domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Annette é uma ópera rock de amor, horror e tristeza

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Nove anos após impressionar a crítica com Holy Motors (2012), no Festival de Cannes, o cineasta Leo Carax mostra-se inventivo novamente. Seu último filme ganhou a chancela de um das obras mais bizarras da história, no entanto, a ópera rock Annette  – na abertura do 74º Festival de Cannes é menos chocante e mais triste. 

Com roteiro e canções escritas pelos irmãos Ron Mael e Russell Mael, da dupla Sparks, o filme tem um tom de comédia, como um fantasma saído do mar (tal e qual Samara do poço, em O Chamado [2001]), e situações surreais, porém a tragédia se sobressai. O musical inicia-se ao som de So May We Start, como um convite ao espectador. Ao final deste ato, o casal de artistas, Henry (Adam Driver) e Ann (Marion Cotillard), se separam e cada um sobe ao palco do seu próprio espetáculo. 



Ele é um humorista em decadência, já ela uma cantora soprano prestigiada. A longa cena de stand up comedy é enfadonha, mesmo que faça uma boa composição com o enredo do musical. Afinal existe uma guerra de egos na tensão entre os dois. Chama atenção igualmente, a interação com a plateia como um coral a proclamar cânticos de forma bem ensaiada. 

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Em outro canto, Ann alcança níveis elevados com a sua voz e desperta emoções nas pessoas. Em um encontro entre os dois, Henry diz: “massacrei a plateia”, enquanto ela replica: “eu os fiz viver”. Ao passo que ela cresce, ele se extingue dos palcos. O relacionamento dos dois é apresentado em cenas de tabloide, mas principalmente em uma belíssima sequência musical de sexo e canto, rara de ver ao cinema, senão inexistente. 

Para além da canção We Love Each Other So Much, o romance entre os dois soa desconexo. A chegada da filha Annette abre um novo e curioso ato da ópera. Desde o parto, Annette é vivida por uma boneca autômato. Seus movimentos e feições são milimetricamente pensados e tímidos. É um espetáculo à parte acompanhar seus movimentos. 

A tensão entre Ann e Henry aumenta, assim como em uma ópera à espera do momento de redenção. Antes deste instante, no entanto, ocorre violência, loucura, morte e exploração. Embora secundário, o personagem do condutor de piano e orquestra, vivido por Simon Helberg (o Howard, da série The Big Bang Theory) possui os momentos de maior potência aflitiva, quando ele revela um segredo surpreendente da trama. 

Falar sobre a resolução deste casal e do futuro da pequena Annette quebraria alguns mistérios. O roteiro de Annette é simples, entretanto, inclui surpresas. A disposição e composição teatral, folhetinescas e vilã de Adam Driver casa-se perfeitamente ao enredo. Além disso, é confortável entender e encontrar uma lógica para que Annette seja representada por um autômato. Desse modo, Annette é um musical regular, isto é, com personagens autocentrados e acontecimentos trágicos, assim como nos teatros antigos e, claro, em todas as óperas.

*Visto no Festival de Cannes 2021. Previsão de estreia na Amazon Prime Video a partir de 20 de agosto nos EUA.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Nove anos após impressionar a crítica com Holy Motors (2012), no Festival de Cannes, o cineasta Leo Carax mostra-se inventivo novamente. Seu último filme ganhou a chancela de um das obras mais bizarras da história, no entanto, a ópera rock Annette  – na abertura do 74º Festival de Cannes é menos chocante e mais triste. 

Com roteiro e canções escritas pelos irmãos Ron Mael e Russell Mael, da dupla Sparks, o filme tem um tom de comédia, como um fantasma saído do mar (tal e qual Samara do poço, em O Chamado [2001]), e situações surreais, porém a tragédia se sobressai. O musical inicia-se ao som de So May We Start, como um convite ao espectador. Ao final deste ato, o casal de artistas, Henry (Adam Driver) e Ann (Marion Cotillard), se separam e cada um sobe ao palco do seu próprio espetáculo. 

Ele é um humorista em decadência, já ela uma cantora soprano prestigiada. A longa cena de stand up comedy é enfadonha, mesmo que faça uma boa composição com o enredo do musical. Afinal existe uma guerra de egos na tensão entre os dois. Chama atenção igualmente, a interação com a plateia como um coral a proclamar cânticos de forma bem ensaiada. 

Em outro canto, Ann alcança níveis elevados com a sua voz e desperta emoções nas pessoas. Em um encontro entre os dois, Henry diz: “massacrei a plateia”, enquanto ela replica: “eu os fiz viver”. Ao passo que ela cresce, ele se extingue dos palcos. O relacionamento dos dois é apresentado em cenas de tabloide, mas principalmente em uma belíssima sequência musical de sexo e canto, rara de ver ao cinema, senão inexistente. 

Para além da canção We Love Each Other So Much, o romance entre os dois soa desconexo. A chegada da filha Annette abre um novo e curioso ato da ópera. Desde o parto, Annette é vivida por uma boneca autômato. Seus movimentos e feições são milimetricamente pensados e tímidos. É um espetáculo à parte acompanhar seus movimentos. 

A tensão entre Ann e Henry aumenta, assim como em uma ópera à espera do momento de redenção. Antes deste instante, no entanto, ocorre violência, loucura, morte e exploração. Embora secundário, o personagem do condutor de piano e orquestra, vivido por Simon Helberg (o Howard, da série The Big Bang Theory) possui os momentos de maior potência aflitiva, quando ele revela um segredo surpreendente da trama. 

Falar sobre a resolução deste casal e do futuro da pequena Annette quebraria alguns mistérios. O roteiro de Annette é simples, entretanto, inclui surpresas. A disposição e composição teatral, folhetinescas e vilã de Adam Driver casa-se perfeitamente ao enredo. Além disso, é confortável entender e encontrar uma lógica para que Annette seja representada por um autômato. Desse modo, Annette é um musical regular, isto é, com personagens autocentrados e acontecimentos trágicos, assim como nos teatros antigos e, claro, em todas as óperas.

*Visto no Festival de Cannes 2021. Previsão de estreia na Amazon Prime Video a partir de 20 de agosto nos EUA.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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