sábado , 11 janeiro , 2025
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As Palavras

 

Muito já se falou dos desafios de balancear tramas paralelas: alguma delas pode ficar interessante demais e ofuscar as demais, outra pode ficar esquecida por tempo demais… No caso de As Palavras (The Words), as tramas são interligadas, mas sua convivência não é pacífica.
Um autor (Dennis Quaid, de O que Esperar quando Você Está Esperando) está em um evento de promoção de seu novo livro. Ele lê trechos do romance para uma plateia ávida pela história. No meio do público destaca-se uma bela fã do escritor (Olivia Wilde, de O Preço do Amanhã).

O livro narra os conflitos de Rory (Bradley Cooper, de Sem Limites), um aspirante a autor que não consegue uma editora interessada em seus escritos. Um dia, compra uma antiga bolsa em Paris e encontra dentro dela um original inédito. Ele decide passar a limpo no computador aquele antigo texto cheio de talento.

Sua esposa (Zoe Saldana, de Colombiana: Em Busca de Vingança) lê a transcrição e acredita que aquela bela história de amor foi composta por seu marido. Ela o convence a apresentar o original para uma editora, onde o livro é publicado e trona-se um best-seller.

O verdadeiro autor (Jeremy Irons, de Margin Call) está vivo e entra em contato com Rory para contar sua história de vida em uma terceira narrativa de As Palavras. As três linhas dramáticas se entrelaçam no decorrer do filme, mas a confusão que criam desperdiça energia dos temas abordados.

O longa poderia tratar da ética dos protagonistas, da dificuldade de ser bem-sucedido no meio cultural, das histórias de amor de seus personagens; mas é tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que a concentração fica comprometida.

O espectador perde tempo demais para manter o entendimento das três tramas e não consegue se identificar com os personagens ou seus conflitos. A trilha musical de Marcelo Zarvos (Solteiros com Filhos) exagera em uma tentativa de injetar emotividade no conjunto, mas o roteiro impede a empreitada de ser bem-feita.

 


Crítica por:
Edu Fernandes (CineDude)

 

 

Crítica | As Aventuras de Pi

Anunciado como um dos melhores filmes do ano, e forte concorrente a diversas indicações no Oscar, “As Aventuras de Pi” é um feito impressionante da sétima arte, e demonstra que ainda existe criatividade na hora de se contar histórias.

Baseado numa obra literária escrita pelo espanhol Yann Martel, tida como inadaptável ao cinema, “As Aventuras de Pi” ganhou forma quando o extraordinário Ang Lee aceitou o desafio de peito aberto. Na trama, toda contada em forma de flashback pelo protagonista para um escritor, somos apresentados a Pi (cujo apelido vem do nome Piscine, Piscina em português, grande paixão de seu tio), um jovem indiano criado ao lado do irmão num zoológico, ambição de seu pai negociante. Quando sua família decide se mudar para outro continente a fim de uma vida mais próspera, a trama verdadeiramente tem início após uma cena-espetáculo do naufrágio de um grande encouraçado. O rapaz é deixado à deriva num bote com alguns animais sobreviventes, e logo após somente com um tigre, o qual recebeu o singelo nome Richard Parker. Durante a maior parte, “As Aventuras de Pi” é um rapaz, um barco e um tigre. Elementos simples para uma grande história, emocionante para cativar qualquer espírito.

O cineasta Ang Lee é sem dúvidas um dos nomes mais expressivos do cinema atual. Natural de Taiwan, Lee conquistou o mundo e quebrou as barreiras da língua demonstrando ser um dos diretores mais globais de todos os tempos. Após alguns filmes feitos na sua terra, em seu idioma, Lee surpreendeu ao adaptar o conto clássico, e super inglês, de Jane Austen, “Razão e Sensibilidade”. Afinal o que um cineasta asiático saberia sobre uma obra de época de um outro continente. O diretor entregou um dos melhores filmes dos anos 90, impecável em sua estética e narrativa, ainda conquistando indicações no Oscar. De lá para cá, Ang Lee ficou entre erros e acertos, mas nunca se domesticou pela comodidade, sempre encarando desafios. O cineasta pode ser considerado o mais corajoso e ousado contador de histórias da atualidade, mesmo que não acerte sempre, o que conta na carreira de Lee é o gosto pela mudança. Lee já se aventurou em desmascarar a classe média americana dos anos 70 em “Tempestade de Gelo” (antes de Sam Mendes fazer o mesmo em “Beleza Americana”), desmistificar o gênero do faroeste e a imagem do cowboy americano por duas vezes, em “Cavalgada com o Diabo” e “O Segredo de Brokeback Mountain“, além de investir em filmes de artes marciais, e até mesmo no subgênero dos super-heróis.

