domingo , 22 dezembro , 2024

O Cinema Noir e Relíquia Macabra, seu maior exemplar

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Maneirismos dos filmes noir foram consolidados no filme Relíquia Macabra de John Huston

Cada gênero possui uma identidade bem definida, seja ela narrativa ou estética. Essas características tão facilmente discerníveis foram frutos de décadas de diferentes obras que compuseram tal estilo. Porém, no caso do gênero noir, ocorreu um raro exemplo de uma única produção que estabeleceu todas as características que viriam a figurar em produções derivadas nos anos posteriores. Isso de uma só vez.



É válido fazer uma breve abordagem sobre o noir em si. Popularmente conhecido como “filmes de detetive”, as obras noir tem sua origem identificada no expressionismo alemão que estava em alta nos anos 20 e 30 quando idealizadores como Fritz Lang e F. W. Murnau inovaram no uso estético de luz e sombra, além de apresentarem tramas verdadeiramente intrincadas.

Com a ascensão do nazismo e o redirecionamento do cinema nacional para fins propagandísticos, bem como o início da perseguição de judeus, vários realizadores acabaram por migrar da Alemanha para os Estados Unidos. Dessa maneira eles trouxeram consigo a bagagem estética desenvolvida no expressionismo para então ser aplicada em Hollywood, que até aquele momento não demonstrava algo nem próximo dos visuais de obras alemães.

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A estética de Lang inspirou os filmes noir.

Na matéria A Very Brief History of Film Noir a autora Marnie Sehayek aponta para as contribuições que os diretores exilados trouxeram para Hollywood. “Os diretores utilizaram a fotografia intensa que predominantemente apresentava uma iluminação clara e direta com sombra em cascata, ângulos de câmera desequilibrados, e composições assimétricas para enfatizar narrativas assustadoras ou sórdidas destinadas à emocionar e intrigar”.

Desse intercâmbio nasceu, em 1940, o filme O Homem dos Olhos Esbugalhados; produção estrelada por Peter Lorre (ator austríaco que foi exilado por sua ascendência judia) com fotografia de Nicholas Mussuraca, nome que ficaria muito associado a esse estilo nos anos 40 e 50. Ainda assim, tal produção geralmente não é considerada como o primeiro noir por não ter estabelecido o gênero ou entregue elementos que seriam característicos dele para a posteridade.

Somente no ano seguinte que John Huston, em seu primeiro trabalho como diretor, entregaria Relíquia Macabra (1941), estabelecendo assim precedentes que tornaram o filme para muitos o marco zero do gênero noir. Na trama o detetive particular Sam Spade é contratado por uma mulher para localizar sua irmã na cidade de São Francisco que, não só fugiu sem aviso, como está acompanhada de um homem potencialmente perigoso. As coisas não acontecem como o esperado para o detetive e antes que ele se dê conta uma teia de intrigas se formou à sua volta.

O jogo de luz e sombra em “Relíquia Macabra” é herança do expressionismo alemão.

Logo de início o filme já estabelece identidades que culturalmente se tornaram ligados a esse tipo de história: um detetive particular em seu escritório que recebe uma cliente misteriosa; uma femme fatale que inspira desconfiança, uma galeria de vilões que serve como obstáculos ao protagonista e um assassinato que dá início a tudo.

Para John Huston era imperativo que seu filme fosse o mais fiel possível ao livro de Dashiel Hammett e como resultado a versão final foi um produto com pouquíssimas alterações que durante a produção se uniram a um visual fortemente inspirado no mencionado movimento alemão, principalmente pela fotografia de Arthur Edeson cujos trabalhos anteriores (principalmente Frankenstein de 1931) já brincavam com o uso de sombras realçadas e ambientes escuros dos filmes alemães.

Segundo Philip Kemp na obra Tudo Sobre Cinema as obras noir foram um importante contraponto em Hollywood, uma vez que à época que Relíquia Macabra foi lançado os filmes mais populares eram os musicais (que por sua vez tiveram sua ascensão no período da Grande Depressão como uma poderosa distração da realidade) sempre muito otimistas. Os filmes noir, por sua vez apresentavam um outro olhar, de uma sociedade perigosa e aonde ninguém era confiável ou estava seguro.

O cartaz do clássico noir Relíquia Macabra (1941), um dos maiores exemplares do gênero.

Ainda de acordo com ele, o filme de Huston já realizava algumas observações sobre a instabilidade da Europa quando os EUA ainda mantinham uma postura de neutralidade em relação a um conflito classificado por eles como puramente europeu. “John Huston dirigiu Relíquia Macabra antes de os Estados Unidos entrarem na guerra; mesmo assim é possível perceber, oculta sob a caracterização tradicional do detetive particular, certa apreensão em relação aos acontecimentos na Europa.”

A boa recepção da obra lhe valeu indicações importantes no Oscar de 1942, principalmente na categoria de Melhor Filme. Depois dele vários outros títulos do noir tomariam de assalto o cinema da década de 40 principalmente, a maior parte deles adaptações de romances policiais. Dentre os “herdeiros” vale destacar nomes como Os Assassinos (que teve uma participação não creditada do já mencionado John Huston na escrita do roteiro), A Sombra de uma Dúvida de Hitchcock e Chinatown de Polanski (em 1974 tido como o último filme do movimento noir e que incorpora todos os elementos apresentados em Relíquia Macabra).

