quarta-feira , 26 fevereiro , 2025
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Smashed – De Volta a Realidade

VÍCIO FRENÉTICO

Talvez você não saiba muito bem quem é Mary Elizabeth Winstead, a bela atriz americana de 28 anos de idade. Pois bem, vamos refrescar a memória. O primeiro papel de destaque da atriz foi como protagonista no terror jovem Premonição 3 (2006), segunda continuação da franquia de sucesso. No ano seguinte, Winstead foi a filha de John McClane (Bruce Willis) em Duro de Matar 4.0 – papel que reprisou no quinto, e detestável, filme da franquia lançado esse ano. Ainda em 2007 trabalhou com ninguém menos do que Quentin Tarantino, em À Prova de Morte. Em 2010 foi Ramona Flowers, no excelente Cult Scott Pilgrim Contra o Mundo. Em 2011 e 2012 vieram bolas fora, em superproduções como O Enigma de Outro Mundo (espécie de refilmagem e pré-sequência do clássico de John Carpenter), e Abraham Lincoln – Caçador de Vampiros, no qual vivia Mary Todd Lincoln.

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Lembrados agora?  O fato é que apesar de todos esses trabalhos, a atriz ainda não havia entregado uma performance forte, que chamasse a atenção. Bem, até Smashed: De Volta a Realidade. Aqui, Winstead desempenha a melhor atuação de sua jovem carreira, impactante o suficiente para receber prêmios. Exibido no Festival do Rio 2012 (além de Sundance e Toronto), o filme chega agora ao mercado de vídeo no Brasil. Essa é uma obra devastadora, e uma das melhores produções americanas do cinema em 2012. No filme a atriz é Kate, uma jovem professora primária casada. Sua vida à primeira vida parece nos eixos. Mas é só olharmos mais de perto para percebermos as graves falhas. Kate e seu marido Charlie, papel de Aaron Paul (da série Breaking Bad), são jovens boêmios que celebram a vida de forma exagerada noite após noite.

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Até o momento que o fato começa a interferir em suas vidas. Kate, por exemplo, passa mal durante uma aula, e precisa mentir uma gravidez para não arriscar o emprego. Antes da bonança vem a tempestade, e a jovem chega a fundo do poço ao aderir ao crack, e passar uma noite na rua, literalmente na sarjeta. Winstead mostra toda a sua abrangência como atriz, em momentos inquietantes, num verdadeiro tour de force. A ajuda primeiramente precisa vir de nós mesmos, e a inteligente personagem percebe que é hora de recomeçar, mesmo sem o apoio do marido ou amigos. Smashed não é um filme fácil, ou de respostas imediatas. É uma obra muito significativa, que atinge e fala diretamente com toda uma geração. Afinal, quem nunca teve ou conheceu pessoas com tais problemas.

O ótimo elenco coadjuvante conta com Octavia Spencer (vencedora do Oscar por Histórias Cruzadas), Megan Mullally (da série Will & Grace), Nick Offerman (Família do Bagulho), Mary Kay Place (O Reencontro), Kyle Gallner (A Hora do Pesadelo), e a bela Mackenzie Davis (Breath In). O roteiro e a direção pertencem a James Ponsoldt, um nome para acompanharmos de perto, já que esse ano o cineasta entregou o elogiadíssimo The Spectacular Now.

Terror na Ilha

DOCE PESADELO

Exibido em festivais de cinema (como Sundance e Londres), Terror na Ilha é o segundo filme dirigido pela atriz, roteirista e cineasta independente Katie AseltonBlack Rock (Rocha Negra, em seu título original) foi igualmente criado pela diretora, com o roteiro desenvolvido por Mark Duplass, diretor e roteirista de filmes como Cyrus (2010) e Jeff e as Armações do Destino (2012), e ator de filmes como A Irmã da Sua Irmã (2012), Sem Segurança Nenhuma (2012) e A Hora Mais Escura (2012). Duplass é também o marido da diretora Aselton, e com ela forma uma dupla de talento do cinema indie americano.

