O astro Sylvester Stallone está vivenciando uma nova onda de popularidade em sua carreira atualmente, para a alegria de seus fãs. No auge de seus gloriosos 76 anos, o ator lançou este ano parcerias com plataformas como a Amazon Prime Video e a Paramount+, e viu as estreias de Samaritano (primeiro filme de super-herói estrelado por ele) e Tulsa King (primeira série que protagonizou). É claro que antes disso, Stallone já havia trazido Rambo e Rocky (através do derivado Creed) de volta ao trabalho, além de cair na mira de James Gunn para produções na Marvel (Guardiões da Galáxia – Vol. 2) e na DC (O Esquadrão Suicida).
Em breve, Sylvester Stallone voltará em Guardiões da Galáxia Vol. 3 e Os Mercenários 4 – grandes produções que prometem não deixar seu nome fora da mídia pelos próximos anos. No entanto, como a maioria dos fãs sabe bem, a trajetória do astro ao longo desses quase 50 anos de reconhecimento nem sempre foi fácil. Seu nome foi escrito nos anais após o sucesso estrondoso do primeiro Rocky – Um Lutador (1976), filme pelo qual Stallone lutou com unhas e dentes para fazer. O roteiro é seu, mas o estúdio não o queria como ator protagonizando. Stallone conseguiu eventualmente o que queria e o filme se tornou um verdadeiro marco da sétima arte – levando inclusive o Oscar de melhor produção de seu respectivo ano.
O que seria uma benção, se tornaria também uma “maldição” para Stallone, já que o ator ficaria marcado pelo papel do boxeador Rocky Balboa, não dando certo em outros projetos. Após o primeiro Rocky, ele emendaria com os dramas F.I.S.T. e A Taberna do Inferno, ambos de 1978, que se tornariam dois dos filmes mais obscuros em sua filmografia. Para não ter sua carreira interrompida logo de cara em seus “15 minutos de fama”, Stallone tirou da cartola Rocky II, em 1979, garantindo assim uma sobrevida nos holofotes. Mas a cada investida de tentar deslanchar fora dos ringues de boxe se mostrava em vão – e ele tentava de todas as formas. Após o segundo Rocky vieram o thriller policial Falcões da Noite (que vira série em breve, produzido pelo próprio Stallone) e o drama de Segunda Guerra e futebol Fuga para a Vitória (com Michael Caine e Pelé) – ambos de 1981; que nada fizeram pelo status dos envolvidos.
Mais uma vez a solução era se voltar para seu personagem mais famoso, Rocky, na terceira aventura do pugilista nas telas. Foi neste mesmo ano, porém, que Stallone finalmente acertaria em cheio na escolha de um projeto, que garantiria uma nova franquia para o astro e um segundo personagem icônico para chamar de seu: Rambo – Programado para Matar. Como tudo na carreira do ator, este filme não veio fácil para ele. Tudo nasceu do livro First Blood, escrito pelo professor de literatura da universidade de Iowa, David Morrell. A obra, um libelo antiguerra e suas consequências foi inspirado pelos relatos que Morrell ouvira de seus alunos ao retornarem da trágica Guerra do Vietnã. Assim o autor se sentiu compelido a escrever a história fictícia de um sujeito retornando para os EUA após anos no conflito, dono de transtornos psicológicos causados por suas experiências no país asiático, confundido com um andarilho vagabundo, hostilizado pelas autoridades locais (personificado pelo antagonista Xerife Teasle – papel mais marcante da carreira do ótimo Brian Dennehy), preso e abusado. O protagonista então foge e inicia sua guerra particular contra os policiais e a pequena cidade que se recusou em acolhê-lo.
A ideia por trás do livro de David Morrell é criticar a guerra e seus efeitos traumáticos em todos que a vivenciam. As principais diferenças entre o livro e o filme que de fato ganhamos, em primeiro lugar é transformar o longa num filme de ação. Segundo, a aparência do protagonista, desenhada na capa do livro – barbudo e cabeludo, muito mais semelhante a um hippie na época. Fora isso, a dissonância mais gritante é que no livri Rambo mata todos os policiais que buscam por ele, em suas armadilhas na floresta, causando uma verdadeira chacina. Tal ato não permitiria que o protagonista saísse vivo ao final de sua jornada – e assim, no desfecho mais deprimente da obra literária Rambo é morto pelo oficial que o treinou, o Coronel Sam Trautman.
