A história do Oscar, os prêmios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA, é repleta de curiosidades e fatos interessantes. Com o anúncio dos indicados para a cerimônia deste ano, que ocorre no dia 27 de março, um novo seleto grupo de artistas se une a este verdadeiro panteão, prontos para se tornarem as próximas lendas do cinema. Aqui, em nossa nova matéria, ainda na vibe do Oscar, resolvemos trazer para você um fato histórico e de certa forma inusitado, que só ocorreu doze vezes em mais de 90 anos da premiação – obviamente servindo de grande honraria a este clube bem exclusivo de atores e atrizes. É raro, mas já aconteceu. Ao longo destes mais de 90 anos, apenas doze atores e atrizes foram nomeados para as categorias de atuação principal e coadjuvante no mesmo ano. Alguns saíram vitoriosos de uma delas (embora ninguém tenha levado de uma tacada só as duas), e outros saíram de mãos vazias das duas – o que parece ser mais comum. Assim, confira abaixo todos os agraciados com este feito curioso e que nem mesmo monstros sagrados como a recordista Meryl Streep possuem em seu currículo. Confira e comente.
Fay Bainter
A primeira artista a ser agraciada com tamanha honraria em duas categorias de atuação de uma vez só foi uma mulher, e não um homem como muitos possam imaginar. Foi em 1938, na décima primeira edição do Oscar. Fay Bainter, logo em sua primeira participação no Oscar recebia não uma, mas duas indicações: como atriz principal pelo drama Novos Horizontes, onde interpreta Hannah, uma mulher sem teto sendo abrigada por uma família; e como coadjuvante pelo romance Jezebel, protagonizado pela estrela Bette Davis. Bainter saiu vitoriosa da segunda nomeação, e ainda receberia uma terceira indicação anos mais tarde, em 1962 por Infâmia, drama lésbico estrelado por Audrey Hepburn e Shirley MacLaine. O último trabalho de Fay Bainter foi na série de Alfred Hitchcock, em 1965. Ela faleceu em 1968.
Teresa Wright
Quatro anos depois e… surpresa, outra mulher quebrava mais uma vez o recorde. Hollywood foi realmente construída pelas mulheres. Ao contrário de Bainter, que estreou no Oscar logo com duas nomeações (saindo vitoriosa de uma delas), Teresa Wright já havia sido indicada quando foi surpreendida pela nomeação dupla. Sua primeira lembrança ocorreu como coadjuvante em Pérfida, de 1942, protagonizado por Bette Davis (olha ela de novo aqui). A nomeação dupla acontecia logo no ano seguinte, em 1943. Como atriz principal, Wright foi indicada por Ídolo, Amante e Herói, biografia sobre o esportista Lou Gehrig; mas a vitória igualmente sairia na categoria de coadjuvante por Rosa da Esperança, drama sobre uma família tentando sobreviver ao início da Segunda Guerra Mundial. O último filme de Teresa Wright foi O Homem que Fazia Chover (1997), de Francis Ford Coppola. Ela faleceu em 2005.
Barry Fitzgerald
Primeiro homem a quebrar tal recorde de duas indicações no mesmo ano, e já tínhamos um caso polêmico. Acontece que o ator, que realmente só teve estas duas indicações em sua carreira, foi lembrado em 1945 nas categorias de ator principal e coadjuvante… pelo mesmo filme!? Trata-se da comédia musical O Bom Pastor, em que interpreta um velho padre rabugento, esnobando a chegada do novo clérigo da cidadezinha, o jovem padre vivido pelo icônico Bing Crosby. Por alguma confusão dos votantes membros da Academia, Fitzgerald terminou nomeado como ator principal e coadjuvante pelo mesmo papel, e saiu vitorioso como coadjuvante. Sabe aquela história das manobras dos estúdios para ampliar as possibilidades de indicações? Aqui, ao menos, após a confusão as regras da Academia mudaram e casos assim não podem mais ocorrer.