Agora, Lee apresenta mais um filme único e inusitado em sua carreira. Um espanhol e um taiwanês contando a história de personagens indianos. Como se não bastasse a mistura globalizada, “As Aventuras de Pi” é um filme onde muito poderia dar errado. Foi necessário um diretor com a sensibilidade de Ang Lee para capturar cada nuance dessa obra, que não possui muitos diálogos, mas tem muito a dizer sobre a natureza humana, e seu espírito resistente. Os efeitos visuais aqui são simplesmente fantásticos, em muitos momentos, ou em sua grande maioria, são usados animais virtuais, ou seja, criados por efeitos especiais, e o grande êxito do filme é nos fazer não conseguir diferenciar tais momentos. O tigre Richard Parker é sem dúvidas um dos personagens mais icônicos do cinema no ano. As cenas em que o tigre olha para o nada, para a imensidão que os cerca, onde não conseguimos diferenciar o céu do mar, é de uma beleza poética emocionante. Os efeitos em 3D são magníficos, esse é o filme que merecia ter sido rodado em 48 quadros por segundo e não “O Hobbit”, para termos toda a vantagem dos efeitos em 3D, e não ficarem escurecidos pelo óculos, esse filme precisava ser mais claro. De qualquer forma, a única maneira de ver “As Aventuras de Pi” é em 3D, você perderá grande parte do impacto se optar pela versão normal (que nem sei se existe).


O filme é pura poesia e um deleite visual. Infelizmente, “As Aventuras de Pi” tem sim seus problemas. O primeiro deles sendo tudo o que envolve a trama central, ou seja, o começo e o fim. “As Aventuras de Pi” é sobre um náufrago e um tigre, e caso fosse apenas isso seria uma obra-prima, coisa que por pouco escapa de ser. Para termos conhecimento das origens e crenças do protagonista Pi, os realizados optam por todo um início onde isso é mostrado (sem necessidade de fato). A obra demora a engatar e a dizer sobre o que verdadeiramente irá falar. Isso causa confusão para as pessoas que não sabem do que o filme se trata, e podem achar que mudou totalmente a sua trama, quando a história central é justamente o que é mostrado por grande parte.


Digamos que o filme começa como uma história sobre um jovem indiano em busca de sua verdadeira fé, ao lado da família num zoológico, e inclusive temos acrescentado um interesse amoroso que não nos leva a nada, e cenas que mostram a infância de Pi sendo hostilizado pelos coleguinhas no colégio devido a seu exótico nome. Tudo isso se formos parar para pensar é completamente descartável e não soma nada na trama central, assim como o tio apaixonado por piscinas que simplesmente é eliminado sem cerimônia se tornando apenas uma pequena nota no filme. Seja como for, “As Aventuras de Pi” é uma obra quase perfeita, digna dos maiores épicos de Hollywood, que conta uma história diferente e inusitada, e ganha muitos pontos por ser um filme família com conteúdo. O filme fará você verdadeiramente pensar, sentir e refletir, e deverá merecidamente ser lembrado no próximo Oscar.

 

 

 

Crítica 2 | As Aventuras de Pi

“Existem alguns truques clássicos dentro de um filme: Nunca trabalhar com animais, crianças, água e 3D. Ignoramos tudo isso!” Essas foram às escarnecidas palavras do oscarizado diretor, americano de origem taiwanesa, Ang Lee (O Segredo de Brokeback Mountain), sobre a adaptação do romance ‘A Vida de Pi’, do escritor Yann Martel.

O best-seller que encantou o mundo, vendendo mais de 1,5 milhões de exemplares, foi imediatamente cogitado no orbe da sétima arte.

Justamente por tratar-se de uma aventura épica, que nos leva a refletir sobre o valor da vida e o conceito da presumível importância da fé – sendo assim necessária na existência de algumas pessoas –, fazendo uma intrigante comparativa, do fundamental papel da imaginação, quando você se depara com a crua e real verdade da nossa história. De como é mais fácil e adequado enxergar os fatos, de uma forma não ordinária ou prosaica. Essa é uma obra que está longe de querer insultar os não existencialistas (como quem vos escreve), mas de fazer com que os mesmos observem, de uma outra maneira, a visão do seu semelhante. Para assim respeitá-la, sem precisar, de fato, aceitá-la.

O conto traz um relato sobre o combate travado entre cinco criaturas, no Oceano Pacífico, narrado pelo indiano Piscine Molitor Patel, mais conhecido como Pi. Quando menino, ele e sua família, embarcaram num navio cargueiro, rumo ao Canadá, para escapar da inconstância política da Índia, nos anos 70. Um inesperado naufrágio deixa vivo apenas: O garoto, uma zebra, uma hiena, um orangotango e um tigre de Bengala. Salvos pelo único barco salva-vidas restante. Existindo, assim, uma verdadeira odisseia, repleta de inúmeras batalhas e caçadas, numa constante luta pela sobrevivência. Uma mágica aventura marinha de tirar o folego.

Inspirado, talvez, pela magnitude artística, residente no livro, Lee concretiza um dos filmes mais incríveis de sua carreira. Criando uma narrativa extremamente orgânica, que faz seus 127 minutos serem poucos ou exatos, para quem o assiste. Logo nos planos iniciais, passados no Zoológico, o impacto visual é estrondoso. Feito para se ver em 3D. Justamente por criar uma função junto à narrativa, e ter fator essencial dentro dela. Fazendo com que o espectador sinta todo o poder que emana de cada criatura, da chuva, das plantas, enfim, de todo o local aludido. Da mais forma palpável possível. Por muito utilizar profundidade de campo, algo crucial dentro do artifício, mas pouco empregado pelos diretores, à película é junto ao ‘A Invenção de Hugo Cabret’ e ‘Avatar’, um dos que melhores utilizaram a tecnologia.