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A trama criada pelo casal apresenta três amigas de infância, agora na casa dos 30 anos, com a missão de passar um fim de semana numa remota e pequena ilha na costa do Maine. O local tem pedigree, já que é onde se passam quase todas as histórias do escritor Stephen King, morador do estado. O primeiro problema é que Sarah, vivida por Kate Bosworth (a Lois Lane de Superman – O Retorno, 2006), força o encontro de Abby (a diretora Aselton) e Lou (Lake Bell, de Jogo de Amor em Las Vegas, 2008), sem que elas saibam. As duas estavam brigadas há anos devido a uma traição de relacionamento. Sarah tenta reaproximar suas duas melhores amigas de forma brusca, e sentimentos intensos voarão pela ilha ao longo do fim de semana na natureza.

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Como se não bastasse, o trio precisa lidar com o aparecimento de três caçadores no local. Para a sorte das mocinhas, um deles é um velho amigo de juventude. Ou será? A situação dá uma guinada para o pior, e logo as três se veem lutando por sobrevivência, nesse verdadeiro teste de força e coragem. Terror na Ilha não exibe nada que já não tenhamos visto antes dezenas de vezes, em filmes melhores, sendo o principal deles Amargo Pesadelo (1972) –  filme que estereotipou para sempre os caipiras. O que chama a atenção é a qualidade da diretora, que utiliza uma ótima trilha sonora e fotografia (principalmente noturna), e a entrega das protagonistas.

Os diálogos naturais, e situações tensas entre as duas ex-amigas, exalam veracidade. A primeira metade de Terror na Ilha consegue criar um clima autêntico, que por pouco não é estragado pela caricatura apresentada pelo elenco masculino. Acreditamos no trio como amigas, porque provavelmente o são, e deixam transparecer em suas atuações. Em determinado momento, Aselton e Bell chegam a ficar nuas na floresta, para não congelarem com roupas molhadas no frio. Mas tudo possui uma razão de ser. O fato citado apenas exibe o comprometimento das artistas com a obra. Lake Bell também se tornou uma diretora independente esse ano, com o elogiado In a World…, sobre o universo dos dubladores. Se o tipo de filme não for a sua praia, saiba pelo menos que a produção possui uma das melhores mortes (ou piores) e mais inusitadas do ano.

As Loucuras de Charlie

SÃO AS ÁGUAS DE MARÇO…

Conhecido por aqui como o filme em que Charlie Sheen canta “Águas de Março” em português, As Loucuras de Charlie teve seu lançamento direto em vídeo no Brasil. O filme marca o primeiro trabalho na direção de Roman Coppola (que também escreveu o roteiro), filho de Francis, e irmão mais velho de Sofia. A obra apresenta uma alucinada viagem pela mente do personagem título, vivido pelo controverso Charlie Sheen. Devemos nos atrever? Essa era realmente a proposta aqui. Visando lucrar em cima da recente surtada de mais um astro de Hollywood, o filme parece planejado para capitalizar o status do astro, um dos mais promissores de sua geração, parte de uma família de artistas, assim como o próprio diretor Coppola.

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Realidade se mescla com ficção ao conhecermos Charlie Swan III, um sujeito mulherengo, rico, bêbado e drogado. Ele perde o grande amor de sua vida, e arrependido tenta de todas as formas reconquistar a bela Ivana (grande chance para a belíssima Katheryn Winnick – de Almas à Venda). É como se Coppola com o aval e ajuda de Sheen, tentasse dar mais uma chance ao querido ator. Já reformado, ele pede perdão. Esse é um filme pequeno, mas com um bom elenco, e muitos talentos envolvidos. Nos EUA, foi lançado nos cinemas de forma restrita, e logo depois distribuído no sistema de vídeo demanda. As Loucuras de Charlie consiste numa série de situações surreais definidas pela tal “olhada na mente” do protagonista. O sujeito refaz os passos para tentar compreender o que deu errado em seu relacionamento, assim ganhamos vislumbres do passado, ao mesmo tempo em que o personagem de Sheen fantasia quase todas as situações mostradas na produção.

