem a tempo para indicar a primeira leva de filmes dos anos 80. E a brincadeira não poderia ter começado em outra época, senão a fanfarrona década de 80.
Aqui, porém, iremos pular alguns anos no futuro do Framboesa de Ouro, para relembrar com você quais os filmes que completam 20 anos em 2022 estiveram indicados ou venceram o prêmio. Você lembra de todos? Confira abaixo.
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Destino Insólito
O filme responsável pela separação na vida real da rainha da música pop Madonna e do cineasta Guy Ritchie, este pseudo romance é na realidade um remake de uma prestigiada produção italiana intitulada Por um Destino Insólito, de 1974. A versão original foi escrita e dirigida pela primeira mulher a ser indicada na categoria de direção na história do Oscar: Lina Wertmüller (nomeada por Pasqualino Sete Belezas). A ideia por trás do filme é um interessante estudo da natureza humana e de classes sociais – com uma forte tonalidade política. Na trama, uma dondoca soberba menospreza um de seus funcionários numa viagem de iate pelo Mediterrâneo. Após um acidente, os dois vão parar no mar, encontrando abrigo num bote e depois numa ilha deserta, onde a hierarquia social já não importa mais e ocorrerá uma mudança de poder quando o sujeito assume o controle. A ideia é interessante e inspirou a comédia americana de 1987 Um Salto para a Felicidade, com Goldie Hawn e Kurt Russell.
Já no início dos anos 2000, outro casal da vida real (Madonna e Ritchie) resolveu dar a sua visão daquela história, porém, com resultados desastrosos – sendo considerado um dos piores filmes da década, e quem sabe de todos os tempos. E sim, existem produções capazes de afetar a vida pessoal de seus envolvidos. Destino Insólito levou o Framboesa de pior filme há 20 anos, e também o de pior atriz para Madonna, pior diretor (Ritchie), pior remake ou sequência e pior casal em tela (com a material girl fazendo par com o italiano Adriano Giannini). Além disso foi indicado também para pior ator (Giannini) e pior roteiro (para Ritchie). No ano de 2005, voltaria a ser indicado como pior drama, nos 25 anos de existência do Framboesa. E de novo em 2010, com indicações a pior filme da década e pior atriz da década para Madonna. Depois disso, a icônica intérprete nunca mais voltou a dar o ar da graça nas telonas. Deu para sentir o drama?
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Crossroads – Amigas para Sempre
Mas a musa Madonna não era a única estrela da música pop a se aventurar pelo cinema e dar com os burros n’água há 20 anos. Enquanto Madonna, a esta altura, era uma veterana das telonas (tendo participado de 18 filmes – entre papeis pequenos de coadjuvante e como atriz principal), Britney Spears, uma protegida sua, debutava sua primeira produção. E bem, devemos dizer, única igualmente. O resultado do veículo da jovem estrela da música no cinema foi tão negativo, que jogou água nos planos de uma transição entre as duas mídias para Spears. A cantora explodiu no cenário pop mundial em 1998, após o clipe da música “Baby, One More Time”, e talvez ela tenha esperado demais para estrelar sua primeira produção cinematográfica – ou talvez estivesse ocupada demais com a carreira musical.
Foram quatro anos desde seu surgimento meteórico até sua estreia no cinema, e o filme escolhido para mostrar Britney nas telonas foi Crossroads (aqui no Brasil ganhando o subtítulo Amigas para Sempre), drama adolescente com produção da MTV Films, é claro. Curiosamente, este road movie até tem talento atrás das câmeras, como o roteiro de Shonda Rhimes (Grey’s Anatomy, Scandal, Inventando Anna e Bridgerton) e direção de Tamra Davis (de séries como Empire, Disque Amiga para Matar, The Politician e Stargirl). Nada disso adiantou muito, Crossroads foi indicado para pior filme, pior direção, roteiro, canção original (“Overprotected”), pior casal (Spears e Anson Mount) e pior filme mirado ao público adolescente. Além, claro, de levar os Framboesa de pior atriz para Britney Spears (que dividiu o prêmio com sua mentora Madonna) e pior canção original para “I’m not a girl, not yet a Woman”.
Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones
Sejamos justos, desta lista dos piores filmes no Framboesa de Ouro de 20 anos atrás, este é o melhor entre os indicados (espere para ver o que vem abaixo). A trilogia prequel que George Lucas orquestrou para dar continuidade à franquia mais famosa do cinema possui uma relação de amor e ódio com seus fãs. Na época de seu lançamento foram verdadeiros filmes-evento, que colocaram novamente o nome Star Wars no topo da cultura popular e no consciente coletivo dos espectadores. Também pudera, o único vestígio de Star Wars antes disso havia ficado lá atrás, no início dos anos 80. Porém, bastou parte destes mesmos fãs que haviam comprado a ideia da nova trilogia, focada em Anakin desta vez, crescerem, a poeira baixar e os anos passarem para todos perceberem que os novos filmes de Star Wars não eram, por assim dizer… muito bons.
Existem aqueles que conseguiram perceber logo em seu ano de lançamento. Na época, os críticos mais experientes enalteciam as novas conquistas técnicas de Lucas no que diz respeito aos efeitos especiais e à criação de mundo, porém, apontavam também a falta de um roteiro com bom desenvolvimento de personagem e diálogos para acompanhar o maravilhoso visual. Quem também não comprou a ideia das prequels foi o Framboesa de Ouro, que já havia indicado A Ameaça Fantasma para 7 “prêmios”, incluindo pior filme, diretor e roteiro. Aqui, como esperado, a “homenagem” voltou a ocorrer com as nomeações a pior filme, diretor (Lucas), atriz coadjuvante (Natalie Portman), pior casal (Portman e Hayden Christensen) e pior remake ou sequência. O segundo Star Wars levou os Framboesas de pior ator coadjuvante para Hayden Christensen e pior roteiro.
Pluto Nash
Ainda no terreno das aventuras de ficção científica passadas no espaço, muitos anos no futuro, temos este que é considerado um dos pontos baixos na carreira do astro Eddie Murphy. Superprodução da Warner, esta comédia de alto conceito usou um orçamento inacreditável de US$100 milhões na época – para termos uma ideia é o mesmo valor das maiores produções da atualidade. O filme passou por refilmagens e problemas em seus bastidores, e antes mesmo de estrear já dava dor de cabeça aos envolvidos. Escrito por Neil Cuthbert (de Abracadabra, 1993) e dirigido por Ron Underwood (Ataque dos Vermes Malditos, 1990), Pluto Nash é uma espécie de Casablanca (1942) espacial, com Murphy interpretando o dono de uma casa noturna, precisando ajudar uma mulher numa trama que envolve mafiosos, robôs, naves espaciais e todo tipo de tecnologia futurista.
O longa ficou engavetado por dois anos até finalmente estrear, com o astro Murphy se negando a promover o filme, e clamando ter aceitado protagonizar apenas pelo dinheiro. E por falar em dinheiro, Pluto Nash entrou para a história não apenas como um dos piores filmes de todos os tempos, mas também um dos mais caros e que mais prejuízo deu a um estúdio, recuperando míseros US$4 milhões de seu orçamento citado de US$100 milhões. Esse era mais um baque sentido na carreira de Murphy. Como resultado, Pluto Nash recebeu indicações para pior filme do ano no Framboesa, pior ator para Murphy, pior diretor, pior roteiro e pior dupla (com Murphy e seu clone no filme). Curiosamente, Pluto Nash não levou nenhum Framboesa na época, mas não sairia totalmente ileso, porque em 2005 seria indicado como a pior comédia dos 25 anos do prêmio, e em 2010, Murphy levaria como o pior ator da década, num total de 12 indicações, incluindo por este filme.
Pinóquio
Esse ano, teremos uma verdadeira invasão de Pinóquios para assistirmos, seja nas telonas ou nas telinhas. O mexicano Guillermo del Toro lançará com a Netflix uma animação dona de um visual diferente, enquanto a Disney escalou Tom Hanks como Geppetto para sua versão em live-action da animação clássica da década de 1940. Mas uma versão que talvez nem todos conheçam, e que foi rapidamente varrida para debaixo dos tapetes, é esta superprodução italiana bancada pelo ator Robert Benigni. Após o estrondoso sucesso mundial de A Vida é Bela (1998), emplacando até mesmo em Hollywood e no Oscar, Benigni estava no topo do mundo e era um dos realizadores mais requisitados. Novamente em parceria com a Miramax, Benigni deixou seu ego falar mais alto e resolveu criar sua própria versão do clássico italiano de Carlo Collodi, Pinóquio (ou Pinocchio, no original).