Tudo isso muito bem auxiliado pela belíssima trilha sonora de Mychael Danna (A Pequena Miss Sunshine), que tem êxito, ao tentar imprimir variadas sensações, durante toda trama. Ou pelo chileno cinematografo Claudio Miranda (Clube da Luta), que alcança aqui, talvez, a conquista de perpetrar uma das aquilates fotografias do ano. Com lentes claras, vividas, fazendo uma pontual rima com as águas do oceano. Não podemos esquecer também do sempre parceiro de Lee, Tim Squyres, montador oficial do cineasta. Que também não passa despercebido. Já que a narrativa fílmica é toda em cima de flashforwards, algo que geralmente tende a comprometer o trabalho de montagem, Squyres mescla bem todos os momentos, sem nunca criar confusões.
Já no quesito de atuações, o filme conta com um elenco quase que totalmente novo. Intencionalmente planejado pelo próprio diretor. Que afirmou querer dar maior destaque para toda amplitude da estória. Um exemplo disso foi ator Tobey Maguire, que tinha sido praticamente contratado pela produção, para ser o entrevistador.

Porém, teve de ser sacado, de última hora, pois, segundo Lee, o fato do mesmo ter muita fama, por causa da franquia ‘Homem-Aranha’, poderia desviar o foco da fita. Entretanto, os inexperientes atores dão bem conta do recado. Com destaque para o jovem e estreante, Suraj Sharma. Que, praticamente, sozinho em cena, já que o tigre foi feito totalmente em CGI – sendo que um tigre verdadeiro foi usado apenas em sequências que apareceria sozinho, como quando ele nada no oceano -, Sharma demonstra muita força e confiança em tela. Uma atuação ao nível de Dev Patel em ‘Quem Quer Ser o Milionário?’.

Ao final da projeção, com os “reais” esclarecimentos dos fatos, a impressão obtida é a mesma que tivemos no excepcional ‘Peixe Grande’. De que é melhor aceitarmos a vida de uma maneira extraordinária, dentro de uma aventura épica, ala ‘Náufrago’ de Robert Zemeckis, ao lado de animais selvagens, enfrentando todos os medos, passando por ilhas misteriosas e, no final, descrever algo que transmita orgulho. Do que, simplesmente, relatar uma acriançada tragédia, cercada de assassinatos, evidenciando a podridão e escoria da alma humana. Concluo então, sem vergonha, junto ao entrevistador, ateu como sou, concordando com a proposta existencialista, deixada por Pi, sobre tal ponto de vista.

 

 

 

 

 

A Árvore da Vida

 

As comparações entre Melancolia A Árvore da Vida são inevitáveis. Os dois filmes têm muito em comum, tanto que ao sair da sessão do primeiro, julgava ter visto o melhor do ano, até presenciar o segundo. A Árvore da Vida é uma película para ser apreciada, contemplada, já que é construída em cima de imagens e diálogos esparsos.
Numa viagem que se inicia na origem do universo e segue até o fim de tudo, Terrence Malick traça um paralelo com a família do jovem Jack O’Brien (Hunter McCracken / Sean Penn), desde o seu nascimento, passando pelas relações conturbadas com seu pai (Brad Pitt) e sua mãe (Jessica Chastain), até suas conclusões em um futuro insípido e sem sentido.

Ele está nas mãos de Deus agora, diz uma senhora amiga da família de Jack diante da perda de um filho, enquanto a Sra. O’Brien responde com pesar, denotando a essência com a qual se comporá a fita dali em diante: Ele esteve nas mãos de Deus o tempo todo.

Com interações profundamente concisas e impactantes quanto essa, A Árvore da Vida vai construindo uma teia de poucas palavras, normalmente narradas em off para que o espectador faça uso de sua própria inteligência e julgue as cenas sem alterações expositivas, e imagens intensamente trabalhadas para encantar a percepção. Quando as passagens quase bucólicas de um Texas dos anos 50 entram em contraste com os arranha-céus dos dias atuais, é possível perceber o excelente trabalho de uma direção de arte que consegue chocar e tornar desprezíveis todos os avanços da nossa sociedade. Enquanto a casa dos O’Brien é recheada de cores vivas das quais emanam calor, o escritório do Jack adulto, bem como sua residência, é vazio – praticamente não há com o que interagir, exceto as cores mortas retratadas num contraste entre o preto e o branco. Havia maneira melhor de revelar o que o crescimento daquele rapaz acumulou em seu futuro? Certamente, não.