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Coppola é um usual colaborador do cineasta Wes Anderson, e com ele escreveu os roteiros de Viagem a Darjeeling Moonrise Kingdom. O diretor de primeira viagem pega para si alguns traços do amigo Anderson, para criar personagens estranhos e situações bizarras. As Loucuras de Charlie foi produzido pela A24, empresa recém formada que vem financiando bons projetos independentes americanos. Iniciada esse ano, a produtora lançou Spring Breakers – Garotas Perigosas (de Harmony Korine), Bling Ring – A Gangue de Hollywood (de Sofia Coppola), Ginger & Rosa (de Sally Potter), e o elogiado The Spectacular Now (de James Ponsoldt). Ano que vem a A24 já tem agendado os lançamentos de Under the Skin (de Jonathan Glazer, com Scarlett Johansson), The Rover (de David Michod, com Guy Pearce e Robert Pattinson), Enemy (de Denis Villeneuve, com Jake Gyllenhaal, Mélanie Laurent e Sarah Gadon), e Locke (de Steven Knight, com Tom Hardy).

As Loucuras de Charlie é um grande filme entorpecente, onde nada faz muito sentido, mas sentimentos são expostos de forma honesta. É bom ver o ator de volta ao jogo. Aqui, ele tem o apoio de Bill Murray, que interpreta seu contador e amigo, além de Patricia Arquette (sua irmã), Jason Schwartzman (primo do diretor, que interpreta seu melhor amigo), e das jovens talentosas e promissoras Mary Elizabeth Winstead e Aubrey Plaza.

A Batalha do Ano

(Battle of the Year: The Dream Team)

 

Elenco:

Josh Holloway, Laz Alonso, Josh Peck, Caity Lotz, Chris Brown, Ivan ‘Flipz’ Velez, Jon ‘Do Knock’ Cruz, Anis Cheurfa, Jesse ‘Casper’ Brown.

Direção: Benson Lee

Gênero: Musical

Duração: 110 min.

Distribuidora: Sony Pictures

Orçamento: US$ 20 milhões

Estreia: 21 de Março de 2014

Sinopse:

O filme segue a história de uma equipe americana de breakdancing, ou “”B-boy””, formada por jovens com problemas sociais e familiares. Eles são liderados por um treinador rígido, que os leva à França para participarem da competição Battle of the Year, na qual equipes de 18 países lutam pelo título de campeões mundiais.

Curiosidades:

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Trailer:

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Cartazes:

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Fotos:

Pequenos Espiões 4

(Spy Kids 4: All the Time in the World)

 

Elenco:

Jessica Alba, Alexa Vega, Daryl Sabara, Joel McHale, Rowan Blanchard, Mason Cook, Jeremy Piven, Danny Trejo, Belle Solorzano, Genny Solorzano, Ricky Gervais.

Direção: Robert Rodriguez

Gênero: Ação/Aventura

Duração: 115 min.

Distribuidora: Imagem Filmes

Estreia: 16 de Março de 2012

Sinopse:

Em ‘Pequenos Espiões 4‘, os irmãos Rebecca e Cecil descobrem que a sua madrasta Marissa (Jessica Alba), é na verdade, uma agente super secreta! Que está em uma missão para derrotar “Time Keeper” (tradução que ficará no roteiro). Diante de uma missão tão incrível como esta, estes dois irmãos contarão com as armas mais fantásticas do mundo! Jatos supersônicos, luvas mega poderosas e até um cão-robô! E você não fica de fora desta aventura! A sua missão aqui é acomode-se na poltrona e embarque nesta fantástica viagem. Com participação especial de Antonio Banderas.

Curiosidades:
» A Imagem Filmes não lançar ‘Pequenos Espiões 4‘ em 4D nos cinemas brasileiros. Nos EUA, a exibição nos cinemas incluiu o cartões de cheiro, para serem raspados em momentos-chave da história. Chamado de “aromascope”, o artifício consiste em papeizinhos com oito odores, como lavanda, com números correspondentes a cenas específicas do filme. A empresa chegou a negociar para trazer a novidade ao Brasil, mas um acordo não foi fechado. O lançamento acontecerá em 2D e 3D.

» Inicialmente intítulado ‘Spy Kids 4: Armageddon‘.


Trailer:


Cartazes:

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Fotos:

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37ª Mostra de Cinema de São Paulo: Miss Violence

O SOCO ESCONDIDO DEBAIXO DA IMAGEM

 

Miss Violence é um filme intrigante e brutal. Uma brutalidade escondida debaixo de uma imagem sofrida. No filme do diretor grego Alexandros Avranas, debaixo da imagem, um soco nos aguarda!

