Após causar repercussões em alguns festivais no segundo semestre de 2022 — como o Fantasia, no Canadá, e o TO Horror Fantastic, na Itália — Skinamarink: Canção de Ninar, do canadense Kyle Edward Ball, chegou aos cinemas brasileiros na última semana, dia 23 de março, dividindo a opinião tanto da crítica quanto do público.
Por que o filme chama atenção e gera discussão? Por conta da surpresa do subgênero do terror experimental. Skinamarink: Canção de Ninar é um exemplo de como fazer um filme de terror assustador de maneira não tradicional e com poucos recursos. Para ter uma ideia, o orçamento do filme foi de 15,000 dólares canadenses, segundo o IMDb.
Este, no entanto, não é o primeiro filme de terror a incorporar elementos experimentais em sua produção, vide as obras de David Lynch. O desconhecido e o inexplicável podem ser assustadores, ou seja, utilizar enredos alternativos e atmosferas oníricas causam grandes sensação de pavor.
Algumas obras são excelentes exemplos, outras nem tanto, por isso o CinePOP fez uma pequena seleção do subgênero para vocês. Filmes de terror experimentais adotam uma abordagem única do gênero, usando iluminação, som e atmosfera para criar uma sensação de medo e pavor raramente vista entre o público. Confira!
Skinamarink: Canção de Ninar (2022)
Vamos começar pelo filme do momento. À primeira vista, Skinamarink: Canção de Ninar não capta a atenção do espectador. A razão são os longos momentos de apreensão sem uma dissolução da latência. Em outras palavras, o suspense criado pela pouca informação nunca chega a um objetivo.
Outro impasse é a perspectiva da narrativa sob a visão de crianças, as quais testemunham estranhos sons e imagens dentro de uma casa. A claridade é marcada pela tela da televisão durante a noite e não há pessoas em cena. Os poucos diálogos presentes desorientam mais do que esclarecem. O que pode ser mais assustador do que ver o mundo pelos olhos confusos de crianças de 3 e 6 anos?
O diretor Kyle Edward Ball já explorou o mundo do terror experimental no seu curta-metragem Heck (2020), disponível no YouTube. A premissa é semelhante a Skinamarink, porém com um tempo de execução menor e um ar ainda mais abstrato. Ou seja, confira a versão de 30 minutos e, se você gostar, vá ao cinema conferir o longa.
A Casa Lobo (2018)
Lançado no Brasil no Festival de Curitiba em 2018, A Casa Lobo mistura animação 2D e 3D, tanto em aquarela quanto stop-motion, em torno de cenários reais. Com um tom de contos de fada sombrio, o filme segue uma jovem que escapa de uma comunidade religiosa e esconde-se numa casa isolada, localizada numa floresta.
Como companhia, a menina encontra dois porcos horripilantes e passa a contar sua vivência. De acordo com críticos da obra, o enredo faz referência a uma colônia existente durante a Ditadura Militar no Chile, fundada por alemães. Este detalhe, no entanto, não é posto em evidência no filme, mas as imagens iniciais deixam pequenos indícios. Vale ressaltar que os diretores Joaquin Cociña e Cristóbal León são chilenos.
Os efeitos da animação criam uma atmosfera de pesadelo, na qual as motivações da personagem são veladas, mas o filme nos transmite um tremendo impacto emocional e psicológico por conta do seu estilo. Ou seja, a linguagem experimental consegue alcançar pontos de emoção e terror dificilmente descortinados em uma narrativa padrão e linear.
Eraserhead (1977)
Quem mais experimentou utilizar sensações e concepções diferentes no cinema que David Lynch? Mestre dos filmes de embaralhar nossa percepção e razão, o cineasta norte-americano colocou o pé no acelerador do abstrato ao nos apresentar Eraserhead. Se hoje em dia brincar com a estética não é uma novidade, 40 anos atrás o movimento não era tão recorrente e deu ao filme o status de “clássico do surrealismo”.
A partir da utilização de elementos visuais de deformação — tal como um gosmento bebê e as dançarinas de rádio com rostos tumefactos —, além de uma trilha sonora assustadora, David Lynch cria uma visão bizarra e perturbadora do medo de um homem em relação à paternidade. Se você consegue assistir sem se contorcer e sentir calafrios, você é uma pessoa extraordinária.
Rubber – o Pneu Assassino (2010)
Misture Luis Buñuel, David Cronenberg e David Lynch em uma comédia de violência é o resultado é Quentin Dupieux. Com bastante exagero, vale ressaltar, é assim que a crítica descreve esta obra-prima do cineasta francês. Em seu segundo longa-metragem, o diretor e roteirista nos apresenta uma premissa inteligente e bastante cômica, na qual um pneu com poderes telecinéticos mata animais e explode cabeças por onde passa.
Onde o experimental entra em cena? Exatamente na proposição da ideia de um assassino serial, literalmente, sem pé nem cabeça. Com efeitos especiais da época de ouro de John Carpenter, O Enigma de Outro Mundo (1982), Rubber provoca sensações de tensão e risos. Aliás, é altamente recomendável checar toda a primorosa filmografia do diretor Quentin Dupieux.
We’re All Going to the World’s Fair (2021)
Lançado no Festival de Sundance e ainda inédito no Brasil, We’re All Going to the World’s Fair (Vamos todos à Feira Mundial, na tradução livre) é uma obra que instaura terror no ambiente mais costumeiro dos jovens do século XXI: em frente a tela do computador. [Veja o trailer!]
Com uma narrativa pouco clara e visualmente assustadora, o filme de debut da norte-americana Jane Schoenbrun traz um olhar perturbador para o gênero coming-of-age, isto é, os filmes de processo da maturidade. A protagonista Casey (Anna Cobb) participa de um desafio fatal na internet. Através de imagens sem foco e vídeos de webcam, o espectador acompanha as resoluções desse “jogo” juvenil, porém macabro e perigoso.
W (2022)
Lançado no Festival de Locarno em 2022, W é ainda inédito no Brasil e quase no mundo inteiro. Com um olhar centrado na arte plástica e sonora para expressar suas emoções e revoltas políticas, a diretora finlandesa Anna Eriksson desenvolve uma estética simétrica junto à inflexão da dor corporal. [Veja o trailer!]
Conhecida como uma das maiores cantoras da Finlândia, Anna Eriksson começou sua incursão no cinema com o longa M (2018), apresentado no Festival de Veneza do mesmo ano. Em sua segunda obra, a cantora de pop e rock realiza uma alegoria política através do choque.
Com cenas em close-up em genitálias, imagens em deformação, cenas de mutilação, além de longos períodos de sons perturbadores, W é um filme completamente experimental com cenas apavorantes, o qual gera uma vontade louca de abandoná-lo antes do fim. Sinceramente, a mensagem política só é destacada pelo nome dos personagens, como Madame Eurooppa (Anna Eriksson).