Uma carta que a câmera acompanha como se essa fosse um personagem. Um violão abandonado num quarto. O outono que se destaca nas árvores locais. Com mensagens tão precisas, Terrence Malick e equipe revelam a dor da morte que principia a obra de forma eficaz. Quase nada é dito, e muito pode ser extraído dessas passagens que só uma mente preparada e um olho treinado como do seu diretor seriam capazes de concatenar. Mesmo uma cena aparentemente sem qualquer efeito, demonstra estar imbuída de significado, quando a Sra. O’Brien é enquadrada e o terreno declina atrás de si – uma representação singular de que seu mundo afundou. E é interessante notar como naquela família provinciana, mesmo o cuidado da maquiagem ao trazê-los o mais próximos da realidade possíveis é extremamente funcional. Em momento algum duvidamos que Brad Pitt e Jessica Chastain façam parte daquele universo, já que até mesmo suas rugas são esquadrinhadas pelas lentes da câmera. Até mesmo um plano-detalhe da alça quebrada de uma maleta no terceiro ato da produção é brilhante, já que nos revela, sem exposição, o momento frugal pelo qual passam os protagonistas.

Então, a cidade da atualidade é vista de baixo para cima, com os prédios e os transeuntes se alongado para o céu em mais uma mensagem interessante do cineasta: o que os aguarda senão o retorno de onde vieram? Enquanto compõe essa visão de que tudo que julgamos importante é fútil, Malick nos leva a presenciar uma dança de pássaros entre o mar de concreto, costurando brilhantemente o próximo passo da projeção que nos levará a um vislumbre da origem do universo, a mais iluminada composição já feita para o cinema nesse sentido. Com todo o olhar distinto de Douglas Trumbull, supervisor de efeitos especiais que estava há trinta anos longe da sétima arte, Malick recria uma viagem que ultrapassa até os memoráveis instantes similares de 2001: Uma Odisséia no Espaço. É complicado crer que tudo foi elaborado à moda antiga, sem CGI. Trumbull faz uso de pinturas, líquidos, luzes e um sem-número de materiais para recriar toda a jornada de bilhões de anos pela qual o universo passou. Em um dos momentos mais contemplativos do cinema, chegamos, inclusive, a seguir a formação da Terra e o surgimento das primeiras formas de vida. É para ser aplaudida de pé a criação dos dinossauros presentes em A Árvore da Vida. Se tantos se impressionaram com o que Spielberg fez no passado, aqui, de forma muito mais singela, Malick nos dá um momento tocante dos antigos habitantes do mundo. E quando o já aguardado ponto em que a biodiversidade que conhecemos surgiria, incluindo a vida humana, o filme nos surpreende novamente ao traçar um paralelo entre uma casa afundada da qual o jovem Jack tenta se libertar e o nascimento de um bebê, nesse caso, o próprio rapaz. Que sintonia esplêndida!

Tudo o que acompanhamos até então é hipnótico, amparado extensamente pela fantástica trilha sonora de Alexandre Desplat, que compôs também para as duas partes finais de Harry Potter. Se nesse ponto Desplat cria canções dignas dos grandes maestros da nossa história, mais a frente trabalha apenas batidas tensas e profundas, quando as relações entre marido e mulher se complicam, e perceber como o compositor é capaz de migrar facilmente entre gêneros chega a ser absurdo de tão perfeito.

Você terá crescido antes desta árvore ficar grande, pensa a mãe enquanto encara os primeiros passos de Jack. Os consequentes movimentos. O ciúme do irmão quando esse nasce. As prímevas percepções do mundo. O desenvolvimento de Jack toma conta da tela. Através de cenas que falam por si e elipses excepcionalmente executadas, como o desligamento de um abajur, nos envolvemos na história que tecerá toda a mentalidade do garoto que Sean Penn intercala aqui e ali em seu futuro. As personificações dos atores são um elemento a parte. Pitt soa eficiente e intimidador como um pai duro que já apanhou demais da vida e não quer que seus filhos passem pelo mesmo. Suas exaltações são como o suor que parece ultrapassar a pele do ator e carregar sua interpretação, mas mesmo tão rígido, não deixam de ser tocantes os instantes em que se percebe todo seu protecionismo e amor para com seus pequenos. Jessica Chastain é a representação da esposa provinciana de décadas atrás. Normalmente resguardada aos seus pensamentos, carrega toda a emoção que uma mãe sente por seus filhos em gestos e nas já citadas narrações em off. Quando a liberdade da casa vem à tona, sua consternação e alívio são pesados e distribuídos uniformemente em vários trechos da projeção. Pena que Sean Penn tenha pouco tempo em tela para se entregar ao seu papel como de costume, mas ainda assim, com pouquíssimas frases ditas, deixa transparecer o peso que carrega nas costas e sua abominação pelo futuro-presente ao dizer, por exemplo, nós destruímos a Terra, numa constatação triste que jamais passa por nossas cabeças. Porém, o grande peso de A Árvore da Vida está nas mãos e expressões da jovem revelação Hunter McCracken, que acompanhamos quase integralmente através das descobertas por um mundo estranho que é o nosso. Como não temer pela vida de Sr. O’Brien num determinado minuto ou não correr com o próprio Jack numa fuga desesperada se esses momentos são conduzidos com maestria pelo promissor ator? Eis alguém que espero ver muitas vezes projetado numa tela de cinema. Simplesmente fabuloso!