A narrativa começa com o suicídio de Angeliki. Em seu aniversário de 11 anos, ela pula da sacada, após olhar para a plateia com um sorriso! O que afinal teria levado uma menina tão jovem a cometer suicídio de maneira tão convicta e feliz?! Dos 98 minutos de projeção, essas perguntas ficam no ar por cerca de uma hora.

Além da Angeliki, há Eleni, sua mãe. Ela tem mais dois filhos pequenos (que não conheceram os pais) e está grávida. Na casa também vivem sua irmã mais nova, seu pai e sua mãe. Durante a primeira hora do filme, o pai surge como uma figura resignada com o suicídio, que batalha para retirar a família da depressão e impedir que o serviço social descubra a gravidez da filha Eleni, pois diante dos fatos ela poderia perder a guarda do bebê.

A estética adotada transmite a devastação espiritual dessa família. A câmera fixa, com raríssimos movimentos, é posicionada na altura dos olhos de uma pessoa sentada no sofá. Aparentemente, essa câmera seria a tradução visual do impacto do suicídio de Angeliki. Acontece que desde antes do suicídio, esse esquema já está presente.

SPOILERS A SEGUIR!!!

A parte final do filme explica os reais motivos da devastação dessa família e do suicídio. Uma sequência envolvendo Eleni, seu pai e um amigo fornece indícios dos segredos dessa família. Pela cena, o pai cafetinou a filha. Ficamos em dúvida da motivação. Como o pai foi demitido, imaginamos que a transação poderia ter sido movida pelas circunstâncias.

Pouco depois, vemos o pai buscando sua filha mais nova (a irmã de Eleni) na escola. Eles param em uma rua deserta e ela muda para o banco detrás do carro. Na cena seguinte, ela esta sendo violentada sexualmente por um homem; em seguida, por outro homem. Depois, aparece o pai que, ante dela se vestir, transa com ela. Em seguida, o pai recebe o pagamento pelo programa. Detalhe: a filha não tem mais do que uns 13 ou 14 anos! A irmã teria contado para Angeliki o segredo da família, motivando o suicídio. Há detalhes mais escabrosos, mas deixo para quem quiser conferir. Logo, a câmera baixa representa a depressão que esse pai causa na família.

Além da abordagem corajosa, o filme tem o mérito de provocar o espectador. Por boa parte da projeção, o pai é visto como porto seguro da família. Mas, um mal-estar difuso permanece no ar. Quando os segredos são revelados, toda a imagem que temos das personagens é alterada. Como se retirado um véu, enxergamos a verdade.

Próxima exibição: oficialmente, a Mostra de Cinema de São Paulo já encerrou. Contudo, do dia 01/11 ao dia 07/11, ocorreu a Repescagem. Alguns dos filmes com maior destaque são reexibidos em algumas salas selecionadas. Vocês podem conferir a programação da repescagem no site da Mostra de São Paulo. Miss Violence será reexibido no dia 07 de novembro, às 20:00 h na sala BNDES da Cinemateca.

37ª Mostra de Cinema de São Paulo: Peixe e Gato

IRANIANO DISPENSA A SALA DE EDIÇÃO

Mostra de cinema é algo curioso. Ia eu assistir ao 3x3D, conjunto de curtas-metragens que diretores como Peter Greeneway e Jean-Luc Godard discutem. Aí começa a conversa na fila e alguém sugere o filme Peixe e Gato. O filme seria um genial plano-sequência (sem cortes) misturando presente, passado, flashbacks, etc. A figura nem quis dizer muito para não estragar as surpresas. Como ainda tem mais uma exibição do 3x3D (e segundo informações que tive, entrará em cartaz no Cinesesc de São Paulo) e era a última exibição de Peixe e Gato lá fui vê-lo.

Dirigido pelo iraniano Shahram Mokri, o filme é um longo plano sequência de 134 minutos. Realmente não há cortes. A câmera só desliga no final do filme. Nesse tempo, acompanha dois grupos: um de jovens que vão participar de um campeonato de pipas e outro de três senhores donos de um restaurante (pelo que pude compreender, eles serviam carne humana por lá).