Jessica Lange
É interessante pensar que talvez a polêmica citada acima tenha deixado a Academia com medo de indicar o mesmo ator nas duas categorias no mesmo ano por um bom tempo. Assim durante as décadas de 1950, 1960 e 1970 o fato não voltaria a ocorrer. Com as regras mudadas, dali em diante sempre que um ator fosse nomeado no mesmo ano para atuação principal e coadjuvante não seria pelo mesmo papel. O caso só voltaria a ocorrer nos anos 80, em 1983 para ser mais preciso, e coroaria uma grande intérprete ainda em atividade: o monstro sagrado (e por vezes subestimado) Jessica Lange. Logo em sua primeira lembrança da Academia, a veterana recebia indicação dupla. E novamente a dobradinha era a mesma, deixava escapar o prêmio na categoria principal – por Frances, biografia da polêmica atriz Frances Farmer – para vencer o prêmio de coadjuvante por Tootsie – comédia em que Dustin Hoffman se veste de mulher para emplacar na carreira de ator. Lange ainda voltaria aos holofotes do Oscar mais quatro vezes, com indicações por Minha Terra, Minha Vida (1985), Um Sonho, Uma Lenda (1986), Muito Mais que um Crime (1990), até sua segunda vitória, desta vez como protagonista por Céu Azul (1995).
Sigourney Weaver
O jejum das indicações duplas parecia realmente ter chegado ao fim. Dormente por três décadas, os anos 80 mostravam não uma atriz, mas duas lembradas para tal honraria. Jessica Lange abria a década no início dos anos 80, e no final era Sigourney Weaver a agraciada. Ao contrário de todos os artistas que haviam conquistado tal feito, no entanto, Weaver foi a primeira a sair de mãos abanando de sua nomeação dupla. Weaver foi duplamente indicada em 1989, mas dois anos antes, em 1987, já havia recebido nomeação de atriz principal por Aliens – O Resgate. Sua dobradinha ocorreu com Nas Montanhas dos Gorilas (atriz principal), biografia de Dian Fossey, e a comédia yuppie Uma Secretária de Futuro (coadjuvante).
Al Pacino
No início dos anos 90, tínhamos o segundo homem da história a conquistar tal feito, e o primeiro a ser indicado duplamente por filmes diferentes. Um verdadeiro ícone da sétima arte, Al Pacino já tinha nada menos que 6 indicações ao Oscar (e nenhuma vitória) antes de sua nomeação dupla em 1993. O fato fazia do ator um dos maiores injustiçados pela Academia da história. Mas eis que enfim o grande ator era redimido. Pacino sairia vencedor como ator principal de Perfume de Mulher, um dos dramas mais queridos de todos os tempos. No mesmo ano, ele ainda tinha uma segunda nomeação para chamar de sua, como coadjuvante por O Sucesso a Qualquer Preço. Pacino ainda viria a ser indicado novamente em 2020 por O Irlandês.
Emma Thompson
Aqui temos um caso novo e ainda mais curioso. Afinal, novos recordes precisam ser quebrados. A edição de 1994 do Oscar teve não uma, mas duas indicações duplas de suas atrizes. Assim, ao invés de dez atrizes indicadas, tivemos apenas oito – afinal, duas ocupavam duas vagas. A primeira, a consagrada veterana Emma Thompson, vista ano passado em Cruella, foi a “perdedora” da noite, seguindo de perto os passos de Sigourney Weaver. Com duas nomeações – melhor atriz por Vestígios do Dia e coadjuvante por Em Nome do Pai, Emma Thompson não levou nenhuma das estatuetas as quais concorria naquela noite. Thompson, no entanto, já havia ganhado no ano anterior como atriz principal por Retorno a Howards End e viria a ser indicada novamente como protagonista por Razão e Sensibilidade, em 1996.
Holly Hunter
No mesmo ano em que Emma Thompson era ignorada duplamente, outra veterana recebia duas indicações ao Oscar na mesma noite. Trata-se de Holly Hunter, a voz da Mulher Elástico nas animações Os Incríveis (2004 e 2018), da Disney. Voltando ao mesmo Oscar citado acima, Hunter foi a concorrente direta de Emma Thompson… em DUAS categorias! Ia ser curioso se cada uma delas levasse em uma das categorias. Mas enquanto Thompson saiu de mãos vazias, Holly Hunter abocanhou o prêmio na categoria principal por O Piano – de Jane Campion (indicada novamente este ano). Hunter ainda concorria como coadjuvante por A Firma, suspense com Tom Cruise. A atriz, no entanto, não era estranha ao prêmio, já tendo sido indicada anteriormente em 1988 por Nos Bastidores da Notícia (como protagonista), e voltaria a ser indicada como coadjuvante em 2004 por Aos Treze.
