Análise ‘Monarch – Legado de Monstros’ | Oitavo episódio trabalha a ambiguidade de seus personagens

[ANTES DE COMEÇAR A ANÁLISE, FIQUE CIENTE QUE ELA ESTÁ RECHEADA DE SPOILERS]

Se você ainda não assistiu o oitavo episódio de Monarch – Legado de Monstros, evite esta matéria, pois ela contém spoilers.

Divulgação/ Apple TV+

Depois do núcleo de 2015 tomar completamente a atenção para si no sétimo episódio, o oitavo aproveita seu tempo para relembrar o público do trio dos anos 1950 e seus percalços. Após a Marinha assumir o comando da Monarch, ocorreu o que já era esperado: a ciência do grupo não foi levada a sério, dando a entender que todo o trabalho de Keiko (Mari Yamamoto), Billy (Anders Holm) e Lee (Wyatt Russell) era um monte de vigarice. Mais do que isso, ele ignorou pesquisas para priorizar seus próprios interesses na hora de conseguir verba. Ou seja, o financiamento governamental da Monarch estava prestes a ser extinto.

Como situações desesperadas requerem medidas desesperadas, Lee manda seus companheiros de trabalho juntarem o máximo de informações possíveis em três dias, quebrando aquele pacto deles de só informar o necessário ao exército, para criar um mapa que mostrasse o tamanho do risco que a existência dos Titãs representava para o mundo, além de revelar que o Godzilla havia sobrevivido ao ataque nuclear no Atol de Bikini. Essa situação acabaria aproximando Keiko e Billy.

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Nos episódios anteriores, o público pôde ver que Billy e Keiko eram um casal nos momentos finais da vida da doutora, que faleceu vítima dumas baratas titãs durante uma expedição. É interessante lembrar disso, porque Keiko é ponto central desta trama. Ela chega a ser acusada pelo comandante da Monarch, dando a entender que ela possa estar conspirando contra o governo dos EUA, tudo porque ela é japonesa e utilizou pesquisas e artefatos do Japão na jornada de estudo do Godzilla e outros monstros.

Essa acusação leva a revelação final do episódio, que é sobre sua vida pessoal. A doutora se envolveu com os EUA porque era uma viúva, então mudou para o Ocidente em busca de uma vida diferente para o pequeno Hiroshi, que anos mais tarde viria se tornar o pai de Cate (Anna Sawai) e Kentaro (Ren Watabe). Ou seja, os tais segredinhos apontados pelo marinheiro eram, na verdade, sobre a vida pessoal de Keiko, que havia mantido seu filho e sua viuvez sob sigilo. É interessante e triste ver como a personagem é tratada. Ela está na trama para mostrar a falta de respeito a que as mulheres são submetidas – já que mesmo tendo doutorado e sendo claramente a pessoa mais capacitada do recinto, ela é sempre questionada e ‘desafiada’ pelos demais -, mas a série acaba enquadrando Keiko no arquétipo da ‘mulher na geladeira’, em que sua função na trama é praticamente morrer para engatilhar outras situações para os protagonistas masculinos.

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Essa questão chega a ser meio problemática, porque fica a sensação de que a única pessoa na série a realmente sentir a morte de Keiko é Lee Shaw (Kurt Russell), que chegou a ter um breve caso com ela. Tem uma cena que fala diz muito sobre isso, quando Cate encontra Shaw para a Monarch ao presumir que ele estará no local onde sua avó faleceu. Ela diz que está certa da teoria porque Lee falava sobre ela quase como se fosse seu avô. A personagem não tem qualquer tipo de sentimentalismo sobre Keiko e a trata sempre como uma ferramenta para chegar a Shaw. Quem chega a demonstrar um pouco de sentimento na situação é o Kentaro, que se questiona: “Além de tirar meu pai, a Monarch também matou meus avós?”.