Até o fim dos tempos, é o que escutamos num determinado trecho que conduz ao derradeiro fim quando os créditos sobem e as luzes se acendem. Mesmo o extremado, mas não desnecessário, cunho religioso com o qual Terrence Malick constrói seu poema é emocionante. A Árvore da Vida tem aproximadamente duas horas e vinte minutos de projeção, mas caso se estendesse até as seis horas almejadas por seu diretor, certamente se manteria como uma experiência única, ímpar, dessas que a arte só cria de tempos em tempos e jamais é esquecida.

 

 

Crítica por: Caio Viana (Blog)

 

 

A Árvore da Vida

 

Hollywood é a maneira genérica que a mídia encontrou para taxar o cinema feito nos Estados Unidos. Obviamente existem outros polos cinematográficos no país e nem todos os filmes se tratam de Blockbusters, mas ainda assim a associação é inevitável – pensou cinema norte-americano, pensou em Hollywood.
Em “A Árvore da Vida”, o diretor e roteirista Terrence Malick faz um trabalho tão não ortodoxo que mesmo sabendo da pluralidade da produção estadunidense é difícil chamá-lo de hollywoodiano.

Muito similar aos trabalhos recentes de Lars Von Trier, “A Árvore da Vida” se inicia com uma série de imagens de uma plasticidade invejável acompanhada de uma trilha sonora composta por grandes obras clássicas (são 37 peças ao todo), uma constante durante todo o filme. A sucessão de imagens desconexas busca uma espécie de efeito não narrativo: elas no máximo insinuam, muito mais do que contam. São momentos felizes de uma típica família americana vivendo no típico subúrbio norte-americano das casinhas de cerca branca na década de 1950 mesclados a cenas do que seria a evolução do planeta desde o Big Bang passando pelos dinossauros.

Malick convida o espectador para uma viagem através de sua câmera privilegiada que retrata da mesma maneira intimista o drama familiar e as explosões cósmicas. É inegável a qualidade e o impacto causado pela mesma em grande parte devido à fotografia de Emmanuel Lubezki.

É difícil fazer uma sinopse do longa, uma vez que fica claro desde os primeiras sequências que a intenção do diretor é descrever “A Vida”, em todas as nuances, detalhes e subjetividade. Em seus momentos mais narrativos, “A Árvore da Vida” fala das relações conturbadas dentro da família suburbana – o único indício de que se trata de filme um made in USA – a morte de um dos membros, o nascimento dos filhos, a criação rígida do pai (Brad Pitt) etc. Na outra ponta da história, já no presente, Sean Penn, como Jack, é um dos filhos do casal que em meio a uma aparente crise de meia-idade pondera sobre a vida e a forma como lida com a morte.

Embora as atuações sejam consistentes, inclusive o elenco-mirim, o roteiro – escrito pelo próprio Malick –, com sua falta de um direcionamento prejudica o andamento do longa.

Em seu pretensioso intento, Malick cria uma obra bastante hermética e um tanto quanto excessiva. Esquecendo talvez de uma das grandes qualidades do cinema de seu país – mesmo naqueles filmes mais autorais –, o diretor opta por excluir a narratividade em favor da plasticidade e ao longo das mais de duas horas de projeção a constante abstração se torna maçante. “A Árvore da Vida” não vai a lugar nenhum, não diz nada, é apenas um experimento cinematográfico sobre sensações, sentimentos e a condição humana.

Como reflexão sobre a existência talvez seja válido, mas como filme é sofrível.

 

 

Crítica por: José Messias

 

 

A Árvore da Vida

 

Filosofia e religião. Altruísmo e perdão. Alicerçado nesses quatro dogmas do ser humano, Terrence Malick ressurge com um filme surpreendentemente belo e reflexivo que nos da a sensação de que duas horas e vinte dentro do cinema passam voando.
Depois do fiasco de bilheteria de seu último longa, o pretensioso Novo Mundo, de 2005, Malick finalmente parece ter feito as pazes consigo mesmo e se calçou num tema aparentemente simples para, dentro do seu singelo estilo peculiar, se encaixar perfeitamente com sua direção magistral e, claro, com suas famosas marcas registradas: solilóquios, 90% de externas e takes precisos da natureza.

Num tom nostálgico, a história se passa no núcleo de uma família de classe média americana da década de 50 com foco na relação de um pai (Brad Pitt) com seu filho mais velho (Sean Penn, na fase adulta). Na trama, digamos assim, essa relação é desconstruída de forma que podemos ver o seu antes, o durante e o depois. Do Big Bang até o fim dos tempos.

Com uma escassez de diálogos que, quando são ditos, aparecem apenas para pontuar ou salientar uma situação já pré-estabelecida apenas com imagens, o longa é de uma beleza ímpar e com interpretações dignas de reverências. Pitt e Penn estão tirando de letra – com destaque maior para o primeiro. Jessica Chastain, que interpreta a mãe, e os atores mirins que fazem os filhos do casal estão excelentes.
Malick consegue com essa Ávore da Vida (Tree of Life) nos sensibilizar nos levando a questionar com esmero os detalhes de cada ação nossa, seja ela física ou emocional, e sua reverberação que disseca nossa fragilidade como seres humanos.

