terça-feira, maio 7, 2024

Crítica | Nostalgia e muito charme na 1ª temporada de ‘I Am Not Okay With This’

As comédias dramáticas adolescentes ganharam popularidade imensurável entre os anos 1980 e 1990, viralizando com um público mais jovem que se deliciava com retratos interessante (e comumente hilários) da vida juvenil em seus círculos sociais e, mais do que isso, no colégio. É claro que, levando em consideração o teor ficcional das obras, grande parte das narrativas pendia para um lado mais irreverente e impalpável, tudo para que mantivesse sua carga emocional e envolvente explorada ao máximo.

Com a virada do século, outras produções começaram a ser revitalizadas e trazidas para um espaço mais contemporâneo e menos maniqueísta, por assim dizer: a construção estereotípica de certos tipos sociais deu lugar a filmes como ‘Meninas Malvadas’, ‘A Mentira’ e ‘Quase 18’, representando uma evolução considerável no jeito de contar esses enredos. Em 2020, chegou a vez da Netflix investir seus esforços na adaptação dos clássicos quadrinhos ‘I Am Not Okay With This’, assinados por Charles Forsman (o mesmo criador da bizarra e aclamada graphic novel que deu origem a ‘The End of the F***ing World’). Aliás, é perceptível o apreço que a gigante do streaming nutre por tramas que vão além do que imaginamos e que misturam, em um mesmo cenário, os elementos da estética gore, as quebras de expectativas das ácidas rom-coms e uma pitada arrepiante de suspense sobrenatural.

Querido Diário é a frase que sumariza e abre cada um dos breves sete capítulos da primeira temporada – cujo gancho já nos prepara para um próximo ciclo com muito mais amadurecimento e relações conturbadas entre seus personagens. A narradora, encarnada por Sophia Lillis em mais uma fantástica atuação que revela um lado mais recuado e introvertido que o visto em ‘It: A Coisa’ e afastando-se do comportamento maternal em ‘Maria e João’, posta-se na figura da rebelde Sydney Novak, uma jovem de dezessete anos que vive com a mãe e o irmão numa pequena e claustrofóbica casa depois que o pai se suicidou sob misteriosas circunstâncias. O trágico escopo ganha uma nova camada quando Sydney começa a desenvolver poderes estranhos e inexplicáveis, que vem à tona em momentos de grande frustração, raiva ou rancor.

Jonathan Entwistle e Christy Hall, que entram como showrunners da produção, carregam consigo uma vantagem incrível, visto que estão frente a frente com o material original e já trazem elementos de iterações anteriores para repaginá-las a uma nova mídia, adornando uma trama modernizada com resquícios clássicos do suis-generis mencionado no primeiro parágrafo. Desde a presença de uma perspectiva onisciente até o desmembramento em linhas secundárias que, apesar de superficiais, se entrelaçam em uma costura compreensível e que talha um grandioso potencial para o futuro.

Lillis comanda a série com a mesma fluidez já entregue ao público, desenvolvendo sua personalidade traumatizada como respaldo de relações com outros membros de sua contida esfera: apesar de solitária, ela tem um sentimento de afeição gigantesco com Dina (Sofia Bryant), sua melhor amiga e confidente – sentindo-se assustada por perceber que os laços de amizade podem não ser o suficiente. Além disso, a atriz reúne-se com seu colega Wyatt Oleff, que encarna o desinibido Stanley Barber (um nerd independente que descobre da maneira mais chocante possível que sua paixão secreta é dotada de habilidades incríveis. Aliás, é até engraçado observar como Lillis e Oleff trocam de lugar, abandonando as características de seus personagens anteriores e vestindo trajes diferentes do que já havíamos visto.

Se o roteiro já nos chama a atenção por seu cuidado redobrado, é a inebriante e saudosista estética que nos faz mergulhar de cabeça nesse mundo localizado nos entremeios do impossível e do aterrorizante. A equipe criativa não pensa duas vezes antes de imprimir uma versão revitalizada de inúmeros longas-metragens icônicos e atemporais: a paleta de cores oscila das vestimentas impetuosas de ‘Juno’ até as escolhas pastéis de Wes Anderson para ‘O Grande Hotel Budapeste’; ‘O Clube dos Cinco’ volta com força e relembra seus tempos de glória ao ser inspiração para um episódio inteiro; e, gradativamente, a leve atmosfera transforma-se num sombrio mimetismo de ‘Carrie – A Estranha’, culminando em um season finale inesperado.

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É necessário lembrar que estamos lidando com uma produção jovem-adulta livre de quaisquer tabus e, por essa razão, algumas fórmulas são engatadas como força-motriz para o desenrolar da trama. Mesmo assim, certas adesões erguem-se como obstáculos para o ritmo da narrativa: a repetição das “explosões” psicóticas de Sydney, a adição de coadjuvantes descartáveis e o didatismo redundante de certas explicações. O resultado final, todavia, é positivo e coerente o bastante para querermos mais (principalmente se encararmos essa iteração inicial como uma apresentação breve do que nos aguarda).

‘I Am Not Okay With This’ é recheado de sequências e momentos de tirar o fôlego, mesmo que brinque na zona de conforto e deixe ousadias técnicas e artísticas para um futuro próximo. Movido pela química e pelo charme de seu elenco protagonista, a nova série da Netflix transborda nostalgia e dinamismo em quase todas as suas cenas.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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