 

  

 

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Maneirismos dos filmes noir foram consolidados no filme Relíquia Macabra de John Huston

Cada gênero possui uma identidade bem definida, seja ela narrativa ou estética. Essas características tão facilmente discerníveis foram frutos de décadas de diferentes obras que compuseram tal estilo. Porém, no caso do gênero noir, ocorreu um raro exemplo de uma única produção que estabeleceu todas as características que viriam a figurar em produções derivadas nos anos posteriores. Isso de uma só vez.

É válido fazer uma breve abordagem sobre o noir em si. Popularmente conhecido como “filmes de detetive”, as obras noir tem sua origem identificada no expressionismo alemão que estava em alta nos anos 20 e 30 quando idealizadores como Fritz Lang e F. W. Murnau inovaram no uso estético de luz e sombra, além de apresentarem tramas verdadeiramente intrincadas.

Com a ascensão do nazismo e o redirecionamento do cinema nacional para fins propagandísticos, bem como o início da perseguição de judeus, vários realizadores acabaram por migrar da Alemanha para os Estados Unidos. Dessa maneira eles trouxeram consigo a bagagem estética desenvolvida no expressionismo para então ser aplicada em Hollywood, que até aquele momento não demonstrava algo nem próximo dos visuais de obras alemães.

A estética de Lang inspirou os filmes noir.

Na matéria A Very Brief History of Film Noir a autora Marnie Sehayek aponta para as contribuições que os diretores exilados trouxeram para Hollywood. “Os diretores utilizaram a fotografia intensa que predominantemente apresentava uma iluminação clara e direta com sombra em cascata, ângulos de câmera desequilibrados, e composições assimétricas para enfatizar narrativas assustadoras ou sórdidas destinadas à emocionar e intrigar”.

Desse intercâmbio nasceu, em 1940, o filme O Homem dos Olhos Esbugalhados; produção estrelada por Peter Lorre (ator austríaco que foi exilado por sua ascendência judia) com fotografia de Nicholas Mussuraca, nome que ficaria muito associado a esse estilo nos anos 40 e 50. Ainda assim, tal produção geralmente não é considerada como o primeiro noir por não ter estabelecido o gênero ou entregue elementos que seriam característicos dele para a posteridade.

Somente no ano seguinte que John Huston, em seu primeiro trabalho como diretor, entregaria Relíquia Macabra (1941), estabelecendo assim precedentes que tornaram o filme para muitos o marco zero do gênero noir. Na trama o detetive particular Sam Spade é contratado por uma mulher para localizar sua irmã na cidade de São Francisco que, não só fugiu sem aviso, como está acompanhada de um homem potencialmente perigoso. As coisas não acontecem como o esperado para o detetive e antes que ele se dê conta uma teia de intrigas se formou à sua volta.

O jogo de luz e sombra em “Relíquia Macabra” é herança do expressionismo alemão.

Logo de início o filme já estabelece identidades que culturalmente se tornaram ligados a esse tipo de história: um detetive particular em seu escritório que recebe uma cliente misteriosa; uma femme fatale que inspira desconfiança, uma galeria de vilões que serve como obstáculos ao protagonista e um assassinato que dá início a tudo.

Para John Huston era imperativo que seu filme fosse o mais fiel possível ao livro de Dashiel Hammett e como resultado a versão final foi um produto com pouquíssimas alterações que durante a produção se uniram a um visual fortemente inspirado no mencionado movimento alemão, principalmente pela fotografia de Arthur Edeson cujos trabalhos anteriores (principalmente Frankenstein de 1931) já brincavam com o uso de sombras realçadas e ambientes escuros dos filmes alemães.

Segundo Philip Kemp na obra Tudo Sobre Cinema as obras noir foram um importante contraponto em Hollywood, uma vez que à época que Relíquia Macabra foi lançado os filmes mais populares eram os musicais (que por sua vez tiveram sua ascensão no período da Grande Depressão como uma poderosa distração da realidade) sempre muito otimistas. Os filmes noir, por sua vez apresentavam um outro olhar, de uma sociedade perigosa e aonde ninguém era confiável ou estava seguro.

O cartaz do clássico noir Relíquia Macabra (1941), um dos maiores exemplares do gênero.

Ainda de acordo com ele, o filme de Huston já realizava algumas observações sobre a instabilidade da Europa quando os EUA ainda mantinham uma postura de neutralidade em relação a um conflito classificado por eles como puramente europeu. “John Huston dirigiu Relíquia Macabra antes de os Estados Unidos entrarem na guerra; mesmo assim é possível perceber, oculta sob a caracterização tradicional do detetive particular, certa apreensão em relação aos acontecimentos na Europa.”

A boa recepção da obra lhe valeu indicações importantes no Oscar de 1942, principalmente na categoria de Melhor Filme. Depois dele vários outros títulos do noir tomariam de assalto o cinema da década de 40 principalmente, a maior parte deles adaptações de romances policiais. Dentre os “herdeiros” vale destacar nomes como Os Assassinos (que teve uma participação não creditada do já mencionado John Huston na escrita do roteiro), A Sombra de uma Dúvida de Hitchcock e Chinatown de Polanski (em 1974 tido como o último filme do movimento noir e que incorpora todos os elementos apresentados em Relíquia Macabra).

 

  

 

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