Crítica | Altered Carbon – Ficção Científica futurística da Netflix é complexa o suficiente

Admirável Novo Mundo

Antes de começar este texto analisando todos os dez episódios da primeira temporada de Altered Carbon, nova série da Netflix, que o CinePOP teve a oportunidade de conferir de antemão, gostaria de dizer que você pode ler nossas primeiras impressões (dos três primeiros episódios) neste link. É seguro dizer também, como previsto, que os primeiros episódios apenas arranharam a superfície da complexidade do que de fato é o seriado. E para ter uma ideia, comparar a Blade Runner seria até injusto – apesar de universos visualmente similares. Pois aqui, o buraco é (muito) mais embaixo – como dizem.

A complexidade do roteiro de Altered Carbon é admirável, ao mesmo tempo se tornando seu calcanhar de Aquiles. A ficção científica é um gênero muito específico, que até hoje cria enorme barreira com grande parte do público. E este programa é o que podemos definir como ficção científica de raiz. Novos conceitos são apresentados em nome do futuro a cada episódio e cada nova guinada, fazendo da série um produto não acessível para quem está acostumado a um consumo rápido e descartável, de ideias recicladas, das quais sabemos exatamente para onde o roteiro irá nos levar.

Altered Carbon não é a reinvenção da roda, e sim, igualmente está preso a uma narrativa estrutural conhecida. O que chama atenção na série, e constitui sua maior vantagem, é a força com que cria novos conceitos e se apoia na tecnologia de pensamentos do futuro. A base deste novo mundo é a vida eterna. Ou quase. Aqui, os humanos descobriram um jeito de passar suas consciências para dentro de uma máquina, um artefato do tamanho de um disco de hóquei, que pode ser transferido para outro corpo – conhecidos aqui como “capas” (nossa carroceria), mantendo-nos vivos por centenas de anos. O corpo cansa, fica velho e morre, mas não nossas mentes. Desta forma, temos seres humanos vivendo até 200 anos – ou mais.

No meio desta nova realidade, temos uma trama de investigação, que remete direto aos clássicos de detetives do cinema noir. Um homem é contratado por um magnata, para descobrir seu assassino. Sim, você leu certo. Como apenas o corpo morre, após ser assassinado, o ricaço, papel de James Purefoy, transfere sua consciência para uma cópia de seu corpo, e segue com sua vida como se nada tivesse acontecido. O whodunit é apenas uma das subtramas, no entanto, dentro de um verdadeiro emaranhado ao longo dos dez episódios da primeira temporada.

Temos também conspirações, organizações revolucionárias que visam derrubar o poder, dramas familiares, tramoias dentro da força policial, traições, alianças e todos os elementos que formam um bom suspense dramático.

Não existem grandes nomes na frente das telas, e o seriado segura-se em algum carisma do protagonista Joel Kinnaman. O ator sueco, que ainda não deu sorte ao estrelar uma superprodução (RoboCop de José Padilha – injustiçado – e Esquadrão Suicida que o digam), e aqui interpreta Takeshi Kovacs, dividindo o mesmo personagem com dois outros atores. Na verdade, Kinnaman é a nova “capa”. Originalmente, Kovacs é Will Yun Lee, e Byron Mann na fase mais velha. O asiático é um sobrevivente dos abusos do pai ainda na infância. O menino é forçado a matar o pai abusivo, que havia assassinado a mãe, e a fugir com a irmã mais nova. Na fase adulta, já trabalhando com a polícia, ele reencontra Reileen, a irmã, trabalhando com os rebeldes. Os dois se veem em lados opostos da lei, mas o elo de sangue fala mais alto, e logo a dupla está trabalhando junta novamente.

Altered Carbon aposta num roteiro intrincado, ao mesmo tempo dando espaço para o desenvolvimento dos personagens, de uma forma que não vemos muito atualmente. Fora isso, o visual é incrível e o futuro detalhado. Dá para perceber a cada cenário, a cada vislumbre amplo da fotografia na composição da cidade, a cada efeito especial que enche os olhos – mesmo para uma série – que esta foi uma produção caríssima, talvez um dos orçamentos mais largos da empresa até o momento. E igualmente uma aposta bem arriscada, coisa que a Netflix está cansada de fazer para sair do lugar comum e entregar ao público obras fora da caixinha. É louvável, e Altered Carbon já nasce cult. O problema é que produções assim raramente se tornam fenômenos, aceitos por todos.

No terceiro ato da série é quando a coisa pega fogo verdadeiramente. E aí somos apresentados a Reileen na fase adulta, a irmã do protagonista, interpretada pela belíssima e exótica Dichen Lachman. Esta lembrança dolorida do passado do herói retorna e possui um grande significado para todo o mistério em torno da trama principal. Lachman possui grande presença de cena e dá novo gás à série em sua reta final, ligando todos os pontos deixados soltos.

Altered Carbon capricha na violência, com muito sangue, mortes terríveis, chacinas, desmembramentos, e continua a aumentar a censura com níveis intensos de sexualidade. O programa esquenta a temperatura com cenas ardentes entre o protagonista e a pequena Martha Higareda, que vive a policial Ortega (o corpo que o protagonista “veste” agora, de Kinnaman, é o do parceiro da agente, morto em serviço), com a dondoca Miriam (Kristin Lehman), e trata de confeccionar a cena de luta mais sensual entre duas mulheres da história, com Lachman nua em pelo se digladiando com Higareda.

Mesmo com todos os atrativos e a qualidade técnica tão minuciosa, vista poucas vezes nas telinhas, Altered Carbon utiliza momentos que poderiam ser aparados sem prejudicar o todo. O defeito talvez não seja tanto do programa e sim do formato. Em dez episódios, difícil é achar uma série que não encha o tempo com trechos dispensáveis. Elas até existem e para isso a solução tem sido programas menores. Ou seja, os desvios por estradas secundárias talvez não levem a nada aqui, mas não deixam de ser encantadores de se  embrenhar sem destino.

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