Assim como havia feito no drama cômico sobre a Segunda Guerra Mundial, o ator escreveu, dirigiu e…, de forma bem inusitada, protagonizou como o menino de madeira, no auge de seus 50 anos. Ver Benigni como um Pinóquio adulto e diminuto se passando por um menino, e que de madeira não tinha nada, pode ter sido uma imagem muito perturbadora para muitos. E o filme levou um chá de sumiço rapidinho. Em 2019, o conterrâneo cineasta Matteo Garrone resolveu prestar uma homenagem em sua versão de Pinóquio, escalando Benigni, desta vez corretamente como Geppetto. A versão de Benigni para Pinóquio foi indicado para pior filme no Framboesa, pior diretor, pior roteiro, pior casal (Benigni e sua esposa Nicoletta Braschi) e pior remake ou sequência. O filme terminou levando o Framboesa de pior ator para Benigni, que dividiu o prêmio com seu dublador na versão americana, o ator Breckin Meyer.
OUTRAS INDICAÇÕES
Assim como costuma fazer com Sylvester Stallone, o Framboesa de Ouro não aliviou para Eddie Murphy, constantemente “pegando no pé” do astro. Também pudera, esta era a fase em que o comediante entregou produções que nem mesmo ele sente muito orgulho. Assim, além de indica-lo como pior ator por Pluto Nash, Murphy também estava indicado por Sou Espião (adaptação de um seriado dos anos 60) – também indicado na categoria de pior remake ou sequência – e Showtime, no qual atuou ao lado de Robert De Niro. Outro ator “perseguido” pela qualidade de seus filmes é o humorista Adam Sandler, que vira e mexe até entrega filmes bons, como o recente Joias Brutas (2019). Aqui, porém, Sandler era indicado como pior ator por A Herança de Mr. Deeds (remake de O Galante Mr. Deeds, de 1936) e pela animação de baixo calão Oito Noites de Loucura. Fechando a lista dos atores, Steven Seagal não poderia ficar de fora, sendo indicado por No Corredor da Morte.
Dentre as atrizes indicadas, além das “cantrizes” Maddona e Britney Spears, sobraram indicações também para as estrelas Jennifer Lopez (igualmente uma diva da música pop), Angelina Jolie e Winona Ryder. A última foi nomeada pelo citado filme de Adam Sandler, A Herança de Mr. Deeds, enquanto a vencedora do Oscar Jolie não saiu ilesa do que é provavelmente o pior filme de sua carreira: Uma Vida em Sete Dias – você conhece essa pérola? Já J-Lo, não se contentaria apenas com uma indicação, e seria lembrada no Framboesa por dois filmes naquela noite: o romance Encontro de Amor, no qual vive um conto de Cinderela como uma empregada se apaixonando por um político, e o thriller Nunca Mais, em que vive uma mulher vítima de abuso doméstico do marido, que aprende a lutar para surrar o traste, devolvendo na mesma moeda.
Ainda sobraram indicações de piores coadjuvantes para Freddie Prinze Jr. por Scooby Doo, Laura Flynn Boyle por Homens de Preto 2, Christopher Walken por Beary e os Ursos Caipiras, Rebecca Romijn por Rollerball, Tom Green por Promessa é Dívida, Bo Derek por Mestre do Disfarce (não sei como este não obteve mais indicações), o saudoso Robin Williams por Morra, Smoochy, Morra e a vitória de Madonna também na categoria coadjuvante por 007 – Um Novo Dia para Morrer, em que aparece no esquema de piscou perdeu como a instrutora de esgrima de James Bond. Madonna também concorria na categoria de pior canção, pela música tema do filme, “Die Another Day”. Já a categoria de pior filme mirado ao público adolescente, que viu as indicações de Scooby Doo e Triplo X, além dos citados Crossroads e Oito Noite de Loucuras, “premiou” Jackass – O Filme, com as artimanhas sem noção de Johnny Knoxville e sua trupe de desajustados.