Julianne Moore
Agora finalmente deixamos os anos 1990 para trás e seguimos para os anos 2000. O curioso é que estas duas décadas são as que ainda guardam o recorde das indicações duplas para o mesmo ator – cada uma com um total de três. E abrimos o novo século com a nomeação dupla de uma das atrizes mais talentosas de sua geração: Julianne Moore. A primeira indicação da atriz saiu logo em 1998, como coadjuvante por Boogie Nights – Prazer Sem Limites, de Paul Thomas Anderson. Dois anos depois ela seria lembrada como atriz principal por Fim de Caso. A indicação dupla ocorreria em 2003, quando Moore era agraciada com as nomeações de protagonista, por Longe do Paraíso, e coadjuvante, por As Horas. Porém, Moore sairia de mãos abanando e só seria compensada de fato em 2015, com a vitória como protagonista de Para Sempre Alice, sua última nomeação até agora.
Jamie Foxx
Duplas indicações num mesmo ano é um recorde em que as mulheres dominam e dão um banho nos homens. Dos doze artistas indicados duas vezes de forma simultânea por atuações, apenas três deles são homens. Depois de Barry Fitzgerald (e sua polêmica indicação dupla) e Al Pacino, o talentoso (e por vezes subestimado) Jamie Foxx fecha o trio de atores agraciados pela Academia com o surpreendente feito. Foxx, que foi visto nos cinemas recentemente reprisando o papel do vilão Electro, em Homem-Aranha: Sem Volta para Casa, tem duas indicações ao Oscar – e ambas saíram no mesmo ano de 2005. A mais lembrada foi a que renderia o prêmio para o ator, como protagonista de Ray, biografia do músico Ray Charles. A segunda foi como coadjuvante pelo thriller Colateral, outro suspense protagonizado por Tom Cruise.
Cate Blanchett
Terminando a década de 2000, temos a indicação dupla de outra musa da sétima arte. A australiana Cate Blanchett está em cartaz atualmente com o indicado ao Oscar O Beco do Pesadelo, de Guillermo del Toro, mas voltando algumas décadas no passado, lá para o ano de 1999, iremos encontrar a revelação da atriz, logo com uma nomeação ao Oscar por Elizabeth. Em sua segunda indicação, agora como coadjuvante, por O Aviador (em 2005), Blanchett sairia vitoriosa com uma estatueta para chamar de sua. Depois disso, em 2007, uma nova indicação como coadjuvante, por Notas Sobre um Escândalo. Eis que em 2008, surge no currículo da atriz a tão falada indicação dupla ao Oscar: coadjuvante por Não Estou Lá (ao viver o músico Bob Dylan) e protagonista por Elizabeth – A Era de Ouro (fazendo a mesma personagem que a havia indicado pela primeira vez). Assim como outras antes dela, Blanchett sairia de mãos vazias da honraria dupla, mas o Oscar de atriz principal viria em 2014, com Blue Jasmine, de Woody Allen. Em 2016, sua última nomeação (até o momento), pelo drama lésbico Carol.
Scarlett Johansson
Até então, esta seleta lista de indicações duplas havia ficado dormente ao fim da década de 2000. Foram quase dez anos sem que um artista fosse indicado nas categorias de protagonista e coadjuvante no Oscar, até que uma jovem estrela de talento, que vinha sendo esnobada, foi agraciada com a mudança. Scarlett Johansson já havia protagonizado filmes em que a maioria dos cinéfilos e críticos acredita que ela tenha sido esnobada pela Academia, vide Encontros e Desencontros (2003), Match Point – Ponto Final (2005), Vicky Cristina Barcelona (2008) e ELA (2013). Até então, Johansson podia ser considerada uma das maiores injustiçadas pela Academia. Porém, a mudança chegou no Oscar 2020, quando a jovem estrela foi enaltecida logo em sua estreia com duas indicações: como atriz principal por História de um Casamento, e como coadjuvante pelo drama cômico de guerra Jojo Rabbit. As nomeações foram um grande prestígio, mas a atriz ainda não obteve uma estatueta para chamar de sua.