domingo, abril 28, 2024

Crítica | Billy Porter faz impressionante estreia diretorial com a ótima rom-com ‘Tudo é Possível’

Billy Porter ganhou fama mundial depois de estrelar o aclamado drama ‘Pose’, conquistando inclusive uma estatueta do Emmy Award por sua icônica interpretação como Pray Tell. E, pouco depois de ter quebrado barreiras de gênero ao interpretar a fabulosa Fada Madrinha na adaptação musical de ‘Cinderela’, Porter resolveu mergulhar de cabeça no mundo cinematográfico ao fazer sua estreia diretorial com a vindoura dramédia romântica ‘Tudo é Possível’ – cujas fórmulas do gênero são utilizadas para se afastar de convencionalismos e criar uma divertida e funcional narrativa destina não só à comunidade LGBTQIA+, mas essencialmente às pessoas trans (cuja representatividade na mídia ainda permanece muito escassa).

A narrativa acompanha Kelsa (Eva Reign), uma jovem trans que navega pelo último ano do Ensino Médio antes de finalmente deixar a cidade de Pittsburgh para trás e seguir seu sonho de se tornar uma cineasta. Acompanhada de suas duas melhores amigas, ela enfrenta o dia a dia de ser uma garota taxada como diferente por uma sociedade cis-heteronormativa – dizendo que não precisa que ninguém a proteja e que, de fato, ela não procura qualquer romance. Entretanto, seu mundo vira de cabeça para baixo quando ela cruza caminho com o charmoso e adorável Khalid (Abubakr Ali), um menino que está na mesma aula de artes visuais que ela, cujos sonhos vão de encontro ao que a tradicional família muçulmana quer para ele. É nesse explosivo contexto que ambos desenvolvem um relacionamento e começam a se apaixonar um pelo outro.

A principal ideia do filme é desconstruir, assim como ‘Pose’ fez alguns anos atrás, a construção de personagens trans no cenário mainstream. Apesar de Porter não se identificar como uma pessoa trans, ele sempre se mostrou como um aliado dessa comunidade e sempre utilizou sua voz para desmantelar as barreiras entre gêneros – motivo pelo qual trata o assunto com cautela e delicadeza extremas. A própria história apresenta vários lados, desde o protagonismo bem-vindo de Kelsa, dotada de uma personalidade complexa e que, certamente, dialoga com as experiências pessoais de Reign, até como o preconceito enraizado impacta na saúde mental dela, de Khalid e de todos à sua volta. Uma das ideias exploradas, também, é o proposital choque promovido por Porter em destinar um enredo não àqueles que dominam as telas desde o surgimento do show business, e sim àqueles que ainda lutam pelo espaço que merecem.

O longa não reinventa a roda – e nem tem esse objetivo: não é surpresa, pois, que sejamos apresentados a vários “clichês”, por assim dizer: Kelsa e Khalid pertencem a mundos diferentes, a cotidianos diferentes e, por um acaso do destino, acabam se envolvendo. Mais do que isso, eles fogem dos estereótipos de “garota nerd” e “astro do esporte”, como visto inúmeras vezes no cinema e na televisão, posando como pessoas que têm seus próprios sonhos, vontades e obstáculos a serem enfrentados. E é dentro desse cosmos único e que serve como representação máxima da multiplicidade ideológica da Gen-Z que temos as investidas costumeiras do gênero exalando da tela: a princípio, esse romance inesperado floresce e encanta, até enfrentar um beco sem saída que parte de pensamentos contrastantes. Por fim, as coisas se resolvem – e é em um final fora da curva, que remonta ao elogiado musical ‘La La Land: Cantando Estações’, que o arco envolvendo o casal chega ao fim e dá espaço a um capítulo diferente.

A produção não é toda livre de deslizes, o que não é um problema gigantesco que afasta o público do enredo. Há, de fato, diálogos forçados que destoam das mensagens a serem empregadas – e que são pincelados com incursões destinadas a espectadores que agoram adentram a adolescência, infundidos em um panorama social que não aceita mais, ao menos em teoria, preconceitos idióticos que rejeitam a existência de outrem. Kelsa, inclusive, comenta que não quer apenas existir, e sim desfrutar de tudo que se desenrola à sua frente – como, por exemplo, entrar na UCLA e ir a um lugar em que as pessoas não a conheçam e não a julguem por quem foi, e sim por quem é.

Enquanto o roteiro de Ximena García Lecuona faz o possível dentro dos limites impostos pelas rom-coms adolescentes, Porter também demonstra um comando diretorial coeso o suficiente para arquitetar o que pretende: como já mencionado, não há nada de original a ser visto aqui, mas o realizador consegue unir o eficaz ao envolvente, transformando possíveis digressões rítmicas em uma exaltação do que é ser um jovem nos dias de hoje – pegando referências de ‘A Mentira’ e ‘Quase 18’ e aglutinando-as em algo pessoal, íntimo e cheio de sabor. As escolhas estéticas, que gradativamente inclinam-se para o amadurecimento de uma paleta de cores amarelada, são certeiras e contribuem para transmitir os respectivos sentimentos à audiência. E a cereja do bolo vem com a presença aplaudível de Renée Elise Goldsberry como a mãe de Kelsa, adornada em uma rendição irretocável.

Não deixe de assistir:

A estreia de Billy Porter na cadeira de direção é impressionante e premedita um novo lado da frutífera carreira de um dos maiores astros da indústria do entretenimento. ‘Tudo é Possível’ não vai muito além da curva – mas o resultado é tão competente que nos faz esquecer das fórmulas e comprar essa antêmica história de superação, empoderamento e amor.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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