A Árvore da Vida aproxima o foco na relação entre pai e filho de uma família comum, e expande a ótica desta rica relação, ao longo dos séculos, desde o Big Bang até o fim dos tempos, em uma fabulosa viagem pela história da vida e seus mistérios, que culmina na busca pelo amor altruísta e o perdão.

 

 

 

A Árvore da Vida

 

O ganhador da Palma de Ouro em Cannes, chega aos cinemas brasileiros e se alia à boa fase de estreias. Árvore da Vida mostra o início, a criação do mundo e em paralelo (uma analogia) a criação dos filhos. Com Brad Pitt Sean Penn no elenco, o longa de Terrence Malick explora alguns dos recursos utilizados pelo diretor, em seu último longa O Novo Mundo e de cineastas como Eisenstein, para contar sua história.
A começar pela narrativa, que apesar de fragmentada é linear. A história da família, contada através de imagens (de sua formação e da criação do mundo: como o Big Bang, dinossauros, vulcões…), offs do casal O’Brien e de seus filhos (sussurros, depoimentos, pensamentos e diálogos), fragmentos de acontecimentos na família e ações sem palavras.

O filme inicia com belas imagens apocalípticas, com um telefonema. A mãe recebe uma notícia ruim, logo depois o quadro é do pai, Sr. O’Brien (Brad Pitt) atendendo um telefonema. A notícia também é ruim. Entende-se que é Sra. O’brien telefonando para o marido, e dando a notícia da morte do filho. E é assim que o longa funciona. Nada é explicado, apenas mostrado, como um quebra-cabeça, os espectadores ligam as imagens às ações e aí a história é contada.

E é à partir desta morte, que Malick, utilizando o recurso do flashback, narra a história da criação dos filhos, neste caso, a família O’Brien. Para os que viram Novo Mundo, de mesmo diretor, devem se lembrar das narrações em off e depoimentos, enquanto a imagem visualizada era outra. Como por exemplo, John falando sobre Pocahontas (com voz em off) e a imagem dela nos campos. Pois este recurso faz parte também desta narrativa, aprimorada. Além das narrativas, os fragmentos. São eles que, mesmo que rápidos e diretos, mostram aos espectadores o caráter de cada personagem. Em momentos decisivos.

Nos depoimentos, também pode-se perceber diferenças nos pensamentos, enquanto o pai tem um discurso de ensinamentos aos filhos , que se baseiam na formação deles e são profundamente rígidas, típicas de um pai tentando ensinar e configurar uma hombridade aos filhos; a mãe é mais delicada, e exibe um discurso esperançoso e amoroso (como ensinando aos filhos a amarem os próximos); já o filho mais velho, o rebelde, afirma o repúdio ao pai (rigoroso com ele) e sua revolta contra a família, suas dúvidas quanto à formação imposta pelo pai. No futuro, Jack (Sean Penn) continua com suas contestações e tenta entender como os pais conseguiram viver após a perda do primogênito.

Tudo isso, intercalado com takes do planeta terra em sua formação. Malick utiliza também o recurso da dialética na montagem de seu filme, onde as imagens sobrepostas às sequências de ações (com ou sem diálogos) proporcionam aos espectadores o poder da tese, antítese e síntese. E que se somada às imagens e sequências fragmentadas, bastam para a narrativa; é assim que o diretor se comunica com seus espectadores.

As atuações também adicionam ao longa qualidade. Brad Pitt mais uma vez interpretando um pai de família, faz com que os espectadores se esqueçam que um dia ele já foi um galã. O pai, sempre rigoroso e com ensinamentos rígidos e brutos; causando nos filhos revolta e ódio a ele. Mesmo com estas características, Pitt, conseguiu adicionar à interpretação cuidado com o personagem, causando nos espectadores empatia. Pois quem é pai, deve saber que se deve ter cuidados na criação. Mesmo ríspido, seco e violento (por vezes); pode-se perceber que isto faz parte da educação e que ao mesmo tempo ele os ama muito. Diretor e ator conseguiram imprimir tal preocupação.

Já a mãe é a parte frágil, e dúbia. O porto seguro dos filhos e a intermediária entre eles e o pai. Os filhos a todo tempo mostram suas dúvidas e medos. Que são consolados pela rispidez do pai e proteção da mãe. Sean Penn, o filho do meio, mesmo adulto, imprime os medos que quando jovem assolavam seus pensamentos e a falta do irmão.

Para alguns espectadores, Árvore da Vida pode parecer monótomo e incompreensível; mas para os acostumados com o cinema europeu e fascinados pela técnica de montagem terão uma bela experiência com esta preciosidade cinematográfica. Uma viagem à criação do mundo e dos filhos, realizado de forma poética e cruel.

Crítica por: Thais Nepomuceno (Blog)

 

 

A Árvore da Vida

 

O hypado diretor Terrence Malick estreou em Cannes o seu (apenas) quinto longa, em mais de três décadas de carreira. Conhecido pelas excentricidades, por ser antissocial e genioso, não compareceu ao festival, que mesmo assim não deixou de agraciá-lo com a Palma de Ouro. Mas desta vez o diretor não foi unanimidade. Agraciado fervorosamente por uns e depredado por outros, levou o prêmio na base da polêmica.
Ou talvez pelo medo do júri em dizer que o filme é simplesmente ininteligível. Sim, porque é de duvidar que todos tenham entendido a mensagem.

