sexta-feira, março 29, 2024

Crítica | Lady Gaga rouba os holofotes na exagerada novela italiana ‘Casa Gucci’

Depois de ter revolucionado o cenário da música, Lady Gaga resolveu apostar suas fichas em outra esfera do entretenimento e migrou para a atuação. Conquistando um Globo de Ouro por sua elogiada performance em ‘American Horror Story: Hotel’ e uma indicação ao Oscar por seu trabalho impecável no romance musical ‘Nasce Uma Estrela’, Gaga provou ser uma das artistas mais versáteis da história, deixando sua marca onde quer que passasse. Três anos mais tarde do aclamado longa-metragem dirigido por Bradley Cooper, a atriz e cantora está pronta para encarnar sua próxima persona: Patrizia Reggiani.

O denso nome não é familiar por qualquer motivo, visto que Reggiani se tornou uma das peças-chave para o assassinato de Maurizio Gucci, herdeiro da icônica maison italiana que carrega seu nome. Patrizia e Maurizio se casaram ainda nos anos 1970 e mergulharam em um turbilhão de sentimentos e traições que culminaram em uma das tragédias mais chocantes da história da moda. Depois de ter virado um livro sob os cuidados de Sarah Gay Forden, a narrativa foi levada às telonas através dos olhos do lendário diretor Ridley Scott, responsável por obras-primas como ‘Gladiador’ e ‘Alien – O 8º Passageiro’, e ganhou o título de ‘Casa Gucci’ – prometendo destrinchar todo o drama e todo o glamour envolvendo a família titular. Entretanto, apesar das altas expectativas, a iteração esbarrou em certos excessos técnicos e criativos, ofuscados apenas pela incrível performance de um elenco de ponta.

Para aqueles não muito familiarizados com o enredo, Patrizia (Gaga) e Maurizio (Adam Driver novamente em uma rendição espetacular) se aventuraram em um enlace romântico quando ainda mais jovens – para desespero de uns e felicidade de outros. O relacionamento dos dois teve uma recepção controversa por parte dos Gucci, em especial de Rodolfo (Jeremy Irons), pai de Maurizio, que dizia que um membro da realeza fashion italiana não poderia se misturar com uma família que tinha uma transportadora como negócio e sustento. Mesmo com tantas adversidades, ambos decidiram se casar e se afastar daqueles que poderiam lhe causar algum mal – isso é, até constantes reviravoltas os levarem de volta aos Gucci e darem início a uma queda estelar e um ciclo enredado de mentiras que só poderia caminhar para um lugar.

Não é surpresa que Gaga tenha encarnado Patrizia com perfeição, motivo pelo qual vem sendo aclamada desde as primeiras exibições do filme. A performer se transmuta na socialite com solidez invejável, adotando cada um de seus maneirismos e características para arquitetar um arco bastante delineado que se inicia na idealização romântica, atravessa o cruel realismo e se isola em uma quieta loucura que não é capaz de aceitar que as coisas não saíram da sua maneira. Em contraposição Driver não se contenta com o heroísmo banal que acompanha vítimas de planos vingativos, fornecendo um lado impetuoso da personalidade de Maurizio que comumente é esquecido – motivo pelo qual a química dos dois (ou a proposital falta dela) emana da tela com angústia fervorosa.

Mas a dupla não é a única a nos deixar encantados; Gaga e Driver são acompanhados de um elenco de ponta que inclui um irreconhecível Jared Leto como o engraçado Paolo, cuja demasia combina com o personagem em uma explosão de eventos que refletem a podridão mercenária que se esconde por trás de vestidos deslumbrantes e acessórios cobiçados; Irons se entrega de corpo e alma para os breves momentos de tela como Rodolfo, enquanto Salma Hayek resgata os dias de glória de Pina Auriemma, confidente e amiga de Patrizia, numa camaleônica interpretação. No topo dessa “torta” de talentos, temos Al Pacino como o implacável e charmoso Aldo, que toma conta das ações da Gucci após a morte do irmão, Rodolfo, e se torna alvo da ambição desmedida de Patrizia (que não pensa duas vezes antes de passar-lhe a perna e conquistar mais um inimigo à sua lista).

Enquanto não há qualificações o bastante para descrever a potência do elenco protagonista e coadjuvante, o mesmo não pode ser dito sobre a condução da obra. Considerando que lidamos com um drama criminal, ousadias não parecem muito condizentes com o que o filme tenta entregar – mas isso não quer dizer que Scott não precisava ter se rendido tanto às fórmulas. Afinal, o cineasta lida com três problemas principais aqui: o primeiro reside no longo tempo de cena, que ultrapassa as duas horas e meia e que poderia ter perdido algumas sequências desnecessárias para deixá-lo mais fluido; o segundo é o tratamento estético, em especial a montagem, cuja construção é fragmentada e brusca demais para não causar certo desconforto nos espectadores; e, por fim, há obstáculos em que o roteiro de Becky Johnston e Roberto Bentivegna tropeça, implicando numa momentânea perda de ritmo.

De qualquer forma, as boas intenções se espalham por esse épico novelesco – e inclusive recupera a elegância de uma Hollywood clássica, motivo pelo qual o resultado é positivo e deve agradar tanto aos fãs de Gaga quanto aqueles que não esperam menos que uma melodramática incursão com todos os elementos exagerados que conhecemos. Com uma atmosfera que faz alusão aos longas de máfia e que nos guia numa jornada apetitosa, ‘Casa Gucci’ pode não ser o melhor lançamento do ano, mas é, sem dúvida, uma burlesca e espirituosa epopeia que merece ser conferida em sua própria overdose artística.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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