Já no fim do episódio, o plano de Shaw é posto em ação e Cate acaba ficando presa junto a ele, enquanto um Titã baratão emerge das profundezas quebrando tudo. Então, o “fantasma” de Keiko volta quando Cate escorrega e fica à beira do precipício com um monstro gigante vindo em sua direção, exatamente como sua avó morreu e no mesmo lugar. O capítulo se encerra com Lee chegando para tentar salvar a garota e exorcizar essa culpa que o acompanha há décadas.

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Lee e Cate, inclusive, só se reencontram por conta do acordo costurado entre Tim (Joe Tippett) e as meninas com a Monarch, para cooperar com as buscas e providenciar qualquer tipo de informação que os leve ao ex-militar. É curioso como a série consegue brincar com situações simples em momentos delicados. Há uma passagem de tempo que mostra Billy descontando sua raiva pelo preconceito sofrido por Keiko – e pelo rebaixamento da Monarch nas prioridades do governo – com um soco na parede. Cerca de 60 anos depois, o grupo de jovens entra na sala de Tim na Monarch e o buraco do soco ainda está lá.

Em meio a piadas do governo demorar a tomar providências, a série trabalha bem a ambiguidade da organização e de seus personagens. O próprio Tim é um exemplo disso. Ele começa a série como um dos vilões, mas logo se mostra o mais compreensivo dentre os agentes. Ele quer salvar o mundo e não está disposto a sacrificar os descendentes de seu amigo para isso. A própria Cate também começa sem querer saber de nada, tímida e retraída, sendo que é ela quem lidera as missões para tentar impedir um novo Dia G, botando o grupo nas maiores furadas. Mas nenhum personagem é tão ambíguo quanto Lee.

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Nos anos 50, ele transita entre o ‘amigão da galera’ e o ‘potencial vilão’ com muita facilidade. Neste episódio mesmo, ele é filmado em vários momentos por enquadramentos clássicos dos vilões de cinema da época. Ao mesmo tempo, ele toma decisões que ajudam o grupo, enquanto demonstra se preocupar verdadeiramente com eles. Sua abordagem em 2015 segue a mesma lógica. Ele começa como o cara gente boa, que conspirou contra a grande organização e foi caçado por isso, mas também tem atitudes completamente questionáveis, principalmente no que diz respeito ao Godzilla.

Nesse oitavo episódio, Shaw explica para Cate que considera o Rei dos Monstros um tipo de guardião entre mundos. Mas, para falar mais sobre isso, precisamos comentar sobre um ponto do desenvolvimento de Billy que impacta no ‘Monsterverse‘. Em Godzilla vs. Kong (2021), parte fundamental da trama é o conceito da “Terra Oca”, um mundo que existe em paralelo ao nosso, praticamente outra dimensão, ambientado no centro da Terra. É de lá que vêm os monstros e será parte importante da sequência que chega aos cinemas em 2024. Na série, vemos Billy inventar esse conceito por meio dos mapas e das formigas. É apenas mais uma conveniência de roteiro do capítulo, mas que gera um grande impacto na trama e nesse universo.

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Isso porque os traços de vilania de Shaw são refletidos por seu plano. Ele conta a Cate que não apenas acredita na tal ‘Terra Oca’, como também já esteve nela e agora quer ajudar o Godzilla ao explodir todos os portais de acesso a esse mundo paralelo, fazendo com que o monstrão não precise mais atuar como um ‘guardião’ que impede que os outros monstros saiam lá de baixo – e que humanos entrem lá.

O problema, como explicado no capítulo, é que esses bombardeios estão fechando portais e aumentando a atividade dos monstros em outras saídas. Ou seja, ele tem boas intenções, mas está fazendo algo que pode gerar consequências terríveis. E por ser uma série que se passa antes de Godzilla II – Rei dos Monstros (2019), dá para saber que essa ideia dele não é lá das melhores.

Os novos episódios de Monarch – Legado de Monstros estreiam toda sexta no Apple TV+.

Pedro Sobreirohttp://cinepop.com.br/
Jornalista apaixonado por entretenimento, com passagens por sites, revistas e emissoras como repórter, crítico e produtor.

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