Feito para poucos, frustará aqueles que irão ao cinema por se tratar de um filme com Brad Pitt. Estes sairão logo no início da sessão. Talvez felizmente, porque são os primeiros trinta minutos os melhores do filme. É quando Malick explora imagens em alusão ao Big Bang e ao paraíso ou à dor dos pais pela perda de um filho.

Os pais, no caso, são interpretados por Brad Pitt e Jessica Chastain. Jessica é uma revelação, além de ser dona de uma beleza ímpar. Pitt é regular, como um pai extremamente autoritário, que dá aos filhos uma educação calcada em dois princípios: o religioso e o machista. Sua mulher e seus filhos têm para com ele uma relação de submissão, que beira a humilhação, nos padrões de um império do medo. Assim, os filhos têm no aconchego da mãe (e só durante a ausência do pai) a sua válvula de escape.

Além deste tempo e da atemporalidade das imagens abstratas, acompanhamos, por mais que infimamente, um dos filhos do casal, já mais velho, vivido por Sean Penn, ainda tentando cicatrizar as feridas do passado. O que pode frustrar a maioria é que os três tempos não tem, na verdade, amarras. São independentes entre si e podem ser interpretadas ao gosto do espectador. Isto pode ser bom, para quem não se incomode com o fato.

A cinematografia do sublime, dotado de um experimentalismo calculado e as visões apocalípticas plásticas e conceituais são o grande trunfo do longa. Um espetáculo que só poderá ser realmente apreciado numa (boa) sala de cinema. A câmera, nas sequências que acompanham a família, é completamente livre, quase desgovernada e o que impressiona é que nem por isso são menos belas.

Confesso que pelo menos através destas cenas pude sentir – mais do que refletir sobre – esta angústia dos pais. Pensando assim, tive uma ótima experiência sensitiva. Não tão impactante quanto o Koyaanisqatsi de Godfrey Regio, mas ainda assim válida. Só agradeceria se uns tais sussuros fossem retirados, pois os mesmos têm o efeito de um arranhar de quadronegro, com umas unhas bem compridas. E, apesar de ser a favor de histórias abertas, desta vez eu senti falta de uma explicação. Com um espírito filosófico talvez eu pudesse encontrar a mesma.

O diretor de fotografia Émmanuel Lubezki declarou à Cahiers du Cinema que a versão em blu-ray pode trazer um corte do diretor, com seis horas de duração. Isso porque Malick tinha inicialmente oito horas de filmagens nas mãos e teve que cortar seis delas para a versão dos cinemas. Com elas foi-se também a história do personagem de Sean Penn, que originalmente teria a mesma atenção que a do personagem de Brad Pitt, mas que no fim ficou com cerca de dez minutos. Das duas uma: ou as partes que faltaram para entender qual era a intenção do diretor estarão nesta nova versão ou confirmar-se-á que o projeto não tem realmente um nexo. Agora é pensar se ainda valerá a pena pagar para tirar a prova.
 

 

Crítica por: Fred Burle (Blog)

 

 

A Árvore

 

 

Sinopse: Dawn perde seu marido repentinamente, por causa de um ataque cardíaco, e tem de cuidar sozinha dos filhos. Simone, a única menina na família, acredita que o espírito do pai agora habita a árvore que fica na frente da casa deles.

A produção franco-australiana A Árvore (The Tree) tinha tudo para passar despercebida pelos olhos do público, mas dois fatores concederam ao filme certo destaque. A presença de Charlotte Gainsbourg (Anticristo) encabeçando o elenco por si só já é um atrativo, mas o longa também foi muito bem cotado durante sua passagem pela Mostra de Cinema de São Paulo.

Todo esse alarde em torno do título pareceu, pelo menos para esse crítico, descabido. O filme realmente tem suas qualidades, mas é mediano, em geral. É esperado que uma produção que ganha tanta falação positiva durante um dos festivais de cinema mais conceituados do Brasil seja realmente uma obra singular – o que não é o caso.

A Árvore merece elogios pela forma como sua história é conduzida, como somos convidados a ver a dinâmica de uma família que tem de mudar muito de sua rotina por causa de uma tragédia repentina. Entretanto, o enredo desenvolve-se e termina sem grandes sobressaltos, sem emoção à flor da pele.

Outro ponto positivo do filme está na ambiguidade que permeia a questão central de sua história. Se a árvore realmente abriga o espírito do finado esposo/pai não parece importar, mas não há como negar que indícios de que isso tenha acontecido não faltam. O que é mais interessante nesse sentido é a forma como esse aspecto mágico consegue encaixar-se com perfeição em um roteiro que, no demais, é bem realista.

 

 

 

Crítica por: Edu Fernandes (CineDude)

 

 

Articulador

 

 

Não deixa de ser estranho, e até mesmo agradável, o fato de uma fita pequena e pouco famosa como “O Articulador” estreiar em diversas salas do Brasil antes mesmo de ter uma data marcada para chegar às salas norte-americanas.