Rambo- Programado para Matar (ou First Blood) seria produzido pela Columbia Pictures (hoje Sony), que comprou os direitos do livro publicado em 1972, mas o desenvolvimento passaria por uma verdadeira epopeia. Nomes quentes da época como Steve McQueen, Clint Eastwood, Robert De Niro, James Caan e até Paul Newman eram ventilados para viver o papel protagonista do veterano Rambo, e tantos outros cineastas renomados eram considerados para o posto de diretor. Mas a demora foi tanta por uma definição que os produtores por trás da extinta Carolco, Mario Kassar e Andrew Vajna, terminaram comprando os direitos da Columbia e fizeram a coisa andar mais rápido. Em pouco tempo definiram Sylvester Stallone como protagonista, que prontamente mexeu no roteiro e é creditado também como roteirista. Na direção, Ted Kotcheff, que depois viria a comandar no fim da década, a comédia cult Um Morto Muito Louco (1989).
Para o papel do mentor de Rambo, o Coronel Trautman, foram cogitados nomes como Gene Hackman, George C. Scott e Kirk Douglas. O primeiro, depois de fato faria um “clone” de Rambo logo no ano seguinte, com De Volta para o Inferno (Uncommon Valor). C. Scott era a escolha preferida do estúdio, tendo levado o Oscar nove anos antes por um papel semelhante em Patton – Rebelde ou Herói?; e Kirk Douglas chegou a ser contratado para o papel de Trautman, com cartazes do filme sendo produzidos com sua imagem como o personagem. No entanto, Douglas era favorável ao desfecho original, em que Rambo é morto no final. O astro de Spartacus chegou a dar um conselho para Stallone, dizendo que se o protagonista ficasse vivo no final, ele teria em mãos uma bela franquia em potencial. Douglas eventualmente faria o papel do pai de Stallone na comédia Oscar – Minha Filha quer Casar (1991).
O corte original de Rambo – Programado para Matar tinha algo perto de 3 horas de duração, e um ritmo bem mais lento. Ao perceber o possível desastre que teria em mãos, e que poderia arruinar sua carreira, Stallone ordenou que o estúdio entregasse as cópias para que ele pudesse queimá-las – história que o ator conta até hoje. Não foi preciso chegar até uma medida tão drástica. Tudo o que bastou foi uma imersão na sala de edição, e Ted Kotcheff conseguiria diminuir o tempo de projeção para 90 minutos. E sobre a questão da morte de Rambo, esta indecisão permeou os minutos finais das filmagens, com os dois desfechos sendo gravados – a cena da morte de Rambo pode ser encontrada em extras de DVDs e online na internet. No fim das contas, é dito que a decisão de manter o protagonista vivo não foi em razão financeira para gerar sequências, e sim para satisfazer o público, que não respondeu bem em exibições testes em relação a um final tão deprimente – afinal o espectador investe e torce pelo sujeito injustiçado.
Lançado no dia 22 e outubro de 1982 nos EUA, e chegando ao Brasil no ano seguinte, no dia 23 de maio, Rambo contou com um orçamento de US$15 milhões e viu o retorno de US$47 milhões somente nos EUA, e um total de US$125 milhões ao redor do mundo. O resultado financeiro garantiu um sucesso absoluto para o filme, que completa 40 anos em 2022 e é definitivamente um dos mais icônicos dos anos 80. No seu fim de semana de estreia, Rambo reinou absoluto em primeiro lugar das bilheterias, destronando as outras estreias da data, o terror Halloween III, o drama Monsenhor (com Christopher Reeve) e a comédia Jogando com a Vida (com Bette Midler).
Rambo, é claro, também geraria logo em 1985 a sua primeira continuação, maior em todos os sentidos, que transformaria o personagem de uma vez por todas em ícone da cultura pop. Rambo seria ainda um desenho animado, uma linha de bonecos para meninos, camisas, lancheiras, roupa de cama, jogos de videogame, geraria mais três continuações e no Brasil fez sucesso no concurso Rambo Brasileiro no programa Viva a Noite nos sábados do SBT, com o saudoso Gugu Liberato. Mas o principal feito de Rambo ainda é ter salvado a carreira de seu intérprete lhe dando novo fôlego.