Visto apenas na técnica, o filme realmente é um feito! A direção consegue coordenar os diversos atores para que entrem em cena sem tirar a organicidade do movimento da câmera. É até bastante eficiente a passagem de um grupo de atores para outros. Existe mesmo momentos bonitos, como a representação de um déjà vu efetuado com um giro que a câmera dá em seu próprio eixo. Realmente, muito bonito! Contudo, fica a questão, esse maneirismo vai além disso? O plano-sequência torna-se algo essencial para a mensagem do filme?

A quebra das regras artísticas tem duas motivações: o simples desejo de quebrar uma regra ou porque ela é necessária para contar a história e passar certas sensações. Como as vanguardas do século XX cuidaram de quebrar as regras para mostrar que a essência da arte é a liberdade, hoje, a quebra pela quebra perdeu força. Ainda temos casos muito interessantes (como a abertura de Gravidade, em cartaz), mas, o que mais encanta é quando a fuga de um modelo serve para a narrativa, quando percebemos que, sem essa subversão, não acessaríamos centro da narrativa. Será que Peixe e Gato é um caso assim?

Sinceramente, não consegui perceber esse vínculo entre forma e conteúdo. Depois de quase uma hora e meia, é perceptível a função do plano-sequência, dispensar a sala de edição! Isso mesmo. Shahram Mokri monta o filme na tela. Nos primeiro minutos, há uma narrativa linear. Depois de certo momento, o filme torna-se circular, passando mais de uma vez pela mesma cena. Como em um déjà vu primeiro acompanhamos um par de atores, depois, voltamos ao ponto inicial para ver outro par de atores.

É realmente muito curioso. Mas, depois que descobrimos o jogo, o filme de esvazia. Não há uma história interessante, as personagens são vagas demais, não se compreende a ligação entre elas. Enfim, é uma historia vazia em uma embalagem sofisticada. A única função do plano-sequência é esconder um roteiro ruim (se é que foi feito um roteiro formal).

O iraniano deixou duas reflexões interessantes: quais os limites do uso do plano-sequência? No caso do iraniano, não colheu bons resultados. Segundo, depois das vanguardas do início do século passado, a forma pela forma não tem mais o mesmo impacto; a quebra da forma, se bem integrada à narrativa, é deliciosa!

37ª Mostra de Cinema de São Paulo: Os Filhos do Padre

COMÉDIA LEVE CHUTA CACHORRO AGONIZANTE

O interessante de Mostras de Cinema é o contato com filmografias pouco acessíveis, quase exóticas. Não falo de filmes iranianos (vamos combinar, no circuito alternativo, eles são mainstream), mas de coisa exótica, como uma comédia croata. Os Filhos do Padre, de Vinko Bresan, não chega a ser instigante ou mesmo exótica; é curiosa. Seguindo a cartilha da narrativa clássica, o filme conta a história de Fabijan (Kresimir Mikic), jovem padre católico que, assustado com a quantidade de mortes e a falta de nascimentos em sua comunidade, decide furar as camisinhas. Ele se une com os dois vendedores de preservativos da cidade.

O filme tem um ponto de partida interessante, que poderia gerar críticas ácidas. Bom, não conheço detalhes do catolicismo croata – pelo que consta, eles são bem religiosos – mas, considerando a média da população internacional, as piadas, apesar de divertidas, fazem uma crítica que é corrente até entre católicos. Nesse sentido, o filme bate em cachorro agonizante, apontando o quão retrógrado podem ser certos discursos da Igreja – até o Papa Francisco já contemporiza esse discurso.

Nada disso significa que o filme seja um desastre ou chato. Significa que se mantém em uma zona de conforto. Mesmo nela, contudo, consegue produzir situações divertidas, com algumas sacadas realmente muito interessantes. O diálogo entre o padre Fabijan e o Bispo é muito bom, acima da média do restante da história.

No geral, Os Filhos do Padre é uma comédia divertida e relaxante, além de ser sempre algo sempre um bom exercício conhecer filmografias pouco acessíveis.