O motivo, provavelmente, é um só: Al Pacino. Muito admirado por estas terras ao sul do Equador, o ator é capaz de levar milhares de brasileiros aos cinemas simplesmente porque seu nome aparece nos créditos (casos semelhantes ocorrem por aqui com Robert de Niro, que, assim como Pacino, já não funciona mais como chamariz de bilheteria nos EUA, infelizmente…).

A pergunta é: o que seria de “O Articulador” sem a presença de um grande astro no elenco ? A resposta mais óbvia seria um “nada”, já que, sem Pacino, esta pequena produção ficaria restrita ao “circuito de arte” e sumiria das poucas salas num curto espaço de tempo. O fato dela também não ter nenhuma grande sacada que possa justificar um maior interesse por parte do público só complica sua situação.

“O Articulador” conta a história de um relações públicas chamado Eli Wurman (Pacino), que cuida da carreira de alguns astros da TV e do cinema, e que ainda arranja tempo para promover eventos beneficientes em Nova York. À pedido de seu maior cliente, o famoso ator Cary Launer (vivido por Ryan O’Neil), Eli vai até uma cadeia pagar a fiança de uma atriz de TV que acabou de chegar à Big Apple (Jili, interpretada por Tea Leoni.).

Eli então leva a moça para um hotel, e, num convite dela, os dois acabam abusando das drogas. Deitado na banheira e completamente chapado, Eli vê um homem se aproximar da jovem atriz para matá-la, mas ele não se levanta, já que seu estado naquele momento o impede sequer de distinguir a realidade de alucinações.

No dia seguinte, Eli sai do hotel sem perceber que Jilli estava morta, e acaba se envolvendo numa conspiração que envolve diversos setores da alta sociedade nova-iorquina, tendo como pano-de-fundo a campanha política que pretende lançar Cary Launer ao Senado.

“O Articulador” equilibra o drama pesado e extremamente cansativo do personagem com o thriller (nunca menos do que interessante) dos acontecimentos em que ele se envolveu. Por vezes, a lentidão do drama pessoal vivido por Eli Wurman acaba se sobrepondo.

Por estar constantemente dopado (já que usa drogas para dormir), Eli leva uma vida modorrenta, arrastada, trôpega. Mal tem tempo para descansar e cuidar de sua saúde. É exatamente esse ritmo de vida estressante do personagem que faz do filme uma experiência difícil e depressiva. O cansaço de Eli, em alguns momentos, sai da tela e atinge o público, que acaba compartilhando das mesmas sensações, goste ou não.

Mas mais interessante (apesar de pouco original) é o enfoque crítico que o filme dá aos bastidores da fama e do showbizz. Todos os atos das estrelas parecem ser friamente calculados, aparições em jornais e festas são negociadas à exaustão, envolvimento em escândalos são encobertos à todo custo. É exatamente esse o papel de Eli: ele transforma o sujeito aproveitador e mercenário no cordeirinho inofensivo que dá dinheiro à Hollywood.

Por ser semi-independente, pode-se dizer que o filme tem uma liberdade maior para expor todas as maracutaias que acontecem por trás do pano da fama com uma maior carga de acidez e rispidez.

Há uma cena-chave que, apesar de ser um gigantesco clichê, resume a posição que “O Articulador” parece tomar: Eli, depois de ter vomitado no banheiro da festa que organizou, encontra-se com um aspirante à astro, deslumbrado por ter avistado o famoso Cary Launer na mesma festa. Depois de olhar para a cara do sujeito, que ainda está feliz por ter encontrado seu ídolo, Eli diz: “Que você continue sendo esse jovem ingênuo, sempre”. É a ingenuidade que o impede de enxergar toda a podridão e a corrupção existentes além dos sorrisos e da maquiagem do ator que admira.

O filme ao menos tem a coragem de manter essa mesma postura em toda a sua duração, e passa longe de ser uma bobagem que não critica ninguém. Pelo contrário: algumas estrelas de Hollywood certamente se sentirão retratadas na tela, e não ficarão nada felizes com isso.

Mesmo assim, há alguns problemas bastante primários na fita. A personagem de Kim Basinger, por exemplo, não tem uma função específica, resumindo-se a aparecer nas vezes em que o personagem de Al Pacino encontra o fundo do poço.

Há também uma certa dose exagerada de pretensão por parte do diretor, que na meia hora final acaba pesando um pouco a mão em cima da condução do filme, extendendo desnecessariamente cenas que poderia ser mais curtas. A cena que fecha a trama , por exemplo, é ridícula: Dan Algrant (o diretor) vira a câmera de ponta-cabeça, e filma Manhattan desta maneira, como se isso fosse a coisa mais revolucionária e genial do mundo.

Mas o que vale realmente a pena em “O Articulador”, além de suas interessantes (porém nada originais) idéias sobre o showbizz, é a fabulosa atuação de Al Pacino. Cansado, envelhecido, e até um pouco efeminado, Pacino dá ao seu personagem uma profundidade inesperada, e acaba envolvendo a platéia no drama pessoal e profissional de Eli Wurman. O filme é dele, e de mais ninguém.


Crítica por:
Diego Sapia Maia