sábado, abril 27, 2024

Sexta-Feira Muito Louca | Os 20 anos de um dos melhores remakes do século…

Remakes são perigosos. Por inúmeros motivos. Por exemplo, quando alguma mente brilhante da grande indústria cinematográfica hollywoodiana resolve criar uma releitura de um clássico, é quase inegável admitir que ele colocará sua própria perspectiva, ou até mesmo realizar alguns “ajustes” consideráveis e justificáveis para torná-lo mais contemporâneo. No final das contas, o produto que nos é entregue se assemelha mais a um simulacro, a uma concha vazio, que uma necessidade para o mundo do entretenimento, perdendo a essência do original e transformando-se em mais uma obra descartável. E é de forma muito assustadora que o remake de Sexta-Feira Muito Louca’, lançado em 2003, não apenas funcionou em quase todas as suas instâncias, mas em várias delas mostrou-se superior ao original de 1976. 

Mark Waters não havia feito muito em seus poucos anos como cineasta – seu único filme relembrado pelas razões erradas, Cinco Evas e um Adão’, na verdade tornou-se um fracasso de crítica e de público e colocou em xeque seu promissor nome na indústria. Qual foi a surpresa quando resolveu readaptar a obra de Mary Rodgers para as telonas, talvez simplesmente porque o livro caiu em suas mãos, ou talvez porque o longe protagonizado por Jodie Foster envelhecera de modo ruim. De qualquer modo, ele conseguiu “se salvar”, por assim dizer, e parece ter pensado em cada uma das peças desse quebra-cabeça audiovisual para criar mágica – e tal mágica se deve principalmente aos nomes que fazem parte da narrativa. 

A trama principal gira em torno de duas personalidades ao mesmo tempo contraditórias e fortes: Tess Coleman (Jamie Lee Curtis mergulhando no mundo da comédia), uma autora, psicóloga e empreendedora dona de um império inegável, e sua filha Anna (Lindsay Lohan, a queridinha do Walt Disney Studios), uma adolescente do ensino médio que se preocupa com sua individualidade e sua banda de rock. Apenas passando os olhos por essa premissa, é quase automático pensar no que acontece: tais protagonistas lutam pela sua voz e por um entendimento que na verdade nunca vai existir, visto que a perspectiva de cada uma delas é a correta, e a outra é a errada. Logo no começo do primeiro ato, vemos a pró-atividade da matriarca em gerenciar sua casa, seu iminente casamento com o galã Ryan (Mark Harmon) e sua carreira de grande sucesso; tudo isso se contrapõe com a preguiça e a rebeldia de Anna, as quais passam por inúmeros altos e baixos até que chegamos no famigerado ápice. 

Tess e Anna possuem uma relação quase opressora, seja de um lado, seja de outro. A adolescente não compreende que a mãe tem o direito de ser feliz e de seguir em frente mesmo com a morte acidental do ex-marido, e esta, por sua vez, não compreende a necessidade de autoexpressão da filha e de encontrar lugar no perigoso mundo do colégio. Todas essas discussões ficam mais acaloradas dentro de um restaurante oriental de suma importância para o desenrolar dos eventos – incluindo uma mística transição de corpos que vem como forma de ajudá-las. 

Sim, é isso mesmo: com a chegada do segundo ato, Tess e Anna trocam de corpo e se veem no dilema de como reverter uma situação que, até o dia anterior, seria impossível. E com a chegada do matrimônio e da apresentação de bandas, é quase ridículo pensar que elas têm menos de 48 horas para entender o que aconteceu e consertar a situação – sem perceber, a priori, que a resposta está mais perto do que imaginam. Visto que os problemas ganharam uma força inenarrável a partir desse confronto de personalidades, elas devem compartilhar de uma empatia necessária, compreendendo o outro lado e alcançando uma evolução que ambas não partilhavam. 

O filme eventualmente poderia cair nos problemas do original e pender excessivamente ao drama; entretanto, Waters, em conjunto com a roteirista Heather Hach, seguiram em uma fórmula muito acessível às construções de blockbusters hollywoodianos que busca equilibras os inúmeros gêneros, iniciando com uma comédia pura até fundir-se com o drama e suas vertentes – incluindo o coming-of-age. Os antagonistas existentes não são vilões personificados, por assim dizer, mas sim encarar uma nova perspectiva e saber lidar com os problemas e dificuldades pelos quais cada uma passa: Anna, por exemplo, no corpo de sua mãe, deve lidar com uma corrida vida profissional que lhe consome, enquanto Tess percebe o quão incompreendido o cotidiano da filha é. 

Não deixe de assistir:

Talvez um dos grandes pontos positivos da obra tenha sido repaginar saídas convencionais já usadas em uma modernização muito bem-vinda e que é reforçada até mesmo pelos personagens coadjuvantes. Todos os acontecimentos também são reafirmados pela fotografia muito bem-pensada por Oliver Wood, que se preocupa em criar dois cosmos diferentes para as protagonistas e depois uni-los em uma amálgama coesa e coerente com o arco de redenção e de arrependimento de cada uma  delas. 

‘Sexta-Feira Muito Louca’, como já dito, foi uma surpresa; ainda que sempre fiquemos com um pé atrás em relação a remakes, essa investida mostrou que não podemos julgar um filme pela história que resolve apresentar, mas sim como a apresenta e de que modo ela se mostra necessária para um novo público – e até mesmo para uma nova perspectiva narrativa. 

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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