Crítica ‘Falcão e o Soldado Invernal’ | Maturidade e ação criam uma das melhores produções do MCU até aqui

Lidar com lançamentos, principalmente neste momento de pandemia, é complicado. Não só porque são produções originais chegando sob uma forte expectativa dos fãs, mas também porque, na prática, elas acabam sendo uma das poucas formas de diversão legítima, que não colocam a vida de ninguém em risco. Ou seja, são cobradas com mais rigor. Assim, em meio a esse contexto estranho que estamos vivendo, a ansiedade causada por essas produções é maior do que o comum. E mesmo em tempos assim, a a Disney conseguiu lançar uma série que vai agradar a todos os públicos e fará com que eles reflitam sobre muitas questões pesadas vividas no cotidiano.


Falcão e o Soldado Invernal
é uma série da Marvel que fidelizou um público enorme por aproximadamente dois meses para contar a história de origem do novo Capitão América, papel consagrado nos cinemas por Chris Evans. Depois dos eventos de Vingadores: Ultimato (2019), Steve Rogers passou o manto e o escudo do herói para Sam Wilson, o Falcão (Anthony Mackie). Só que, diferentemente do mundo glamouroso dos cinemas, a vida real é bem mais complicada do que só passar seu legado adiante para que outra pessoa continue ele. Existem camadas e motivações que o escolhido precisa viver para saber se vai conseguir ou não dar prosseguimento a algo tão icônico quanto ser o Capitão América, ainda mais se o escolhido foi um homem negro e um país onde o racismo estrutural é dominante e considerado “liberdade de expressão” pelas leis.

Partindo dessa proposta, a série trabalha a vida dos melhores amigos de Steve, Sam e Bucky Barnes (Sebastian Stan), depois que ele se aposenta da vida de super-herói. O Falcão sente o peso de ser esse símbolo e abre mão dessa responsabilidade por conhecer bem o país que deveria representar. Do outro lado, um traumatizado Bucky fica enfurecido por ver o legado do amigo ser deixado de lado de uma hora para outra. Piorando a situação, o mesmo governo que convence Sam a esquecer essa ideia de ser o novo Capitão América traz um soldado branco, loiro e de olhos azuis para assumir o uniforme e ser o “Novo Cap”, indo contra a vontade de Steve Rogers e reforçando o racismo que Sam sabia que seria submetido.

Em meio a tantas cenas de ação de tirar o fôlego, mostrando que o orçamento de cinema foi bem utilizado para fazer essa produção, o grande destaque da série é justamente um texto extremamente humano direcionado aos dois protagonistas e aos vilões. Enquanto Sam praticamente renasce no MCU, ganhando um desenvolvimento que ele nunca teve, um background familiar maravilhoso e tem suas lutas diárias de ser negro nos EUA escancaradas, Bucky procura aceitar a segunda chance que recebeu em Wakanda ao ter o controle mental da HIDRA apagado. São dois heróis mentalmente abalados por suas próprias questões que buscam ajuda e se ajudam a superar e/ou lutar contra os traumas. Diferentemente de John Walker (Wyatt Russell) e Karli Morgenthau (Erin Kellyman). Se o primeiro é um clássico herói de guerra americano, traumatizado com suas ações no Afeganistão e viciado em buscar o soro do supersoldado, Karli lidera os Apátridas para tentar passar ao mundo sua mensagem de que os povos precisam de ajuda, que as pessoas estão passando dificuldade. Ela está errada? De forma alguma, mas o meio que ela escolhe para isso é terrível. Ao apelar para o terrorismo, muito por conta de casos de abandono e negligência política do passado, ela se torna uma fugitiva e dá ao governo americano uma justificativa para tentar abafar a real causa que ela defende rotulando todo o movimento como terrorismo.

Esse texto cheio de dualidades é mérito do roteirista Malcolm Spellman, que tenta não se prender aos rótulos padrões desse tipo de produção, e traz com muito respeito e de forma completamente natural as questões sociais para a série. A cada novo episódio, eu saía sentindo um “soco no estômago” diferente. Fosse representando o racismo, o estresse pós-traumático ou a negligência do governo, o seriado levantou pautas importantíssimas para os dias de hoje. Mérito também da diretora Kari Skogland, que abordou esses temas com muita sensibilidade, principalmente no que diz respeito a Isaiah Bradley (Carl Lumbly) e seu passado de abusos. É de encher os olhos ver como eles foram maduros na hora de conduzir essas questões, o que só engrandeceu a produção.

Pensada como um filme de seis horas, a série peca na questão de divisão de episódios, ficando a impressão de que um mini-filme foi lançado por semana. Só que a Disney quer gerar engajamento nas redes sociais, então não faria sentido lançar tudo de uma vez para “maratonar”. Isso pode causar um certo estranhamento para os fanáticos por séries porque as estruturas são realmente diferentes, mas a galera que ama os filmes provavelmente nem vai perceber. É que essa questão fica muito nítida no terceiro episódio, ambientado grande parte em Madripoor. Como é mais focado na ação tanto a estrutura quanto o estilo de direção lembrar muito o de Capitão América: Guerra Civil (2016), cheio de diálogos rápidos e muitos, muitos cortes nas cenas. Considero esse um dos poucos “escorregões” da equipe criativa.

Já a questão dos personagens é motivo de aplausos. Toda a abordagem para eles, sejam novos ou já conhecidos do MCU, foi honradíssima. Anthony e Sebastian deram um show no papel dos heróis vulneráveis, assim como Lumbly e seu veterano de guerra abandonado. Mas é nos vilões que está o verdadeiro destaque de atuação. O John Walker de Wyatt Russell consegue deixar o público com ódio genuíno dele ao mesmo tempo que consegue impressionar e cativar fãs próprios, assim como o Barão Zemo de Daniel Brühl, que assume uma faceta mais sedutora e cativante do vilão de 2016. É muito difícil terminar Falcão e o Soldado Invernal sem estar fascinado por pelo menos um dos personagens da trama. Um golaço da Marvel que fez dos coadjuvantes protagonistas.

Confesso que esperava uma abordagem diferente quando a Disney anunciou Falcão e o Soldado Invernal, achei que seria uma pegada mais clichê e divertida dos Buddy Cops, mas o resultado conseguiu surpreender com muita maturidade, personagens fantásticos, uma trama deliciosamente cativante, cenas de ação de qualidade altíssima, relevância para o futuro do Universo Cinematográfico Marvel e uma mensagem social importantíssima. É, sem sombra de dúvidas, top-5 produções já feitas pela Marvel em seu vasto MCU.

Falcão e o Soldado Invernal está disponível no Disney+

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Pedro Sobreirohttp://cinepop.com.br/
Jornalista apaixonado por entretenimento, com passagens por sites, revistas e emissoras como repórter, crítico e produtor.

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