Jornada na Psicose Humana
Poucos episódios desta quarta temporada de Black Mirror são tão satisfatórios quanto este (agora) primeiro. Se formos seguir literalmente, nenhum é, já que este é o melhor do novo lote. À primeira vista vendido como uma sátira/homenagem de Star Trek – icônica série de ficção científica criada por Gene Roddenberry – USS Callister vai desvendando suas camadas e fazendo aparecer muito mais do que esperávamos.
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O episódio pega de surpresa, e esta é a alma do negócio. Todos os outros episódios foram um pouco diminuídos por suas prévias e premissas anunciadas, sem fugir muito do que imaginávamos sobre eles. USS Callister é diferente, pois a cada guinada nos deixa sem adivinhar o que vem a seguir, e esta imprevisibilidade é grande parte do que constitui Black Mirror, e que andou muito em falta nesta temporada.
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Como dito, o episódio parece apenas uma trama de uma piada só, no entanto, segue para terrenos bem mais sombrios. USS Callister exibe muito subtexto, e existem inúmeros itens a serem destacados e discutidos. A esta altura vale dizer também que é sempre preferível ter assistido ao episódio antes de ler uma crítica como esta, pois alguns spoilers podem escapar – afinal é difícil falar sobre uma trama complexa como esta sem adentrar alguns de seus segredos.
A seu favor, e de seu desenvolvimento narrativo e de personagens, temos que levar em conta que USS Callister é o episódio mais longo, com 1 hora e 16 minutos de projeção, possibilitando este exímio detalhamento. Existe todo um paralelo interessantíssimo também sobre trocas de papeis, de heróis e vilões, no mundo virtual e mundo real, que vale a pena ser ressaltado.
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Na trama, Jesse Plemons é Robert Daly, um tímido nerd sem muita voz mesmo dentro da grande empresa que ajudou a criar. Ele é o programador, o cara que fica nos bastidores, totalmente subjugado por seu parceiro profissional, Walton (papel de Jimmi Simpson, de Westworld), a face da companhia. Além disso, nenhum dos funcionários o respeita ou sequer notam sua presença. Daly, o patrão, que era para ser visto como forte líder, é considerado por todos como o perdedor do pedaço. Mas isso muda toda noite quando ele chega em casa e mergulha no mundo virtual especialmente criado por ele, que tem tudo a ver com a citada série espacial famosa – aqui tratada por outro nome.
Este tal mundo vai além de um programa de TV, que serviu apenas como sua base. É uma mistura entre jogo de última geração, com direito a consciências virtuais, e simuladores de inteligências artificiais. Ou seja, USS Callister verdadeiramente resgata o espírito do que é Black Mirror, criando uma tecnologia tão complexa e fictícia, que está a muitos anos no futuro além de nossa compreensão. Mostrando que é verdadeiramente o melhor episódio, USS Callister vai além, dando diversas guinadas na trama, subvertendo personagens e acrescentando muito do típico teor dark e barra pesada ao qual estamos acostumados nessa série que “desgraça nossa cabeça”.
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USS Callister mostra também que não é necessário um diretor renomado para entregar um bom episódio. Pelo contrário, Toby Haynes, um nome desconhecido do grande público, mostra que tem mais fome, e querer se provar mais, do que cineastas renomados e acomodados. Haynes vem de programas como Doutor Who e Sherlock, e domina bem a estrutura narrativa de poucos minutos, mostrando aqui estar inclusive pronto para o cinema.
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USS Callister é aquela pancada gostosa, o tapa na cara, o tiro que estamos acostumados a levar quando o assunto é Black Mirror. E do qual gostamos muito. Fora isso, existem inúmeras referências para os aficionados pelo universo de Roddenberry – um dos mais legais é a mudança no estilo estético, quando uma evolução ocorre e os integrantes da nave parecem pertencer aos novos filmes, produzidos por J.J. Abrams, reparem na ótima sacada com os uniformes, visual e os Lens Flares. Hilário.