Próximas exibições:

  • Dia 28/10 – 21:00 – Cinemark Shopping Cidade Jardim 6
  • Dia 30/10 – 22:25 – Espaço Itaú de Cinema – Augusta 1

37ª Mostra de Cinema de São Paulo: Era Uma Vez em Tóquio

A OBRA MÁXIMA DE OZU

Acredito que obras de arte não tem classificação etária. Nada impede alguém de pouca idade conseguir apreciar um Pedro Almodóvar ou alguém mais velho se empolgar com um desenho da Disney. Apesar dessa máxima, certas coisas são mais bem apreciadas com mais idade ou, ao menos, depois de adquirida certa experiência de vida. Era Uma Vez Em Tóquio (1953), de Yasujiro Ozu, é um caso desses.

Exibido na Mostra de São Paulo em regime de minirretrospectiva, o filme segue a simplicidade marcante de Ozu. Um casal de idosos viaja da cidade de Onomichi a Tóquio para visitar os filhos depois de longo período distante. Acontece que os filhos não têm todo tempo do mundo para os pais. Eles tentam dar atenção aos pais ou fazê-los se sentirem bem, mas eles percebem que incomodam.

Não é um filme trágico. Ozu constrói um drama íntimo. Somado à tradição japonesa de profundo respeito e educação, Era Uma Vez… é um drama em voz baixa, que nunca se esquece da beleza da vida. O filme pode ser lido como uma exposição do choque entre tradição e modernidade no Japão do pós-guerra. Mas, sua estética peculiar, de cortes precisos, enquadramentos belíssimos que exploram as possibilidades da arquitetura tradicional japonesa, cenários simples e elegantemente construídos e uma câmera fixa posicionada na altura dos olhos de alguém sentado no tatame, Ozu limpa a imagem nos permitindo a construção de sentidos e sentimentos.

É muito difícil não completarmos a tela com uma narrativa pessoal. Lembrei-me de meus pais, de minha noiva e dos pais dela. Talvez você se lembre dos seus pais, dos seus avós, dos seus netos, de um irmão, de uma nora, de um tio. Memórias e afetos convocados para se infiltrarem na imagem.

Quem não puder vê-lo em tela grande, pode assisti-lo em DVD, em edição lançada este ano pela Versátil.

Próximas exibições:

  • Dia 28/10 – 13:00 – Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca 1
  • Dia 31/10 – 20:00 – Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca 3

37ª Mostra de Cinema de São Paulo: Escudo de Palha

UM MIIKE PARA QUASE TODOS AS IDADES

 

O japonês Takashi Miike é um diretor controvertido, que até críticos não se acertam se gostam ou não. Bom, eu gosto! Seu último trabalho, comparado com obras como Audição e Ichi, The Killer, pode ser considerado livra, ou ao menos, indicado para maiores de 14 anos (a classificação oficial é 18).

Em Escudo de Palha, a cabeça de um serial killer está a prêmio. Depois de ter sua neta assassinada, um magnata oferece 1 bilhão de ienes para quem matá-lo (a quem interessar: na cotação de hoje, vale R$ 22.440.000,00). Para sua segurança, o assassino se entrega à polícia local. A missão: levá-lo em segurança para a polícia federal, em Tóquio.

Cinco policiais são o escudo contra todo um país! Essa é a sensação do filme. Bandidos, anônimos, policiais, enfim, todo tipo de gente tenta matar o assassino Kiyomaru (Tatsuya Fujiwara). Pode soar muito absurdo para nós o esforço que os cinco policiais – especialmente Mekari (Takao Ohsawa) – em proteger um psicopata que nem se esforça para ser simpático. Até a plateia deseja liquidá-lo. É o sentimento de honra e de dever que guiam esses policiais. O pior sujeito deve ser julgado pela justiça. O dever de cumprir uma ordem é mais que uma questão legal, é a honra que está em jogo. E os japoneses levam muito à séria a honra!

Ter isso em mente é necessário para entender o dilema dos protagonistas. Não se trata de proteger um inocente nem um bandido vítima da sociedade injusta (Miike dá uma aula de como humanizar um assassino sem torná-lo coitadinho). Mas, de cumprir um dever que as personagens carregam dentro de si como o correto e o honrado a ser feito. Tudo isso embrulhado com ação de primeiríssima qualidade. Miike em ótima forma!